FELÍCIO, O BOM VELHINHO.
Antonia Marchesin Gonçalves.
Felício estava em paz naquele dia, havia acabado de
enterrar sua mãe querida.
Era filho único, morando no sítio no interior de
São Paulo, onde cresceu e desde bem pequeno ajudou os pais, convivendo com o
dia-a-dia da agricultura.
Aprendeu a realizar todas as tarefas do preparo da
terra, plantio, colheita, armazenamento e venda dos produtos.
Quando os pais envelheceram e adoeceram, ele cuidou
deles. Primeiro o pai, e depois a mãe. Apesar do desolamento, via-se com a
missão cumprida.
Meses depois, começou a sentir a casa vazia. Era
natural o silêncio e arrebatamento com o avançar da idade. Mais tarde, o início
de ansiedade e solidão. Foi quando pensou: não posso deixar que a depressão
assuma minha vida, preciso fazer algo.
Felício, então, teve uma ideia que lhe parecia
satisfatória. Ligou para a Prefeitura, pediu autorização para trazer, uma vez
por semana, as crianças da creche ao sítio. Eram crianças de cinco a sete anos.
Ele era um homem rico, não teria problema em financiar tudo, desde o
transporte até a cozinheira. Teriam as crianças o café da manhã e almoço elaborados
com frutas, legumes e verduras colhidas na propriedade. O lanche da tarde teria
leite de suas duas vaquinhas.
A direção da escola considerou que seria um bom
aprendizado a vida no campo e autorizou o passeio semanal das crianças. Seria
uma atividade de mão-dupla, aprenderiam as crianças e fariam companhia para
Felício, o bom velhinho. Os professores, imediatamente, organizaram aulas
semanais ao ar livre, onde aprenderiam a plantar, regar e colher. Com Felício
aprenderiam, além de todas as tarefas de cultivo, a manter a casa em ordem,
mesmo que estivesse sozinho.
Felício ficou muito feliz com a programação e
trabalhava para que tudo fosse prazeroso para as crianças. Chegou a montar um
playground completo na vasta área próxima à casa.
Com o tempo, tudo virou uma encantadora realidade.
Os seus gatos e cachorros se acostumaram com as crianças e interagiam felizes.
Certo dia, ele se sentiu muito mal e não conseguiu
se levantar. Faleceu ali mesmo, entre os lençóis alvos e o cheiro da grama que
entrava pela janela. Naquele dia, mais tarde, as crianças o encontraram morto.
Para os pequenos, foi um susto muito grande, já estavam tão acostumados aos
mimos de Felício.
O prefeito realizou um sepultamento digno de uma
celebridade, a escola fechou para o enterro, as crianças totalmente
desconsoladas foram dar adeus ao bom amigo Felício.
No testamento de Felício, o sítio foi doado para a
creche como lugar de educação contínua sobre agricultura, resiliência,
alimentação saudável e dedicação. Ficaria a responsabilidade de manter a
tradição de passar um dia por semana, ou mais, cultivando seus próprios
alimentos.
A uma semana do Natal, as crianças o apelidaram de Papai Noel, o bom velhinho.
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