O segredo do Castelo - Ledice Pereira

 




O segredo do Castelo

Ledice Pereira


 

Aquele casarão, encoberto por tantas árvores, era tido como mal-assombrado.

Ditinho, garoto hiperativo, era motivo de preocupação constante para os pais. Tinha sido alertado por eles para não chegar perto dali. Mas quem disse que o menino obedeceu? A curiosidade foi mais forte. Não conseguia ficar parado. Estava sempre aprontando, embora estivesse sendo acompanhado por psicólogos e psiquiatras.

O processo de tratamento era longo.

O garoto liderava a turminha de amigos, tão levada quanto ele, convenceu-os a descobrir o segredo daquele casarão.

Os adultos chamavam de CASTELO, mas pra ele castelo tinha um monte de torres e era bonito. Aquele era escuro, coberto por uma folhagem que escondia até as janelas.

Era fim de tarde. Munidos de ferramentas, que surrupiaram dos pais, aproveitaram que o dia virava noite e, intrépidos, rumaram para lá, chegando bem perto da entrada, pé ante pé.

A casa estava vazia há meses. As plantas cresciam de maneira desordenada, os galhos enroscando-se uns aos outros, formando um verdadeiro labirinto, que os meninos sentiram certo medo de ultrapassar, mas incentivados pelo endiabrado menino, chegaram até a porta, tentando, em vão abri-la.

Rui havia trazido um pé de cabra. Acontece que não tinham força suficiente para usar o instrumento.

Como a janela era alta, resolveram fazer uma escadinha humana e Júnior, o menorzinho, foi o último a subir, com a intenção de pular para dentro. Combinaram que, uma vez lá dentro, ele viria abrir a porta para os outros. Simples assim.

O pequeno, depois de muito, conseguiu pular para dentro, usando uma pequena fresta.

Nunca mais voltou.

Os outros ficaram ali aguardando, aguardando. A noite caiu insensível. A temperatura atingiu o menor grau.

Gelados e com medo de enfrentarem os pais, os meninos estavam imóveis, olhos arregalados, incrédulos, sem saber o que fazer, como contariam para eles e, principalmente, para os pais de Júnior.

Sabiam que teriam que enfrentar a realidade, afinal, haviam infringido uma regra familiar e iriam com certeza ser castigados por isso. As mães saíram a procura dos filhos, chamando-os para jantar.

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(Ditinho se vê dentro do navio do Pirata Capitão Gancho do Peter Pan) ...

 

Não deu outra.

Pela teimosia de ter, não só se aproximado do “Castelo” mal-assombrado, mas também por incentivar a turma toda a fazer o pequeno Junior entrar no local, desaparecendo lá dentro, Ditinho recebeu dos pais um senhor castigo: ficar dentro de casa, mais precisamente dentro do próprio quarto, sem televisão, sem celular, durante as próximas duas semanas de férias, inclusive, o garoto faria suas refeições ali, só tendo permissão para ir ao banheiro e para tomar banho e escovar os dentes.

O garoto estava bastante revoltado. Sentia pena de si.

– Também não era pra tanto – pensava com seus botões. Dessa vez, eles exageraram! Aposto como os outros meninos não estão sofrendo como eu. Devem estar livres para fazer novas artes. E eu aqui, tendo que ler todos esses livros que a professora mandou ler e eu não li. Uma verdadeira maldade!

 

Para o menino, a noite custava a chegar. Respirava fundo, espreguiçava-se, esfregava os olhos, bufava e nada da hora passar.

O negócio era ler os tais livros. Afinal, a mãe ficara de verificar se ele havia cumprido o combinado. Em caso negativo, ela ameaçara de deixá-lo de castigo por mais duas semanas. E ela não era sopa. Quando prometia, cumpria.

O garoto nunca vira a mãe tão brava. Sentia que ela não estava brincando. Achava que ela já não gostava mais dele como antes.

Pegava o livro, começava a ler de onde havia parado. O pensamento fugia para longe dali. Ditinho divagava...

Agora, nadava em alto mar, dando braçadas vigorosas. O que seria aquilo? Parecia uma embarcação antiga. Vinha se aproximando rapidamente.

– Socorro! Vou ser atropelado – gritou, apertando fortemente os olhos.

Ao entreabri-lo, deu com ele à sua frente. Sim, o próprio. O Capitão Gancho.

– Que homem horroroso, pior do que eu havia imaginado – pensou.

Aquela mão..., digo, aquele gancho! Parecendo querer me atingir. Eu nem fiz nada pra ele.

De repente, viu-se alçado por aquele ser desfigurado e atirado para dentro da embarcação que balançava pra cá e pra lá, fazendo com que ele fosse jogado para um lado e para o outro. Estava apavorado, em pânico. Sentia-se ameaçado, sem chance de escapar.

Que vontade de voltar pro seu quartinho. Ficou até com vontade de ler todos aqueles livros, ali quentinho, protegido.

Lembrou-se da oração que havia aprendido na escola. Rezou com toda sua força interior, pedindo a Deus que o trouxesse de volta para sua casa. Jurou que seria um menino melhor.

Abriu os olhos. Aliviado, pegou o livro jogado no chão e voltou a ler, agora com um interesse que nunca antes havia experimentado. Iria mostrar à mãe que havia mudado.

Ela precisava voltar a amá-lo.  

 

 


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