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A TRADUTORA - M.Luiza de C.Malina




A TRADUTORA
M.Luiza de C.Malina

Há muito que a campainha não tocava. Não tenho me ausentado devido ao estreito tempo que a editora ofereceu para o término de uma tradução.

Menos mal, concentro-me melhor no trabalho. Anoto no bloco amarelado e empilhado de itens necessários, que preciso chamar um técnico para verificá-la. Penso: mais um item que vai ficar para o depois.

Envolvida até a alma com o verdadeiro sentido das palavras, as páginas transportam-me para outro mundo.  Não percebi o tempo, lembrei-me de não ter feito uma pausa para o almoço, quando o som familiar da campainha interrompeu a concentração.

Ela funciona, pensei aliviada, riscando o item do bloco.

- Quem é? Perguntei, ao olhar pelo monitor. A campainha moderna, não deixa o visitante perceber a vigilância. Não o reconheço, lembra-me a um serviçal.
- Estou procurando pela senhora Alzira, ela está?

- Sim, sou eu mesma – apressada respondi.

- Sou da companhia de alarmes, tenho um chamado para verificar sua campainha.

- Um momento.

Com o visor aberto, eu o observava. Intrigada confundiu-me a cabeça. Olhei para o bloco de recados e...e... o gesto de rabiscar o item “campainha” ainda guardava o calor do lápis na mão. Não deve ser engano, pensei. Além do mais, ela está funcionando. O que será?

No instante em que ia abrir a boca para falar qualquer coisa, que agora se apagou da mente nem sei mais nada, percebo seu olhar nervoso de um lado para o outro da rua  que, no sol a pino nem passarinho voava – ele se prepara com uma arma na mão.

Acredito que quando eu disse “um momento” ele tenha imaginado que o atenderia pessoalmente. Balela! - teria pensado - esta está no papo.

Acionei a vizinha da frente. Neste instante a campainha toca novamente. Gelei. Digo outra vez, um momento? Ah! Meu Deus este cara me tirou do sério.  A vizinha atende surpresa, querendo conversar; áspera eu a interrompo:

- Dona Judith desculpe, é urgente, por favor, olhe pela sua janela. Há uma pessoa tocando a campainha e estou receosa em atender, ele sabe o meu nome, estou um pouco nervosa porque percebi algo na sua mão que aparenta uma arma. Por favor!

- Cla-Claro minha filha, vou averiguar - gagejou.

- Alô, alô! – insisti desesperada pelos instantes atordoantes em que ela se afastou do aparelho. É uma senhorinha idosa e não enxerga bem. Será que tropeçou e caiu! E se  morreu! Minha nossa a culpa será minha, é melhor desligar. Desliguei.

- Dindong!

A campainha, o que faço! Encolhida pensei em não atender e nem olhar quem é. O telefone toca. Que alívio é a senhorinha de voz arrouqueada.

- Minha filha, descu-culpe a demora. A ligação ca-caiu e fui procurar seu número. Não tem nenhum homem em frente a sua ca-casa. Vejo apenas uma ko-Kombi  co-colorida e umas pessoas da época-ca antiga.

Ela está delirando, o que é isto agora?  Acho que tem problema com a, letra “c”. Se levantar a persiana perceberão que estou em casa; faço silêncio dentro de mim; identifico a voz de minha irmã. Co-corro aliviada para abrir o portão e noto – estou gaguejando em pensamento. Isso pega!

“Parabéns prá você, nesta data querida”...

Uma surpresa! Havia me esquecido do aniversário!  Lá estava o marido dela disfarçado de qualquer coisa, rindo de qualquer coisa e segurando qualquer coisa na mão, que eu achei que pudesse ser uma arma.

O susto valeu pela tarde Seresteira !

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