A VIAGEM - Antonia Marchesin Gonçalves

 



 A VIAGEM

Antonia Marchesin Gonçalves

 

Me lembro bem...

Me lembro da janela do navio, eu tinha cinco anos.

Mamãe, corajosa, embarcou com os três filhos para o Brasil.

Papai veio bem antes, uns dois anos antes, em 1949. Ele veio como turista, gostou e ficou. Foi aprovado no Liceu de Artes e Ofícios, até queriam que ele lecionasse, mas ele preferiu montar uma empreiteira. Segundo ele, havia comprado passagens de primeira-classe para nós, mas ele teria sido enganado, e nós viajamos na segunda-classe. Esse assunto gerou muitas discussões entre eles.

O que lembro dessa viagem... mamãe chorava muito com medo de contrairmos alguma doença dos passageiros, pois não eram nada cuidadosos, nada higiênicos. Meu irmão mais velho suportou bem a viagem, já tinha dez anos, era mais independente, minha irmã mais nova era ainda um bebê, com dois anos e meio, ainda era amamentada no peito. Já eu passei todo o trajeto vomitando. O capitão do navio vinha nos ver, consolando mamãe, trazia maçã para me ajudar a suportar os enjoos.

A maior lembrança era mesmo a janela redonda do navio, a escotilha, e eu debruçada nela para tomar ar. No convés pouco íamos, mamãe tinha medo que caíssemos no mar. Meu irmão ficou amigo do capitão. Pela janela, a imagem nítida que ficou na minha mente, foram os peixes que acompanhavam a embarcação, seguindo os dejetos que o navio produzia, e felizes pulavam fora do mar de um azul maravilhoso, mas também às vezes o mar se apresentava muito turbulento. Os peixes pareciam felizes e divertidos, eu ficava encantada. Foram vinte e dois dias até chegarmos em Santos, aí que tive a noção do tamanho da embarcação, em terra parecia um monstro.

Desembarcamos. Era ano de 1951, papai todo bonitão à nossa espera, foi encantador ter a família unida de novo. Papai contratou um carro e subimos para São Paulo pela Serra de Santos, ficamos encantados com a vegetação, e nos instalamos em Pinheiros, onde ele morava e tinha seu escritório de empreiteiro.

A partir daí nova fase de vida para todos, longe de todos os parentes, só nós cinco.

 

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