Não basta
ser recepcionista. Há que ficar atenta.
Ledice
Pereira.
Ser
recepcionista no hotel de luxo na região dos Jardins, em São Paulo, sempre
lotado de executivos, deixava Felícia sem tempo até para fazer as refeições.
Mas ela
curtia o trabalho. Na verdade, divertia-se muitas vezes com as confusões
ocasionadas pelas ligações telefônicas que, por alguma razão que ela
desconhecia, se cruzavam, provocando situações hilárias ou constrangedoras.
Naquela
manhã, ao transferir uma ligação, interceptou uma conversa pra lá de esquisita,
a começar pela voz gutural que ameaçava de morte o interlocutor. A
princípio, ela até julgou tratar-se de uma brincadeira. Ia desligar quando
percebeu a voz trêmula do receptor que suplicava por clemência.
Tremendo
dos pés à cabeça, Felícia acionou o segurança do hotel que, imediatamente,
dirigiu-se ao apartamento do hóspede. Como ninguém atendeu à porta, usou a
chave reserva, adentrando ao recinto onde o encontrou caído. Parecia um ataque
cardíaco.
Os
paramédicos do hotel vieram dar os primeiros socorros e o Resgate foi chamado.
No Pronto-Socorro, ele foi prontamente atendido, ficando em observação e
submetido a uma bateria de exames. Graças à Felícia e pela presteza do
atendimento, um infarto havia sido evitado.
No hotel,
em alvoroço, Felícia tinha que explicar como soube que algo grave estava
acontecendo naquele apartamento. Ela teve que contar e recontar inúmeras vezes.
Quando
todos estavam voltando aos seus postos, Felícia ouviu aquela voz gutural que
jamais esqueceria. Ficou imóvel. Sua voz sumiu, não conseguia nem avisar os
seguranças. Suas pernas tremiam, não permitindo que ela se movesse. O homem foi
entrando, empunhando uma arma apontada para todos e dirigindo-se para o
elevador.
Os
seguranças, atentos, conseguiram desarmá-lo e o contiveram com certa
dificuldade. A Polícia foi chamada e o homem, velho conhecido por provocar
inúmeros incidentes, tinha várias passagens pela Delegacia da região. Algemado,
foi conduzido ao 78º Distrito Policial.
Felícia
sofreu uma crise nervosa, provocada pelos acontecimentos, não conseguindo parar
de chorar. Foi levada para o ambulatório, onde foi medicada e dispensada do
trabalho no resto do dia. Afinal, ela foi considerada heroína por evitar, com
sua percepção, algo de muito grave que poderia ter acontecido.
Após alguns
dias, o hóspede retornou do hospital, procurando saber quem seria o responsável
por estar vivo. Fazia questão de recompensá-lo. Ficou surpreso ao saber que se tratava
de uma jovem.
Revelou
então que vinha sofrendo ameaças, desde que chegou a São Paulo. O homem se fez
passar por motorista de táxi e o trouxe do aeroporto, oferecendo-lhe seus
serviços de guia turístico.
A voz
ameaçadora e como se comportava o pretenso motorista o deixaram desconfiado,
dispensando os serviços de guia, o que provocou a ira do meliante que
passou a tentar extorqui-lo, afirmando ter ficado à disposição, deixando de
atender a outros interessados.
Confessou
que andava apavorado e pretendia denunciá-lo à Polícia, quando foi ameaçado de
morte naquele telefonema e sentiu-se mal. Felizmente, Felícia havia evitado um
mal maior, merecendo a recompensa.
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