A INOCÊNCIA DO CULPADO - Sérgio Dalla Vecchia


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A INOCÊNCIA DO CULPADO
Sérgio Dalla Vecchia

Dentro de uma cela, localizada em um presídio no alto de uma ilha, estava ele. O detento. Conhecido como Vacilão.

No gíria da bandidagem, vacilão é aquele que se deixa pegar por um descuido.
Foi condenado a pena máxima por um crime que não cometeu.

Ele jurava a todos ser inocente.

Passou pela cena do crime e presenciou o assassinato. O assassino pegou-o ameaçando de morte, roubou-lhe a carteira de identidade e a jogou na cena do crime. Daí foi preso e considerado culpado.

Inconformado pela injustiça ele penava a amargura da impotência. Entrava, muitas noites, em delírio aflitivo, tinha sonhos fantásticos, visões esdrúxulas de cenários não terrenos.

Imaginava um lugar em outro planeta, onde o verdadeiro assassino era seu melhor amigo.

Lá Vacilão era um homem bem sucedido. Tudo que investia, criava e implantava prosperava com muita facilidade.

O amigo inseparável não sabia que fazer para agrada-lo. Tamanha preocupação em servi-lo.

Certo dia em outra história imaginária, Vacilão e o amigo viajavam por uma pitoresca estrada. Era uma reta sem fim, ladeada por árvores frondosas, que com as copas presenteavam a cena com frescor. A claridade filtrada pelas gotículas da suave névoa era extremamente confortável aos olhos.

Seguiam conversando, quando o carro apresentou um pane, parando instantemente.

Incapazes de fazer o conserto, partiram a pé em busca de socorro em alguma propriedade próxima.

Andaram por algum tempo até que encontraram uma casa com aparência sinistra. Ali a claridade fugiu e a névoa espessou-se diminuindo a visibilidade.

Entraram cautelosamente pelo portão chegando à porta.

O silêncio foi quebrado pelo estalar do assoalho de madeira, reclamando dos passos que se aproximavam.  

Ela abriu-se, surgiu a figura de um homem bem-disposto que logo foi dizendo:

Quem são vocês, que buscam?

Após as devidas explicações, foram convidados a entrar.

Contrariando as aparências externas, as dependências eram claras e o ambiente leve.

Foi servido um cafezinho, descontraíram-se, o homem se apresentou como Inocêncio.

— Escolhi esse lugar para morar, por ser afastado e muito agradável.

— Não tenho medo de nada, durmo como uma pedra e meus atos são sempre feitos com o coração.

Vacilão não entendendo o porquê do Inocêncio morar tão isolado pergunto-lhe:

— Desculpe-me, Inocêncio, mas porque você como um homem bem-disposto, comunicativo mora aqui praticamente isolado?

— Por mim sou feliz com o que tenho e faço. Entretanto eu não relatei a vocês que tenho um irmão morando comigo.

— Ele é o meu oposto, nada está bom, sempre busca um culpado para os erros que comete. Vive só, mora no maior quarto da casa nos fundos e faz questão e cuidar da manutenção externa da propriedade. Seu nome é Doloso. Pouco converso com ele, pois é violento e não quero brigas entre irmãos.

— Já haviam solicitado o socorro para o carro e a conversa continuava animada até que Doloso surgiu abruptamente. Sem a mínima educação olhou para o Vacilão e lhe disse:

— Foi você quem me fez perder minha noiva, não foi?

Vacilão levou um susto terrível, não conhecia Doloso e muito menos sua noiva.

Nisso Inocêncio interveio dizendo para o irmão:

— Você sempre com essa mania de culpar os outros pelos seus erros, não admito mais essa falsa acusação!

Foi ele sim, foi ele e vai pagar por isso.

Sacou um revólver apontando para Vacilão, que tremendo de medo esperava o impacto da bala.

A bala foi disparada, enquanto do nada o, melhor amigo de Vacilão entrou na sua frente, recebendo o tiro certeiro, que o matou na hora.

Inocêncio e Vacilão perplexos pelo crime inexplicável, fixaram simultaneamente o olhar no Doloso, que ainda com a arma em punho, disse:

— Inocêncio, você foi o culpado dessa morte, pois trouxe para nossa casa esses dois aí!

Mais uma vez o assassino culpa um inocente!

Vacilão, homem ponderado, pela primeira vez na vida deixou-se levar pela sede de vingança. Com um golpe, desarmou o assassino e com frenesi descarregou o revólver sem parar contra Doloso.  Inocêncio, vendo a fúria de Vacilão nada fez, parecia concordar plenamente com aquela atitude desvairada.

Nesse mesmo instante na prisão, Vacilão foi acordado pelo seu colega de cela.

— Acorde, acorde, para de tremer, você está tendo um daqueles sonhos!

Sonolento, ainda ofegante percebeu que alguma coisa havia mudado.

Não sentia mais angustia, nem sofrimento, sentia-se leve e confortável.

Abraçou seu companheiro de cela dizendo, me libertei, me libertei!

Mais tarde quando tomava banho de sol, foi chamado por seu advogado que lhe disse:

— Hoje é seu dia de sorte, o irmão do assassino que o condenou fez uma delação espontânea, contanto a verdadeira historia da sua acusação.

— Você está livre!

  

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