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CORAGEM - Sergio Dalla Vecchia

 

CORAGEM

Sergio Dalla Vecchia

 

Conceição tapou minha boca com mãos trêmulas. Ela estava com medo, pensei. Ela grunhindo impulsos de ¨psiu¨ me agasalhou com o seu corpanzil na escuridão do armário da lavanderia.

Assim ficamos unidas, tão juntas que parecíamos uma só pessoa. A respiração em sintonia trocava calor com o ar úmido característico do espaço, azulejado e com piso fresco de cerâmica.

Ouvimos passos e vozes. Uma feminina outra masculina, cada vez mais próximas do nosso esconderijo. Quanto mais chegavam, mais Conceição me apertava e selava minha boca com um ¨psiu.¨

─ Não há ninguém aqui na lavanderia e muito menos algo de valor. – Disse o homem para a companheira.

─ Pelo visto, no corpo da casa também não há ninguém, então vamos logo pegar o que pudermos e fugir rápido antes que surja alguém. - Orientou a voz masculina.

Conceição sabia perfeitamente que os patrões estavam ausentes e sentia-se responsável por mim diante daquela difícil situação.

O casal de ladrões virou-se e foi em direção à porta aberta da cozinha.

Foi um alívio, Conceição soltou minha boca, aliviou-me do apertado aconchego e assim sobrevivemos ao apavorante episódio.

Ocorreu que ao tentar sair do armário eu derrubei um rodinho que estava encostado na parede, produzindo um ruido característico de madeira na cerâmica.

Foi o suficiente para chegar aos ouvidos aguçados da ladra, que parou, olhou para o parceiro e com os olhos indicou que iria verificar o ruido.

Ela dirigiu-se à lavanderia pé ante pé com arma em punho. Eu continuei me escondendo no armário, mas agora sem o amparo da Conceição. O que será de mim, pensei eu!

Nesse exato momento ouvi o barulho de um corpo caindo ao chão, em seguida a porta do armário se abriu. Eu encolhida em posição fetal esperava a morte. Para meu espanto era Conceição que me abraçou e mandou-me correr em direção à Rua pelo corredor externo em busca de socorro. Parti em disparada!

Conceição em choque, ainda entendia que havia derrubado a ladra com uma contundente pancada na cabeça, fazendo uso do ferro de passar roupas. Achava que a havia matado. Desesperada lembrou do comparsa que ainda estava dentro da casa.

Nisso ela ouviu um grito de socorro. Era meu, tentando escapar do homem que me agarrou no corredor, antes mesmo que eu atingisse o portão.

Conceição em desespero, pegou a arma da mulher caída e partiu em direção aos meus gritos.

No corredor, eu entre as pernas do bandido segura pelo pescoço, tentava me soltar. Nisso, do nada surgiu a minha querida Conceição, arma em punho, desfigurada, era outra pessoa, parecia um xerife do velho oeste.

─ Solte a menina já. É uma criança!

─ Venha pegá-la, sua doméstica metida a valentona. - Respondeu o bandido efusivamente.

─ Vou repetir só mais uma vez, solte a menina que eu deixarei você fugir.

─ Cadê minha companheira? - Perguntou o bandido.

─ Está no inferno te esperando caso você não solte a pequena. - Esbravejou a convicta Conceição.

Houve uma pausa.

O bandido, engatilhou o revólver e apontou para a minha cabeça.

Nesse mesmo instante Conceição fez o mesmo com a arma dela.

Duas armas engatilhadas, uma apontada para minha cabeça e outra para o meio dos olhos do assaltante.

Silêncio no ar!

Eu esperava tremendo, com os olhos fechados, o tiro que me levaria prematuramente para o céu. Porém, o bandido em dúvida, não sabia se iria para o inferno ou me soltaria e fugiria conforme a proposta da xerife.

A expectativa do desfecho estava insuportável.

Quando senti o cano do revólver desencostar da minha cabeça e meu pescoço livre, voei para os braços da minha querida heroína.

─ Vaza seu bandido de araque, antes que eu me arrependa. - Ordenou Conceição triunfante, assoprando cano do revólver como no velho oeste.

Agora, você chispa para seu quarto e fique quietinha. Ligarei para seus pais e para a Polícia.

Após tudo esclarecido, Conceição foi absolvida por legítima defesa, ainda recebeu medalha de bravura e gratidão eterna da família que a abraçou como seu mais novo membro.  

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