Corifeu,
o salva-vidas.
Fernando
Braga
Sou um guarda salva vida,
me chamo Corifeu, tenho 25 anos e há três, trabalho diariamente
em meu posto na praia da Enseada, no Guarujá.
Já salvei muitos
turistas incautos que desconhecem as
armadilhas do mar, que os arrastam para
áreas mais profundas, levando a maioria à
exaustão e daí ao afogamento. Minha função é importantíssima, sentado em uma
cadeira colocada a dois metros e meio de altura, olhando atentamente na direção
norte e de leste a oeste. Sempre quando percebo algo errado, faço uso de um pequeno
binóculos, que sempre está a meu lado e quando vejo alguém em dificuldade, desço, corro até o
mar, visto meus pés de pato, junto ao ombro carrego uma pequena boia com uma
cordinha de uns 5 metros, enrolada e presa junto. Sou perfeito nadador, tenho
muita resistência, folego e graças a isto, consigo cumprir minha missão, perfeitamente.
Tenho férias de um mês por
ano, sendo então substituído por um colega. Como o emprego, na maior parte do
tempo é monótono, não vejo a hora de aproveitar minhas férias, em geral em
algum lugar longe do mar, muito embora eu o ame.
Sinto que sou bem
apessoado, tenho o físico forte e percebo facilmente que muitas garotas gostam
de se aproximar de mim, fazendo perguntas inocentes como desculpa. Uma delas,
certa ocasião lançou uma garrafa verde ao mar, contendo uma mensagem, tendo a
esperança de que ela chegasse próxima de meu posto. E o destino a trouxe.
Pequei a garrafa que continha uma mensagem pedindo para encontrá-la em um bar
próximo às vinte horas durante aquela semana, logo após a minha saída.
Conclusão: acabei casando com ela e hoje temos dois filhos lindos.
Vejam o que se passou em
outra ocasião mais recente. Novamente em meu posto percebi no final da tarde
que nova garrafa, branca desta vez, que se aproximava da praia. Desci de meu
posto e fui apanhá-la. Retirei a rolha e de dentro uma nova mensagem, de uma
mulher que nestes termos solicitava ajuda. Escreveu:
“Se você encontrar este bilhete que escrevi com muita dificuldade, me
ajude pelo amor de Deus. Procure a polícia ou tente me salvar. Estou presa por
dois bandidos no interior da Ilha da Moela no Guarujá, que para aqui me conduziram
após eu ter aceito um convite para passear próximo à ilha. Fui louca em aceitar
o convite. Me chamo Eduarda Moreira e sou de Ribeirão Pires, próximo a São
Paulo. Minha família deve estar desesperada com o meu sumiço. Descemos na parte de trás da ilha, vimos um
farol. Percebi que não havia ninguém. fui aprisionada, estuprada e agora o fazem diariamente. Me dão pouco
alimento e água. Decidiram me esconder quando falei que iria contar tudo à
polícia. Espero que me ajudem, não aguento mais.”.
Corifeu ficou passado com
o bilhete e logo pensou em comunicar à polícia. Corajoso e raciocinando melhor,
resolveu ele mesmo tentar salva-la. Como entraria em férias no final de semana,
levou sua família até São Paulo e voltou para o Guarujá, onde deveria cumprir missão
importante. Vestiu uma roupa de borracha, óculos de natação, pegou um punhal, o
estilingue que usava desde criança, uma corda forte, água, lanches, colocou
tudo no caiaque e saiu remando em direção à ilha. Conhecia tudo sobre a Ilha da
Moela, embora lá tivesse pisado apenas uma vez. Distante uns três quilômetros
da praia, remando lentamente, após 2 horas estava chegando à ilha rochosa. Com
o mar calmo, contornou a ilha e conseguiu apoitar, descer do barco, puxar seu
caiaque para cima das rochas, subir o morro e logo se encontrar próximo ao
conhecido farol. Este era o ponto, feito referência no bilhete. Já entardecia e
resolveu esconder-se próximo, na mata e observar a movimentação. A ilha não é
tão pequena e supôs que não seria fácil encontrar Eduarda. Teria primeiro que
encontrar os dois bandidos para eles o levarem até ela.
Mais dentro da noite,
percebeu um clarão que poderia ser de uma pequena fogueira. Seguiu o rastro,
cuidadosamente, entre a mata e rochas até se aproximar sem fazer qualquer
barulho, sem levantar qualquer suspeita. Os bandidos conversavam, mas não dava
para entendê-los. Riam muito e falavam palavras sem nexo. Um deles era baixo e
o outro um pouco mais alto e mais forte. Pensou que teria que vencer os dois,
caso necessitasse. Após um tempo, usando
uma lanterna eles caminharam por uma meia hora e penetraram em uma abertura na
rocha, desaparecendo. Logo pensou: Deve
ser este o local em que dormem e onde ela se encontra. Vou ter que passar a
noite aqui, até o dia clarear e depois entrar procurando encontrá-la.
Seu
relógio marcava dez horas e reinava um silêncio absoluto. Após uma hora ouviu o
grito de mulher, provavelmente sendo novamente estuprada. Não pode fazer nada, embora
seu ímpeto fosse de entrar e enfrenta-los. Mas, conseguiu segurar-se e esperar
quieto. Dormitava e acordava durante toda a noite. Por volta das 5,30 horas da
manhã começou a clarear e meia hora depois o sol aparecia no horizonte. Tomou
uns goles d´água, comeu um sanduíche e agora bem acordado, esperou ansiosamente
pelo aparecimento dos dois. Por volta das 7,00 horas apareceram à entrada da caverna e
pelo que entendeu despediam-se, pois um deles remaria até o Guarujá para
comprar mantimentos. Pelo que via de onde estava, não lhe parecia que portassem
arma de fogo.
Aguardou um pouco mais,
ainda bem escondido. Por volta das oito horas eis que, novamente, ouve a moça
gritando, falando palavrões e em seguida viu-a sair correndo para fora da caverna
gritando, pedindo socorro e o sequestrador vinha logo atrás com um porrete na
mão.
Corifeu armou seu
estilingue e saiu ao encalço dos dois. Logo o bandido conseguiu alcançá-la e passou a espanca-la, foi quando Corifeu apareceu:
— Espera aí seu covarde, batendo
assim em uma mulher?
O bandido se assustou e quis
tirar uma arma que trazia na parte posterior da cintura. Não deu tempo porque Corifeu deferiu-lhe uma pedrada certeira na testa
com o estilingue, que de tão forte, o jogou para trás. Em seguida caiu em cima
do bandido dando-lhe socos na cabeça e na cara, conseguindo imobilizá-lo. Retirou sua arma.
A moça estava parada,
estupefata. Pediu a ela que o ajudasse apanhando a corda que estava próxima.
Conseguiu amarrá-lo, mantendo-o deitado no chão.
Eduarda jogou-se encima de Corifeu,
abraçando-o aos prantos.
Pensou ele em aguardar a
chegada do outro bandido para conseguir derrota-lo também, mas raciocinando
melhor decidiu pegarem o caiaque e voltarem para a cidade, comunicar à polícia
para virem buscar o bandido preso e prender o outro quando chegasse. Amarraram
bem o bandido em uma árvore e partiram.
Após duas horas remando, estavam
novamente no Guarujá. O que primeiro fizeram
foi comunicarem-se com a família de
Eduarda, que já não acreditavam estivesse ainda viva, que após um mês de
procura.
Foram à primeira delegacia
que encontraram, onde ela fez um depoimento contando toda a
agrura que sofrera nas mãos daqueles dois desalmados. A polícia se prontificou
a ir até a ilha, remover o que estava preso e esperar pelo outro safado.
No dia seguinte os jornais
do Guarujá e mesmo os de São Paulo noticiavam o grande ocorrido, com os bandidos
presos. Eles já tinham passagem na polícia como ladrões e estupradores.
Corifeu recebeu uma
homenagem na Câmara do Guarujá e logo, dias após na de Ribeirão Pires. Nos
jornais, Eduarda descreveu com detalhes como conseguira escrever aquele
bilhete, colocá-lo dentro da garrafa vazia e atirá-la ao mar.
Foi isto que certamente a
havia salvado e, tinha certeza de que
após se aproveitarem muito dela, os bandidos dariam cabo à sua vida.
Tempos após, em seu posto,
Corifeu notou uma nova garrafa boiando, junto à praia. Apanhou-a, e dentro
havia outra mensagem que dizia...
Bem, mas isto é uma outra
história, que fica para a próxima vez!