NA CAPELA DO
HC
Oswaldo U. Lopes
Quando
era residente do HC (Hospital das Clínicas da FMUSP) muitas e muitas vezes subi
ao 11º andar para rezar ou pelo menos ficar quieto em silêncio pensando na
vida. Naquele tempo a capela era a única construção do 11º andar.
Acho
que não é exagero compará-la ou pensar nela como quem está no Vaticano. Você
não entra na Igreja de São Pedro e acha que vai rezar como em qualquer Igreja.
No mínimo vai dar de cara com a Pietá de Miguel Ângelo e mesmo tendo-a visto em
centenas e milhares de reproduções, vai se emocionar e entender porque ele
gravou na tira que atravessa o colo de Maria, o próprio nome:
“MICHAEL ANGELUS BONAROTUS FLORENT FACIEBAT”
Ele
tinha na época 23 anos e parece que ninguém acreditava que um jovem escultor
pudesse fazer aquela extraordinária maravilha, dai que ele resolveu assiná-la.
Bem
voltemos à capela do HC e porque quando você entra nela, lembra-se do Vaticano.
Em que outra Igreja de São Paulo se encontram reunidas no mesmo conjunto, obras
de Victor Brecheret, Fúlvio Pennacchi e Emiliano Di Cavalcanti?
Naquele
tempo era conhecida como Capela da Esperança ou do Espirito Santo por causa de
um vitral colocado em posição superior. Hoje chamam-na Capela de São Camilo,
mas isto se deve a presença recente dos Padres Camilianos como guardiães da
Capela.
Nas
laterais do altar-mor dois afrescos de Pennacchi impressionam pela qualidade e
sutileza da pintura. Pennacchi era conhecido pela perfeição e domínio da
técnica do afresco, que aprendera na Itália, seu país de origem. Ele aqui
deixou sua marca registrada. Do lado esquerdo a Anunciação à Maria, no lado
direito a Ceia de Hemmaus. Difícil descrevê-los, melhor será vê-los. Visite-a
quando puder. A mim a figura do anjo na Anunciação e dos discípulos
reconhecendo Cristo pela partição do pão são inolvidáveis.
Brecheret,
não sei a razão, colocou seu melhor talento a serviço da Capela. Lá estão um
magnifico Cristo Crucificado, um São Paulo heráldico e as deslumbrantes 14
Estações da Via Crúcis. Originalmente em terracota, como eu as vi, hoje, por
motivo de conservação, substituídas por cópias de bronze, é nelas que ele expôs
todo seu talento e capacidade. Os originais estão desde 1982 guardados no Museu
de Arte Sacra.
A cruz
que aparece e domina o conjunto da Via Sacra é representada em 12 das 14
estações. Brecheret usou um simples T para representá-la, o mesmo T que usou na
cruz do Cristo que é o centro do altar mor, mas o uso que fez dessa cruz é
notável. As figuras que compõe as estações, todas simplificadas, mas
perfeitamente reconhecíveis formam um conjunto único digno de Michelangelo que
mencionamos lá atrás.
Alguns,
mais afoitos, pensarão que falta a 15ª Estação, a da Ressureição. A criação
desta, no entanto, foi sugerida pelo Papa João Paulo II, durante seu
pontificado (1978-2005). No entanto, na época em que Brecheret fez o conjunto
tinha por volta de 20 anos e provavelmente não tinha ideia de que seria Papa e
de sua importância na vida da Igreja Católica.
De Di
Cavalcanti são os desenhos que deram origem a vários vitrais, alguns repetidos,
que ajudam a iluminar a Capela. Lá estão os lírios e palmas cercando um anjo,
Quatro desenhos representando os Evangelistas:
um touro para Lucas, uma águia para João, um anjo para Mateus e um leão
para Marcos. Há também uma figura central, a pomba branca que representa o Espirito
Santo.
Confesso
que às vezes contemplava a pomba branca pensando na piada que um frade
franciscano me contara:
Havia muito tempo, viviam dois papagaios nos
jardins do cura local (Espanha, por certo). Um muito religioso e o outro muito
desbocado. Por coincidência morreram com pouca diferença de tempo. O boquirroto
foi direto para o inferno, mas ficou muito surpreso de lá encontrar o beato e
perguntou-lhe:
-
Hombre que passo?
-
Bueno Yo estava volando para el cielo quando vi una mui linda palomita e la salude
– Guapa
-
Que mal habia?
-
Resulta que era el Espirito Santo.
Pois é
amigo, nem todas as vezes que vamos a capela, rezamos fervorosamente, ocasiões
há em que divagamos, como humanos que somos, perdidos em bobagens e histórias
que nos acodem a memória enquanto tentamos entender os desígnios do dono da
Capela.
Por
fim, e meio repetidamente, volto a minha sugestão, se puder visite a capela,
mesmo se não for crente, nem for para rezar, terá a oportunidade de contemplar
alguns exemplares da melhor arte religiosa que o Brasil já produziu.
Fiquei curiosa!
ResponderExcluirQuando a pandemia passar faça uma visita. Garanto que vai se extasiar
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