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O Destino no Farol - José Vicente J. de Camargo


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O Destino no Farol
José Vicente J. de Camargo


Sempre que o via imponente, isolado, plantado no meio daquela ilha rochosa e cercado pelo mar sem fim, me invadia uma sensação de paz e tranquilidade. Tão distante de tudo e de todos, impossível imaginar que ali pudesse haver conflitos e angustias.

Até que fiquei sabendo da história do faroleiro que o habitava desde seu nascimento. Perdeu a mãe no parto e foi criado pelo pai, homem letrado porém rude, que por um desgosto de amor, refugiou-se da vida, trancando-se na solidão do farol. Foi educado pelo pai que o ensinou os princípios da ética e da moral e a ver a solidão como uma companheira que o protege dos infortúnios, das intrigas, das más tentações da vida.

E assim cresceu, mirando o horizonte que nunca chegava. Aprendeu com o pai a arte rústica da pesca, dos mergulhos profundos, da biologia das plantas que vingavam nas rochas da ilha, assim como da vida marinha ao seu redor e da astronomia do céu que a encobria. Com a idade, o pai lhe ensinou os princípios da navegação, da orientação pelos astros e do funcionamento do farol, garantindo-lhe o futuro de ser seu sucessor.

Uma vez ao ano, um navio ancorava ao longe e um barco trazia os víveres não perecíveis e as peças de manutenção suficientes até o próximo ano. Nestas ocasiões era tentado a partir, mas a figura austera do pai e os desafios do além-mar o retinham. A solidão, a falta de perspectiva e a ausência de um ser humano além do pai, com quem pudesse se comparar, trocar emoções e ideias o incomodavam. Quando mirava ao longe uma embarcação, se imaginava nela conversando com pessoas, fazendo atividades diversas – rir e chorar, sabia o que significavam, mas não conseguia interpretá-las, por não sentir tais sensações.

Passou a falar com as aves marinhas que em voos rasantes sobrevoavam a ilha ou com os golfinhos em suas danças acrobáticas.

Um dia ao acordar, não sente o aroma forte do café nem do pão recém-assado no forno. A falta do tradicional “bom-dia” do pai lhe confirma que este já não faz parte deste mundo. Partira sem dizer adeus, como a tempestade do mar que bate forte, amedronta, depois cessa silenciosamente sem deixar vestígios.

Toma a decisão de partir na próxima vinda do navio provedor. Mas até lá vai sentindo uma angústia crescente, uma luta interior pelo sim, pelo não. Se assusta em pensar no desconhecido. Lembra-se de seu pai narrando sobre a força de destruição dos tsunamis – e no mundo, desgovernado pela ação dos homens, surgem cada vez mais, dizia.

O navio aporta ao largo e ele, ainda indeciso, entre as raízes que o prendem ao rincão de nascença, as lições do pai e a proteção da natureza virgem, ou se aventura na liberdade do viver no meio dos perigos que ameaçam um ser ingênuo.

O maremoto da sua angústia cessa, com a proximidade do barco de víveres. Nele, sentado à proa, uma cabeleira negra se esvoaça ao vento. Um rosto sereno, de finos traços se apresenta a ele:

Me chamo Isaura, diz. Estou a procura de um local ermo, onde possa explorar melhor minha força interior. Disseram-me que seu pai faleceu e talvez tivesse um lugar para mim...


A sensação de diluvio que carregava na alma dissipou-se. Viveu até completar um século e seus filhos ouviram várias vezes dele, a história dos homens e dos perigos de seus tsunamis, enriquecidas pelos relatos maternos...

Mas, completava ele, o destino é de cada um, como as ondas do mar que terminam em praias calmas, em embocaduras bravias de rios, em manques alagadiços ou em duras encostas...

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