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Em terra de cegos quem tem um olho é penalizado - Ises A. Abrahamsohn


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Em terra de cegos quem tem um olho é penalizado
Ises A. Abrahamsohn

Anna estava para dar à luz. Era lavadeira, muito pobre e não tinha como pagar a parteira para vir à sua esquálida morada. Tinha ouvido sua vizinha contar que as novas clínicas para mulheres na cidade acolhiam as futuras mães e, melhor, cuidavam dos recém-nascidos nos primeiros dias. Mas a amiga insistiu para que procurasse de toda a maneira ser aceita na clinica do Dr. Ignaz. Ao chegar à clínica, Anna encontrou muitas outras mulheres, todas querendo ser atendidas no serviço do Dr. Ignaz.

Lá, as mortes de febre após o parto eram mínimas enquanto que nas alas chefiadas pelos outros obstetras a mortandade das puérperas era assustadora. Anna teve sorte. Ao entrar no corredor das enfermarias do Dr. Ignaz Semmelweis, viu ao lado de cada porta uma bacia com água com cheiro forte de cloro. Era do mesmo tipo que ela usava para alvejar os lençóis.

Quando entrou em trabalho de parto vieram o professor e os estudantes de obstetrícia, para examiná-la. Era o preço que as pobres pagavam para serem atendidas naquele hospital gratuito.  O médico, perguntou aos alunos se haviam de fato lavado as mãos na solução de água sanitária. Anna ouviu o jovem médico ensinar que isso era necessário para que eles eliminassem das mãos as partículas da sala de autópsia que causariam a febre puerperal nas mães. Os estudantes, alguns dos quais incrédulos, obedeciam. Afinal era o professor e médico chefe. Ademais, os resultados eram evidentes. Antes do Dr. Semmelweis a mortalidade chegava a 15 % e após a lavagem de mãos caiu a 1 % semelhante à das enfermarias das parteiras, onde os médicos ou estudantes não circulavam. Anna se tranquilizou e, após quatro dias, saiu saudável da clínica  com seu recém-nascido.

Teve sorte e conseguiu um emprego de lavadeira numa casa rica de Viena onde lhe permitiram levar a criança. A casa pertencia ao chefe do Dr. Semmelweis, que ficara conhecido das mulheres vienenses como “o salvador das mães”. Assim ficou sabendo que, apesar disso, o jovem médico não fora mais recontratado pela clínica. Os colegas não acreditavam na sua teoria de partículas infectantes provenientes da autopsia. Teve que deixar Viena e voltou para Budapest, sua cidade natal. Embora seus antigos alunos e médicos da Inglaterra e da Alemanha repetissem com sucesso os seus experimentos, Semmelweis foi desacreditado por colegas influentes e invejosos. Amargurado, escrevia cartas aos seus detratores acusando-os de cegueira e de serem assassinos de mulheres. Foi internado por ex-colegas em um hospício  de Viena e morreu duas semanas depois, em 1865, aos 47 anos, com infecção generalizada decorrente de uma ferida contaminada, tal como morriam as jovens mães acometidas de febre puerperal.


Neste mesmo ano, Pasteur já havia desenvolvido sua teoria microbiana das enfermidades infecciosas. Na Inglaterra, Joseph Lister aplicou os conhecimentos de Pasteur para eliminar os micro-organismo vivos de feridas e incisões cirúrgicas. Em 1871, o próprio Pasteur obrigou os médicos dos hospitais militares a ferver o instrumental e as bandagens que seriam utilizados nos procedimentos médicos. E Robert Koch em 1878 e 1880, baseou-se nas descrições de Semmelweis para identificar e demonstrar a origem microbiana das infecções por  bacilos do carbúnculo e da tuberculose.

Um comentário:

  1. Comentário da autora do texto - Ises : Lembremos também do nosso maior médico sanitarista Oswaldo Cruz que enfrentou a ira dos cariocas na caça aos ratos, aos mosquitos e na vacinação contra a varíola no inicio do século XX para combater respectivamente a peste bubônica, a febre amarela urbana e a varíola.
    Mais em :
    http://super.abril.com.br/comportamento/oswaldo-cruz-tudo-pela-saude/

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