A
difícil vida fácil de Carmen
Fernando Braga
Carmen era ela uma mineirinha faceira,
que nascera em lar pobre, em uma cidadezinha do interior. Conseguira fazer
apenas o curso primário, onde aprendeu a ler e escrever. Com 13 anos passou a trabalhar em casas de
família onde exercia uma modesta função de doméstica, como sua mãe. Aos 16 anos
foi estuprada por seu patrão, que lhe deu uma quantia em dinheiro para que
sumisse da cidade e ameaçou-a caso contasse a alguém. Não quis comentar com
ninguém de sua família, porque algo pior poderia acontecer.
Por coincidência, bem nesta ocasião, uma
tia, irmã de seu pai, que se mudara para São Paulo, apareceu na cidadezinha para
rever os irmãos. Estava bem vestida, mostrando que havia conseguido sucesso na
capital dos paulistas.
Carmen se aproximou e pediu se não
poderia ir morar com ela. Queria de toda maneira sair daquela vila, sem dar
outras explicações. A tia acedeu, os pais concordaram e ela foi embora. Esta
tia era separada e não tinha filhos.
Em
São Paulo tinha uma casa de tolerância, no centro da cidade, próxima à antiga
estação rodoviária, onde dava emprego a mais 3 ou 4 garotas. Carmen, logo
percebeu a situação, pensando em ir embora. Mas para onde? Tinha pequena
economia, mas para ela a cidade grande era uma incógnita, assustadora. Sua tia
ofereceu-lhe um pequeno quarto no fundo do quintal da casa, avisando-a que
pouco deveria ir para dentro da casa, a não ser na hora do almoço e do jantar.
Não precisou explicar-lhe o porquê.
Disse que por enquanto não poderia trabalhar com ela por ser de menor.
Quem sabe mais tarde, mas que nada comentasse com a família.
Empregou-se novamente como doméstica em
várias casas de família, passando a dormir no emprego, o que deu certo alívio à
sua tia. O tempo correu rapidamente.
Fez amizade com outras empregadas, com
as quais saía nos fins de semana para ir a barezinhos e dançar. Era charmosa,
bem cuidada e havia adquirido umas roupas que a deixavam chamativa.
Ocasionalmente ia visitar a tia, onde apreciava o movimento.
Com 22 anos arrumou um namorado que a
adorava e dizia querer casar-se com ela, em futuro não distante. Tinha que adquirir
uma melhor estabilidade no emprego. Era o Douglas.
A tia lhe telefonou pedindo que viesse
vê-la, o que fez no próximo fim de semana.
Vendo o potencial de Carmen, propôs-lhe
trabalho e ela aceitou, vendo que poderia ganhar bem mais e talvez um dia fazer
sua independência. Mudou-se, sem deixar seu endereço ao namorado, ao qual disse
que iria viajar para visitar os pais.
Ela era afeita ao sexo, mas não àquele
exagerado, obrigatório, sem escolhas. Em umas ocasiões encontrou
Marcão, que logo a convenceu de abrir o seu próprio negócio em outro bairro, longe
da tia e que ele a financiaria e orientaria. Ela aceitou, pensando muito no
dinheiro que poderia ganhar. Disse à tia que não queria trabalhar mais.
Marcão não era boas pedras e quis logo
se aproveitar da ingenuidade, falta de experiência de Carmen. Era um gigolô,
que arrumava clientes para Carmen, a obrigava a trabalhar arduamente. Tomava
todo o seu dinheiro e lhe dava pequena porcentagem do que os clientes pagavam.
Carmen, após um ano esgotou-se, ficou
muito nervosa, neurótica e enfrentava o seu gigolô. Para que não a perdesse,
pois via esta possibilidade, além de ameaça-la, propôs que fosse uma semana
descansar em uma pequeno resort na
Barra do Una, próximo à bela praia, onde
ele conhecia a dona. Pagou a pensão e a viajem de ônibus. Ela realmente se
refez, após aproveitar o mar, o sol e a comida caseira.
Voltou a seu trabalho, cada vez mais
árduo, e com pouco ganho. Um dia passeando pelas proximidades, no centro alguém
a viu e reconheceu. Seguiu-a de longe por longo tempo, até que viu-a entrar em
uma pequena casa, o local de seu trabalho. Fez anotações.
Passou
a controlar o local quando Carmen saia e
entrava. Não se aproximou, tomou informações e logo percebeu do que tratava.
Estava muito, muito decepcionado, sentindo-se um coitado, revoltado. Conheceu
também um rapaz, que sempre lá entrava e ficou sabendo nas proximidades de que
era um gigolô. Tomou então conhecimento por inteiro do que se passava e
continuou a segui-la. Um tempo passou. Ele continuou interessado em saber de
sua vida, de Carmen. Certo dia viu-a sair com uma mala, tomar um taxi na
esquina. Após meia hora o taxi voltou.
Aproximou-se do taxista e perguntou
aonde tinha ele levado aquela moça. Deu 50, para que falasse. Disse que havia a
levado a estação de ônibus e que ela tinha ido para a Barra do Una e que
ficaria em uma pensão próxima à praia. Ficaria uma semana. No dia seguinte,
logo cedo, ele que tinha um carrinho tomou o caminho certo.
Esteve em várias pensões que dessem para
ir caminhando até a praia e conseguiu pelo nome, localizar onde estava
hospedada. Conseguiu um quarto na mesma pensão. Começou a usar uma cabeleira
postiça e óculos escuros.
Viu a lista dos hospedes, o número de
seu quarto. Estava só. Fez amizade com a pessoa que registra os hospedes e
conseguiu o telefone celular de Carmen, que fora registrado.
Por volta das duas horas da manhã ele
ligou para ela e quando atendeu disse:
— Sua maldita, você estragou minha vida!
Quem
fala? Quem fala, respondeu muito assustada.
— Você logo irá saber sua miserável!
Viu tratar-se de um telefone de São Paulo.
Como descobrira que ela estava lá?
Logo pensou em Marcão, aquele gigolô cretino.
Ela exausta, não havia pedido licença a ele, para viajar.
— Sim, era ele o Marcão! Pois vou ficar
a semana toda aqui. Quero ver! Quando
voltar, vou desistir de tudo, de tudo! Desta vida sórdida que estou levando!
Vou mudar minha vida!
Na noite seguinte, era umas 22,00 horas,
ela já se preparava para dormir, quando alguém bateu delicadamente à porta.
— Quem é?
— É o garçom. Estou lhe trazendo um pedaço de bolo, oferta
da casa.
Ela abriu e subitamente entrou um cara
de óculos escuros, cabeleira e foi a seu encontro com um pedaço de corda nas
mãos. Quis agarra-la, mas ela lutou e caiu o óculos
e a cabeleira do rapaz. Nesta hora ela disse:
— Você,
Douglas! O que está fazendo aqui meu amor!
—
Quando falou meu amor, ele deixou cair os braços, fez uma cara de apaixonado e
disse:
— Me desculpe Carmen. Eu queria matá-la. Mas
não consigo. Te amo perdidamente. Tenho seguido seus passos há meses e estava
possesso!
— Você
me abandonou, para tornar-se uma prostituta. Nunca mais me procurou depois que
voltou. Te aguardei ansiosamente. Sempre quis casar com você.
Ela
carinhosamente disse:
— Douglas, meu bem, me arrependi muito de tudo
o que fiz. Não quero mais levar esta vida.
— Perdoe o que fiz com você. Não merecia. Há
possibilidade de voltarmos às boas?
Após uma bela noite ele respondeu:
— Há.
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