Foto do lago
Aussen Alster de Hamburgo Ragnar Stefannson Hoenig.
Iara, a mãe das águas
Ises
A. Abrahamsohn
Na
superfície do lago o reflexo acobreado de um sol já posto brilhava sob a luz da
esplendorosa lua acima do horizonte. Vítor mesmerizado, observava a paisagem fantasmagórica.
Sentia-se suspenso no tempo. Apenas os ramos dos salgueiros balouçantes à leve
brisa indicavam que não se tratava de uma visão conjurada pela mente. Os dois
veleiros absolutamente imóveis não revelavam presença ou atividade humana.
Estarei
sonhando?
Ao
fixar o olhar na superfície do lago, pareceu a Vitor haver uma ligeira
ondulação.
É
o vento.... Estranhamente, agora os salgueiros estão imóveis, pensou.
Da
superfície viu erguer-se a bela mulher de pele morena, de cabelos negros, lisos
e compridos acariciando os seios de bicos firmes e duros. Iara, chamou... Iara
.... E foi caminhando na água até chegar ao abraço poderoso que o arrastou para
o fundo escuro do qual não voltaria.
Nunca
conseguiria esquecer Iara. Haviam se encontrado em Belém, há um ano quando ele fazia
um estágio no Instituto Goeldi. Foi uma paixão feroz. Coup de foudre, como dizem
os franceses. Passou mais rápido para ela do que para ele. Depois de três meses
ela anunciou que iria embora. Para Manaus, catalogar outros espécimes no
interior da selva amazônica. Arrasado, ele propôs largar tudo e acompanhá-la.
Não adiantou. Em três dias ela o deixou só, completamente solitário em Belém.
Não quis deixar endereço. Foi ótimo enquanto durou, ela disse ao se despedirem.
Vítor não conseguia mais trabalhar. Após uma semana foi procurá-la em Manaus.
Finalmente a localizou no INPA. A princípio a moça se negou a encontrá-lo.
Estava muito ocupada, coletando insetos num igarapé a duas horas de Manaus. Ele
insistiu. Já que estava ali, podia ir junto e ajudá-la na coleta. Partiram os
dois, bem cedo, na canoa de motor de popa. Cruzaram o Solimões e navegaram pela
calmaria do Negro. Embarcações de todos os tamanhos vinham no sentido contrário
para Manaus
Conversaram pouco na viagem, apenas os
projetos dela e de Vítor. Ele,
cauteloso, não mencionava a separação. Continha-se para não estender a mão e tocar
Iara. Ansiava deslizar a mão pela pele macia do pescoço até a fenda da camisa onde
entrevia a curva dos seios. E o perfume. Que era apenas dela. Amálgama de suor fresco
com o leve toque do sabonete do banho da manhã. Evocou Iara ao chuveiro. Ao
chegarem na região dos igarapés, puxaram o barco para terra firme e montaram a
mesa dobrável e o material de coleta.
Vítor
não se conteve mais. Abraçou Iara e começou a beijá-la. A moça o afastou,
irritada.
─
Chega, Vítor. Já conversamos. Somos apenas amigos agora. Nada mais.
Mas
Vítor não queria ser apenas amigo. Voltou a abraçá-la, mais firme até que ela
se desvencilhou e gritou que já tinha outro. Que ele parasse. Mas ele não
desistiu. Ela correu para o barco. Escorregou no barranco e caiu na água escura
do igarapé. O rapaz puxou-a de volta ao barranco lamacento.
E
Iara de novo escapou para alcançar o barco e dar a partida.
─
Não vai me deixar aqui, sua safada, gritou Vitor agarrando-a pelas costas e
derrubando Iara no raso do igarapé. As mãos alcançaram o pescoço enquanto ela se
debatia e gritava para ele parar, que sim, ela voltaria para ele. Tarde demais.
Quando percebeu que Iara parou de respirar, Vítor empurrou o corpo que afundou silenciosamente
nas águas escuras do igarapé semeadas por raros reflexos do sol.
Dois
dias depois, Vítor voou para Hamburgo.
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