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Filha adotiva - Fernando Braga

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Filha adotiva
Fernando Braga

       Há muito tempo, a filha de 21 anos de um casal de sírios engravidou, em uma de suas andanças, o que fez com que sua família ao tomar conhecimento, a expulsasse de casa. Como sobreviver, difícil saber, mas quando aproximou a hora do parto, foi atendida em um hospital Escola. Nasceu uma criança perfeita, moreninha como o pai desconhecido. A mãe a abandonou no hospital, quando soube que iria ter alta. Realmente não ia ter condições de criar a filha, uma vez que não sabia como seria sua vida dali para a frente. A criança, com apenas alguns dias, foi adotada por um casal que não tinha filhos.

       A mãe adotiva, combinou com o marido, que nunca comentariam a adoção com qualquer pessoa e nunca falaria a esta criança que era adotiva. Apenas os familiares mais próximos tomaram conhecimento, mas a todos foi proibido que comentassem a adoção. Advertiu a todos, que concordaram, jurando de pés juntos!
       A criança cresceu, sempre tratada como uma filha natural, em que nada lhe era negado, frequentando boas escolas e bons ambientes. Tinha muitas primas com as quais brincava, passavam férias juntas, e, mais do que as outras, tinha tudo do bom e do melhor. Seu nome era Maria Angélica.

        Com 10 anos, perguntou pela primeira vez à mãe, porque tinha a pele mais escura, uma vez que sua mãe era loura, de olhos azuis. A mãe ficou desconcertada e disse que ela havia puxado mais o pai, que era baiano. A mãe, não admitia que aqueles que sabiam do fato, fizessem qualquer comentário que pudesse alerta-la. Aquilo tornou-se obsessão.  

        Um dia na escola, uma coleguinha com quem havia discutido, disse que ela era adotiva. Quando a mãe soube do comentário, imediatamente retirou-a desta escola. Em outra ocasião, uma filha da vizinha, com quem raramente brincava, também fez referência a este fato. A família logo deu um jeito de se mudarem dali e distante.

       Os familiares, todos fazendo parte de uma família unida, não ousavam sugerir à mãe que contasse a verdade para a filha. Isto já devia ter sido feito quando ainda era pequena, logo que   começasse a tomar sentido pelas coisas. Agora, depois de esconder por vários anos, impossível!

       Tornou-se uma adolescente bonita, cabelos lisos, longos e negros, mas era cismada e no fundo, acreditava ser filha do pai, mas não da mãe. Algo estava sendo ocultado, o que não aceitava. Queria a verdade!

       Perguntou muitas vezes à mãe, sobre a maternidade onde nascera, dados da gravidez, do médico que fizera o parto. A mãe que já havia preparado tudo em sua cabeça respondia, mas com insegurança e medo, de ela um dia, quisesse apurar a verdade.

       Angélica, tinha certeza de que suas primas sabiam de alguma coisa, que não queriam contar a ela. Quando tomavam banho juntas, notava que em suas mamas, as aréolas e os mamilos eram muito escuros, diferentes das demais.

       Frequentemente, quando a família estava reunida, todos conversando, fingia que estava dormindo, para ouvir algum comentário a este respeito. Várias vezes foi pega escondida ou com os ouvidos na porta, com a mesma ideia. Muita dúvida naquela cabeça, sobre sua origem verdadeira.

       O fato é que os anos se passaram, ela se casou e teve três filhos homens. Seu pai, após uma cirurgia de aneurisma da aorta e sua mãe, anos após, com um câncer, faleceram.

       Os familiares comentavam entre si de que Maria Angélica era muito nervosa, preocupada, egoísta, desconfiada, neurótica e sempre querendo mostrar-se superior. Diziam:

       — Era assim, certamente para superar um complexo de inferioridade que tinha, consequência da dúvida que sempre guardara dentro de si, sobre sua verdadeira identidade. -Sua mãe devia ter contado tudo a ela, não deviam tê-la enganado.

       — Como poderia ela ter uma identidade própria, se duvidava?

       Mudaram-se para uma chácara, em progressista cidade no interior do estado, os filhos ainda pequenos e tudo sugeria que levavam uma boa vida, normal. O marido era um profissional   bem   sucedido e ela, embora formada, com curso superior, abriu uma loja, onde vendia produtos para animais de pequeno porte.

       O marido às vezes, se atrasava para chegar em casa. Ela, sempre muito desconfiada, passou a suspeitar de que outra mulher, poderia estar na jogada.

       O marido, quando questionado, negava sempre qualquer deslize de sua parte, mas o casal passou a ter desentendimentos frequentes e até brigas, quando longe da presença dos filhos.

       Uma tarde, Maria Angélica pegou seu carro, parou próximo ao escritório do marido, ficou aguardando sua saída e seguiu-o. Viu quando ele parou em frente a uma casa, tocou a campainha e foi recebido por uma moça que veio a seu encontro, apertaram-se, beijaram-se na boca e entraram. Para ela, foi o suficiente!
        Foi até sua loja, pegou um vidro contendo veneno de rato e foi para casa. Estava escurecendo. Pegou refrigerante, colocou o veneno, escreveu uma carta ao marido pedindo que cuidasse bem de seus três filhos. Deitou-se, após fechar as narinas e tomar todo o conteúdo do copo.  Foi trágico! Era dia de seu aniversário!

       Meditando: Esta moça, desde pequena, fora criada com falta de identidade, ocasionada pela fraqueza e omissão de sua mãe. Não aguentou mais uma tragédia, o sofrimento que iria enfrentar com o procedimento de seu par.

       Na opinião daqueles que entendem: Contar, repetidas vezes, às crianças adotivas sobre a real situação, até que elas que digam:

       — Já sei mamãe! Não sou sua filha natural, mas filha do coração!

       — Vocês, são meus pais verdadeiros, a quem amo muito!


        Ponto final!

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