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Busca Indefinida - Ledice Pereira



Busca Indefinida
Ledice Pereira


A mesmice daquele casamento de vinte e cinco anos começava a incomodar Gisela. Principalmente agora, que sua filha resolvera fazer um intercâmbio e a casa ficara tão vazia.

Seu trabalho de tradutora juramentada, se, por um lado, lhe permitia ter o horário que quisesse, por outro, provocava-lhe enorme tédio. Trabalhar em casa, sem contato com outras pessoas, tinha sido bom enquanto os filhos dependiam dela. Agora que Renato se casara e Janete partira para a Austrália a casa se tornara enorme para ela e Carlos. Ela sentia falta de gente, de emoções, de movimento.

Carlos era um bom companheiro. Curtia ficar em casa, procurar um bom filme no Netflix, se encorujar no sofá pertinho dela.

Ele até tentava suprir a falta dos filhos, convidando-a para sair, mas não era isso que ela desejava.

Aquela monotonia a deprimia.

Custou a criar coragem e pedir a separação. Ele, a princípio, assustou-se. Achava que tudo estava tão bem, mas com a insistência dela, concordou em mudar-se para um flat. Tinha a certeza de que seria uma situação passageira.

Gisela sentiu-se livre para viver muitas emoções, para conhecer pessoas interessantes, para frequentar nova academia, novos bares, novos restaurantes, enfim.

Os primeiros seis meses foram de descobertas. Gisela saia todas as noites, descobriu locais para dançar, conheceu rapazes de todos os tipos. Não aparentava ter quarenta e oito anos. Relacionou-se com alguns. Ela os achava cheios de vida, atléticos, divertidos. Todos mais jovens do que ela, mas a diferença de idade não parecia ser problema nem para ela, nem para eles. Como ela, nenhum queria uma relação duradoura.

Assim estava ótimo. Continuava com sua independência.

Ela não contava com o charme de Marcelo. Ele apareceu de repente. Os olhares se cruzaram.  Sentiu-se como que hipnotizada. Ele exercia forte atração sobre ela. Não costumava se render ao primeiro encontro, mas não conseguiu resistir. Deixou-se levar a um Hotel próximo dali. Ali viveu momentos de prazer que nunca havia sentido. O rapaz era voraz sem deixar de ser gentil e cavalheiro. Procurou deixá-la à vontade. Não a forçou a nada. Conhecia todos os meandros para levá-la ao ápice. Passaram ali a noite. Acordou com uma bandeja de café da manhã com tudo que tinha direito. Mal podia acreditar. A cabeça rodava. Talvez efeito do Champagne.

Acho que ontem exagerei na bebida, mas confesso que nunca me senti tão bem pensou com um sorrisinho maroto.

Despediram-se sem trocar telefones ou endereços. Ela saiu dali flutuando. O semblante era de felicidade. Chamou a atenção dos passantes. Atravessou a rua sem mesmo enxergar os carros naquela via movimentada. Estava em êxtase.

Ouviu distante o ruído da ambulância, que se aproximava, sem se dar conta.

 “Wiiiiiiiiiiiiuiuiuiuiuiuiui”.

O rapaz, do outro lado da rua, percebeu o que estava prestes a acontecer. Nem pensou duas vezes. Correu na direção da desconhecida e a empurrou para trás. Ela caiu sem entender.

Ele se desculpou. A ambulância passou ligeira. Ele conseguiu salvá-la.

Passados alguns minutos, Gisela se deu conta de que acabara de sobreviver. Procurou o rapaz para agradecer. Ele desaparecera.

Sentiu um arrepio. Percebeu que estava se expondo demais. Que preço poderia pagar por sua tão sonhada liberdade!

Fez sinal para o primeiro táxi. Deu seu endereço. Ligou para Carlos.

Oi querida, aconteceu alguma coisa?

Aquela voz lhe trouxe uma paz reconfortante.

Senti sua falta. Preciso muito ver você. Venha jantar comigo essa noite.
Quando o enxergou atrás do lindo bouquet de rosas vermelhas, ela desmontou.

Abraçou-o como nos velhos tempos. Parecia querer recuperar o tempo perdido.

Ele não entendeu nada. Deixou-se levar pela emoção que sentia quando estava ao lado da mulher.

Ela reconheceu que havia sido infantil. Que se deixara levar pelo desejo de uma busca indefinida. Reconheceu que a vida pode ter muito mais emoções do que aquela fugaz num quarto de hotel qualquer.





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