Pacifico com a ajuda de Deus, imagine sem... - Oswaldo U. Lopes

 


Pacifico com a ajuda de Deus, imagine sem...

Oswaldo U. Lopes

 

         Pacifico que pelo nome não se ache, era ainda mais pacifico do que fazia supor o pronunciado no batismo. Daí o susto, a surpresa, o inimaginável, quando o desconhecido se aproximou e sem sutileza sapecou o convite inesperado:

— Minha proposta é simples, você vai se tornar um milionário, mas tem de sair para uma viagem do jeito que está, com essa roupa e o dinheiro que tiver.

         Pacifico nem titubeou em recusar a oferta, tem cada maluco neste mundo, onde já se viu? Era melhor ter visto, não devia recusar assim sem mais. Virou as costas e foi-se...

         Foi-se para ser assaltado na outra esquina e ficar sem o pouco dinheiro que tinha. Tentou parar um ônibus e explicar porque estava sem dinheiro para a passagem. Ouviu a porta fechando e escutou uma praga: “Me aparece cada uma, vagabundo”.

         Seguiu a pé, pensando só me falta chover. Olhou para o céu e viu a chuva vindo, lembrou-se do seu Osório, mas não tinha a verve de Noel e o dinheiro não estava com o bicheiro, mas com o assaltante.

         Molhado, suado, enojado, cansado de ser Pacifico pensou em procurar uma saída, alguém que tivesse piedade dele. Afinal fora lá que nascera, em Piedade.

         Nossa Senhora da Piedade, o menino pacifico, Pacifico até no nome, seguindo a procissão, aquela mulher tristonha com lágrimas escorrendo no rosto, será que teria piedade dele nesse momento tão sofrido? Silêncio total, a da Piedade devia estar ocupada com outras tarefas.

         O que mais poderia dar errado? Molhado, sem dinheiro, sujo, com frio, continuou caminhando e, escorregou caindo com o traseiro numa poça de lama.

         Não podia reclamar, devia mesmo agradecer a da Piedade, não sentiu nenhum osso quebrado, nenhuma dor nos braços e pernas. O fundilho estava sujo e enlameado e na ponta do rabo doía um pouco. Considerando o que vinha acontecendo era até pouco, quase conseguiu pensar que estava com sorte. Foi um mau pensamento, pois ai surgiu o cachorrão que se aproximou e começou a lamber seu rosto com aquela língua enorme que parecia uma lixa.

         Sentiu-se cansado, perdido, ferrado, vitima de todos os “f” que conseguia lembrar. Levantou-se, fez cosquinha no cachorro e foi caminhando, não aguentava mais, viu um cantinho da calçada com grama e deitou- se ali mesmo, molhado com molhado, o cão junto.

         Em silêncio, ficou rezando pedindo que o mundo acabasse, mas nem nisso foi atendido, o mundo não só não acabou como continuou a girar.

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