FAZENDA DOS SONHOS
Antonia Marchesin
Gonçalves
Marcelo
e Olivia quando casaram tinham o sonho de viver e criar os filhos que tivessem
em um sítio que fosse fora da cidade. Para isso se dedicaram ao máximo ao
trabalho, economizaram o suficiente para alcançar esse sonho. Não precisaram
fazer grandes esforços, sendo que os dois com boa formação acadêmica eram
excelentes profissionais e bem remunerados. Após dois anos de casados decidiram
que já era hora de serem pais e foram à procura de um sítio, não muito longe da
cidade, mas que tivesse espaço e características de sítio.
Encontraram não um sítio, mas uma fazenda abandonada, até as cercas rompidas.
As fotos pela internet eram bem nítidas. O que chamou a atenção do casal foi um
relógio antigo de ferro em frente da casa. Pela internet tudo fácil e rápido.
Se muniram do endereço e lá foram eles, a propriedade ficava a uma hora da
cidade. Indo pela estrada, pararam em um restaurante para tomar um café e ao
descerem foram despertados pelo cheiro que vinha da famosa torta de maçã
esfriando na janela, entraram com água na boca. Talvez a torta fosse a única
coisa atraente nesse restaurante. O lugar era tosco, antigo, de pouca
iluminação, mesmo assim aparentava limpeza. Até a garçonete parecia ser do
tempo da inauguração. Perguntaram sobre a fazenda, porque estava à venda, e
ficaram sabendo que o único herdeiro, já idoso, morava numa casa de repouso e
não tinha mais condição de administrar a propriedade, foi então que decidiu
vendê-la. Marcelo e Olivia ficaram curiosos. Uma fazenda que vinha de pai
para filhos, que já possuí a sua própria história, que a história morreria
naquela geração, mas que poderia continuar com os filhos que gerariam. Parecia
um bom presságio.
Ao chegarem viram que realmente seria muito trabalhoso torná-la habitável. Ao
entrarem a porta rangeu forte, causando arrepios. Marcelo comentou: Primeira
coisa, temos que lubrificar essa porta. A casa estava toda mobiliada, o que
poderia ser bom. Os móveis estavam protegidos da poeira, cobertos com lençóis
brancos, naquele momento transferindo uma imagem fantasmagórica. Estranharam as
chaves modernas de automóvel do ano, na mesinha de madeira ao lado da porta,
não tinham visto carro algum. À medida que andavam, as tábuas rangiam
provocando desconforto nem Olívia que sempre foi temerosa com temas
sobrenaturais. Seguindo pelo corredor da área íntima, os quartos estavam com as
portas abertas, exceto um. A chave e a cor da porta eram diferentes das outras,
o que os deixou curiosos. Marcelo pôs a mão na maçaneta, e Olivia com voz de
temor, pediu para não abrir, ele brincou: Você tem medo do que? Acha que vai
ter um corpo dentro do armário, sua tonta?
Abriram a porta devagar, e para surpresa de ambos, não era um quarto de dormir,
mas sim um escritório antigo com uma janela envidraçada atrás de uma
escrivaninha e uma máquina de escrever dos anos sessenta. Uma folha de papel
ainda no carro da máquina, chamou a atenção deles. Aproximaram-se curiosos,
queriam ver se havia algo datilografado nele. Porém, nesse momento o tempo
fechou lá fora, e foi escurecendo rápido demais. Os trovões eram ensurdecedores.
Os relâmpagos riscaram o céu depois de chuparem atingindo árvores perto dali.
Rapidamente o interior da casa ficou às escuras. O casal foi pego de surpresa.
Marcelo tateou aqui e ali em busca de um interruptor, ou de algo que
indicasse um lampião, ou lamparina, mas não encontrou nada. Pensou na lanterna
do celular, mas teve medo de ficar sem bateria. Sem outro meio, optou pelo
celular, clareou o ambiente.
Nesse exato instante, Marcelo ea esposa viram-se aterrorizados. Havia um vulto
sentado diante da máquina de escrever. O vulto datilografava muito
rapidamente. Olivia gritou e recuou alguns passos. Marcelo não. Apesar de
muito apavorado, chegou mais perto para ler o que estava sendo escrito, e para
a sua surpresa dizia: Não comprem, essa fazenda. Ela me pertence, e abaixo
havia uma marca que simbolizava um sinal de cruz. Marcelo agarrou a mão da
esposa e puxou-a com força para fora da casa. “Vamos embora daqui, Olivia!”.
Saíram correndo, diretamente para o carro. Alguns minutos de estrada, já
estavam no asfalto. A chuva havia amainado e Olivia ainda com o coração
disparado quase saindo pela boca, deu a última olhada comum adeus pelo vidro do
carro molhado.
Resolveram adiar o projeto dos sonhos por mais um tempo.
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