ACORDE, MOLEQUE! - Sérgio Dalla Vecchia





ACORDE, MOLEQUE!
Sérgio Dalla Vecchia




— Acorde moleque, saía das minhas entranhas!

— Há anos você adormeceu ninado pelo calor do meu corpo, na busca de um futuro promissor.

— Hoje, senti saudades enormes de você. Desejo muito que voltemos aos onze anos!  Transporte-me célere ao mundo da inocência, das iniciações e dos sonhos, ao ritmo alegro da sinfonia desarmônica da puberdade. Joguemos futebol no quintal e vinte e um na cesta de basquete.  Cuidemos dos passarinhos, da tartaruga Bibi, do basset Pingo e das galinhas poedeiras, para depois, assistirmos junto ao ninho, a saída dos ovos direto da fábrica!

— Voltemos às aulas no Colégio Santo Agostinho, das broncas enérgicas dos padres espanhóis e a alegria de tocarmos repique na Fanfarra e desfilarmos garbosamente em sete de setembro no Vale do Anhangabaú.

 — Também às manobras radicais de bicicleta e patins defronte à casa da filha do professor. Folhearmos as revistas Cruzeiro e Manchete e babarmos com as fotos das misses e das vedetes no carnaval.

— Aos passeios dominicais nos parques da cidade, para depois saborearmos o lauto almoço da mama.

— Ah, moleque, que bem que você nos fará!

O natal está próximo, cores, sorrisos e religião pulverizados pelo ar.

— Assim, não me desaponte, vamos rápido!

Tudo ia bem no monólogo até que o moleque se manifestou pela primeira vez:

Adulto, façamos um trato então! Te levarei a todos os lugares que pediu, desde que retornemos também para o último Natal dos nossos 11 anos. Memorizemos os familiares, os sorrisos, os presentes, a ceia e o suave clima fraterno.

E que esse bom momento se compacte em um flash, para que nós dois o acionemos, por todos os Natais das nossas vidas. -  Disse o moleque convicto.

Trato feito, moleque! - Respondeu com alegria o adulto.


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