LUTA
PELA SOBREVIVÊNCIA
Antonia
Marchesin Gonçalves
Conheci Giovana com os meus dez anos ela
tinha a mesma idade que eu, só que com a aparência de adolescente e mais
madura, já eu miúda mais criança. Foi quando a família dela se mudou numa rua
vizinha a nossa. As mães se conheceram fazendo compras na vendinha e quitanda
perto de nossas casas, Carmela chamava-se a mãe e Lia a irmã mais nova, já o
pai apagou na minha memória o seu nome, nunca gostei dele.
A
empatia entre as duas famílias foi imediata, sendo que éramos de origem
italiana, nada normal no bairro na época. Logo de inicio percebemos as
diferenças entre nós, enquanto nós crianças brincávamos, as mães se
confidenciavam nos seus desabafos. Nossos pais ao contrario não tiveram a mesma
empatia, meu pai não teve nenhuma afinidade com o pai delas, fui descobrindo
aos poucos depois, a razão.
Meu
pai era do bem, trabalhava bastante, bebia no fim do dia, principalmente aos
domingos, e aí não tinha papas na língua, motivo esse de algumas divergências
com o vizinho, ele recebia o salário entregava inteiro para minha mãe que
administrava com competência. Já o pai da Giovana empoado olhava toda a
vizinhança com desdém se achando superior a todos. Trabalhava e dava o dinheiro
contado com ordem expressa de comprar só o que ele gostava de comer, não se
importando com a mulher e filhas, inclusive o que mais chocou meus pais é que ninguém
podia comer o que era dele, era separada e as três às vezes comiam arroz puro,
muitas vezes elas lanchavam em casa.
Às
vezes Carmela aparecia com olho roxo, marcas nos braços e pernas, minha mãe
questionava, ela respondia que havia batido na mesa, armário ou caído, sabíamos
que ele batia nela, sendo sempre perdoado dizia que ele era traumatizado de
guerra, mesmo os irmãos dela queriam que o largasse propondo ajuda, não o
largava. Logo que as meninas cresceram
mandou que procurassem trabalho e não deixou que estudassem. Giovana fez curso
de simples de cabeleireira e a irmã de manicure as três com a ajuda dos
familiares da Carmela alugaram um salão de beleza perto de casa.
Nossa
amizade se mantinha boa, mas nos víamos pouco, pois eu também já trabalhava na
secretaria do Banco Frances e Italiano na Boa Vista. Até que o meu marido, na
época colega do meu irmão, estudantes de engenharia na Poli, se encantou
comigo. Ele sabia o horário que eu chegava de ônibus no fim da tarde ficava a
minha espera sempre com um bombom ou chocolate no ponto que eu descia que por
coincidência era em frente ao salão delas. Depois de um tempo, eu chegava e
encontrava sempre os dois à minha espera, mal sabia eu que minha amiga já
antevendo futuro promissor dele, começou a se insinuar, acabou me confessando
quando já éramos namorados.
A
partir daí o rompimento da amizade foi automática, nada falamos uma para outra,
rompeu-se o elo que nos unia, culminando com a mudança delas para outro bairro.
Acredite, o pai delas teve um derrame anos mais tarde, viveu na cama por anos,
sendo cuidado por Carmela e filhas até morrer. Cheguei a vê-las antes disso,
não era mais aquela amizade, não havia mais a cumplicidade que um dia havíamos
compartilhado. E, ainda comentaram com minha mãe que eu tinha tido sorte com o
meu casamento, ainda bem que eu tinha o corpo fechado contra inveja.
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