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O DURO CAMINHO DE VOLTA - Oswaldo U.Lopes



O DURO CAMINHO DE VOLTA
Oswaldo U.Lopes

        Sergio fincou a pequena bandeira brasileira que levava na neve eterna do Aconcágua. Gostava daquela atividade de alpinista. Sempre se referia a ela como atividade e não como esporte. Para ele era até difícil explicar a diferença, mas era como um emprego, uma ocupação como outra qualquer. Conseguira transformá-la em ganha pão, trabalho honesto e ela lhe dava mais do que o necessário para sua vida do dia a dia.

        Começara pelos Alpes, achava que primeiro as coisas primeiras, se a palavra que definia sua atividade era derivada daquelas montanhas, era lá que ia se procurar, se entender como costumava dizer. Pronunciava nomes como Dufour, Jungfrau e Mont Blanc com assustadora intimidade. Andara pela Suíça, Itália, Áustria, França e Eslovênia até enjoar.

        Era brasileiro e causava estranheza essa sua mania de escalar montanhas. Bobagem, comentava, os ingleses conquistaram o Evereste e na Inglaterra não tem montanha que preste. Frisava bem Inglaterra e não Reino Unido, porque assim deixava de lado a Escócia que tinha não só montanhas como terríveis desafios alpinísticos. Ocultava marotamente que Sir Edmund Hillary da expedição inglesa era, na verdade, neozelandês e aí a história de inexperiente não se sustentava.

        Andara pelo Everest  e conhecia muito o “tio” Thomas Brandolin, pioneiro entre os brasileiros que frequentavam o pico mais famoso do mundo. Sergio não chegara ao alto do próprio, mas fora lá que se iniciara na novidade da escalação sem oxigênio, façanha que repetia agora nos quase 7.000 metros do Aconcágua na companhia do amigo Gastão e do quíchua André.

        Aceitar o Gastão e trazê-lo para os Andes, sem oxigênio, não fora uma boa ideia. A última subida fora mais lenta do que gostaria e a volta se complicara por uma pequena avalanche que obrigara a uma volta grande. André não olhava o seu Rolex de última geração, mas o sol, como o faziam seus milenares ancestrais, e seu olhar dizia o que Sergio não queria ouvir: se escurecer antes de chegarmos ao acampamento base, morremos todos.

        Fora tudo muito rápido, Gastão sentira tonturas, frio intenso e perdera a consciência, jazia agora a seus pés em coma profundo. Sergio conhecia bem a “lei da selva” aplicada aos Alpes. Não se carregava cadáver ou moribundo, nem se enterrava. Se alguém quisesse, no futuro, resgatar o corpo, estaria em excelentes condições de conservação. O frio intenso e o ar rarefeito constituíam um necrotério de primeiro mundo. Já assistira, horrorizado, no Evereste, equipes descendo e chutando, literalmente, um cadáver montanha abaixo. Carregar nas costas algo que pesasse 50 ou mais quilos, nas montanhas geladas, era impensável.

        Sob o olhar frio do quíchua, recostou o corpo de Gastão na encosta gelada e reiniciou o duro caminho de volta. O olhar de André era quase fatídico, se você quer chegar vivo é melhor se mexer rápido.

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