O CAMINHO DA AVENTURA
Ledice Pereira
Desde criança, Cássio foi
atraído pelo perigo. Não foram poucas as vezes que os pais se dividiram pela
praia para encontrá-lo. Bastava se interessar por qualquer coisa, num carrinho
de ambulante, e lá ia o menino seguindo, como que hipnotizado, o objeto de
cobiça.
Era preciso ter olhos bem
abertos e atentos para que o garoto não evaporasse.
Em geral, quando o
encontravam, ele estava encantando os adultos com seu jeitinho cativante. Nunca
sentia medo. Não entendia porque os pais chegavam até ele tão desesperados.
A idade só fez aguçar sua
curiosidade e independência. Várias vezes, os pais foram convocados para uma
reunião com o orientador da escola, preocupado que as asas do menino o
transportassem para lugares os mais perigosos. Mas eles não conseguiam conter o
ímpeto do filho.
Cássio tornou-se um jovem
pra lá de aventureiro. Não raro, pegava sua mochila, seu cantil e o colchonete
para acampar e aproveitava os feriados, principalmente prolongados, para embrenhar-se
mata a dentro. Se tivesse companhia muito bem, se não tivesse ia assim mesmo.
Ele e Deus. Já conhecia diversos acampamentos e se dirigia a cada um com um pé
nas costas. Como ainda não tinha dezoito anos, pegava carona com amigos ou
caminhão. Pra ele não tinha tempo ruim.
Gostava de fazer trilhas,
adorava mega tirolesas e sempre que podia participava de campeonatos de
canoagem. Medo era uma coisa que não combinava com ele. Enfrentava todos os
desafios. Ecoturismo era com ele mesmo.
Naquele início de férias,
partiu com sua bagagem costumeira para Juquitiba. Havia pesquisado o local onde
se praticava tirolesa, rafting no Alto Juquiá, arvorismo e trekking. Nesse último, havia a possibilidade de se ter
um guia, mas é lógico que nosso herói optaria por sair com um mapa e uma
bússola para orientar-se.
O programa previsto para
uma semana era intenso.
A única coisa que Cássio
não previu, nem consultou, foi a variação climática. Naquela semana, despencou
toda a água do céu, prevista para os
próximos três meses. O local ficou
inundado.
A maioria dos jovens preferiu
entreter-se com jogos, permanecendo nos enormes salões, organizando campeonatos
de tênis de mesa, baralhos, e até se divertindo em bailes improvisados e
karaokê.
Cássio não. Havia se
preparado para grandes aventuras e não arredava pé, por mais que fosse alertado
dos perigos.
Depois de praticar
tirolesa e voltar ensopado, espirrando muito e de nariz escorrendo, dia
seguinte partiu, mesmo gripado, para o trekking, debaixo de uma chuva
torrencial, portando o mapa e a bússola.
Nos primeiros minutos, o
mapa ficou encharcado, desmontando-se todo.
Resolveu guiar-se pela bússola,
tentando seguir em frente. Era teimoso como uma porta.
A chuva não dava trégua.
Não é preciso dizer que o jovem, apesar da bússola, logo percebeu estar
perdido.
Foram horas de desespero.
A noite caiu rapidamente e ele não encontrava o caminho de volta. Quanto mais
andava mais se perdia. Parecia andar em círculos. O vento gelado parecia
atingir-lhe o pescoço como um chicote.
Começou a tremer. O frio atravessava-lhe
a espinha. Lutou para permanecer acordado. Sentia-se desfalecer.
Uma luz distante parecia
deslocar-se. Pensou estar tendo uma alucinação.
Mas, não. A
luz vinha em sua direção. Ouviu vozes. Tentou gritar. Ouviu o próprio sussurro.
A luz o cegou. Deixou-se desmaiar.
Uma voz lhe parecia
familiar, bem como aquela mão que o acariciava. Os olhos pesavam. Abriu-os com
dificuldade. Percebeu aquele tubo de plástico sobre seu nariz. Surpreendeu-se ao ver os pais. Onde estava?
─ O que aconteceu? Que
lugar é este?
─ Que bom que você acordou,
meu amor! Estávamos muito preocupados. Faz cinco dias que estamos aqui. Você
nos deu um tremendo susto! Teve uma pneumonia dupla. Mas o médico nos garantiu
que ficaria bem. O que vale é que você é forte!
Tentou disfarçar uma
lágrima que teimava em demonstrar sua fraqueza.
Percebeu que os pais também
disfarçavam. Naquele momento, caiu a ficha.
Sentia um amor infinito por eles.
Abraçou-os, fortemente, pedindo-lhes perdão.
Ver a morte de tão de perto o fez refletir sobre o valor da
vida.
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