O DESTINO DE FERNANDO
Conto coletivo em andamento.
PERSONAGENS:
Virgínia / Evandro / Jorge, pai
dela / Fernando, filho de Virgínia e Evandro.
DETETIVE: Lenita Fragoso
CENÁRIO INICIAL: Rio de Janeiro – Copacabana
CENÁRIO FIXO: Cidade de Lapinha em Minas Gerais
O DESTINO DE
FERNANDO
Trechos elaborados por:
Ledice Pereira, Yara Mourão, Silvia
Villac e Suzana da Cunha Lima
A
VIAGEM INESQUECÍVEL
CAPÍTULO I
Estava amanhecendo quando o ônibus
chegava ao Rio de Janeiro vindo de Lapinha, Minas Gerais. Uma tênue nuvem de
ocre transparente cortava na horizontal o céu, criando uma silhueta mágica no
perfil da cidade.
Virgínia esfregava os olhos, já se
maravilhando com a impressão fantástica que tudo lhe causava. Sempre imaginara
estar numa grande cidade, de arranha-céus, avenidas movimentadas, com muitas
pessoas caminhando apressadas, agasalhadas num frio estrangeiro.
Sua imaginação era, e sempre fora,
muito maior que a realidade.
Naquela manhã de dezembro, entretanto,
o Rio fervia num calor quase insuportável, que há dias pairava no ar. Mas tudo
ali estava posto para grandes acontecimentos, grandes encontros.
Como que para fazer jus à fama da “Cidade
Maravilhosa”, tudo se deu muito rápido para Virgínia.
Ela mal podia acreditar que estava ali,
naquele momento mágico com que sempre sonhara. Ela que vinha de cidade inexpressiva,
de onde nunca saíra. A vida na fazenda lhe proporcionava fartura. Mas almejava
mais, queria viajar conhecendo outros lugares. Receoso, Jorge, seu pai,
concordou em satisfazer a vontade da única filha, permitindo que ela passasse
aquele réveillon de sonhos em Copacabana, Rio de Janeiro.
Foi ali, naquele cenário encantador,
embalada pelos fogos que coloriam o céu de Copacabana que ela conheceu Evandro,
um belo rapaz que a cativou instantaneamente pela simpatia, gentileza,
cavalheirismo e charme.
A “arte do encontro”, como dizia o
poeta, consolidou momentos felizes, com brinde de champagne e votos de um feliz
ano novo.
Sob o efeito da bebida, brindaram e
pularam as sete ondas e quantas mais vieram. O breu da noite era quebrado
apenas pelo luar esplendoroso que fazia companhia para o casal. Quase não
conversavam mais, havia urgências dentro deles. Embalados pelo momento, ali
ficaram até adormecerem profundamente. Ela acordou com o sol nos olhos, estava
feliz, não queria se preocupar em entender que havia passado a noite ali com um
homem encantador.
Ele dormia ainda, sua exaustão o
deixava ainda mais atraente. Ela se ergueu lentamente, sua roupa estava encharcada
de água e areia, decidiu ir embora, precisava de um banho, não queria que ele a
visse assim. Saiu devagar arriscando pequenas olhadelas para trás. Mais tarde,
percebeu que não mencionou onde estava hospedada, nem anotou o telefone dele.
Voltou lá outras vezes, mas não o
encontrou. Virgínia saboreou esse réveillon por dias! Parecia até um sonho! Os
dias se passaram, ela estava intrigada com o acontecido naquele primeiro de
janeiro, guardando para si a imagem do rapaz que ficou registrada nas selfies
tiradas antes daquela meia noite.
Mas, essas nuances foram se dissipando
à medida que o tempo passava, até quando ela se viu voltando, meio realizada,
meio frustrada, para sua cidadezinha mineira, banhada por um belo rio, rodeada
de montanhas, alheia a ventos futuros.
Virgínia voltou para casa, mas não
voltou sozinha. Trazia, junto com muitas lembranças de Evandro, um filho em seu
ventre que logo ela tomaria conhecimento.
Apesar da surpresa e certa indignação,
o velho Jorge a apoiou como sempre o fazia desde a morte da mulher. Ele sabia
da importância do avô na vida da criança, procuraria substituir a figura
paterna que, certamente, não conheceria.
E assim nasceu Fernando, longe de um
pai que nem o sabia, mas que estava em algum lugar, aguardando o destino.
A
proximidade com a terra, com o gado, com a vida rural, levou Fernando para a área
de Veterinária, e seguiu cursando a Universidade Federal de Minas Gerais.
Entretanto,
a ideia de conhecer o pai, cujas fotos a mãe lhe mostrara, era uma constante na
vida do rapaz que só aguardava o momento certo para isso.
EM
BUSCA DO PASSADO
CAPÍTULO II
Quando cursava o último ano da Faculdade, vô
Jorge o presenteou com uma viagem para o Rio de Janeiro, para que conhecesse as
maravilhas da cidade litorânea, e também pudesse investigar o paradeiro de seu pai.
Sobre ele, Fernando sabia o que sua mãe lhe dissera: que chamava Evandro, que era empresário e que
deveria ter por volta de quarenta e cinco anos. Para isso adiantou-lhe uma boa
quantia, a fim de que pudesse contratar um detetive particular, já que não
conhecia a cidade e nem saberia por onde começar a busca.
Era como
procurar uma agulha no palheiro. Mas, o jovem, entretanto, era obstinado e
resolveu entrar de cabeça em busca do antigo sonho.
O primo de
segundo grau, Ary, advogado experiente, indicou uma detetive muito conceituada
no Rio, oferecendo-se para ajudar no que fosse necessário.
Foi assim
que Fernando conheceu Lenita Fragoso a quem relatou sua história. Na verdade, a
história de sua mãe, mostrando-lhe as fotos no celular, selfies tiradas por Virginia
naquele réveillon. A profissional o escutou atentamente enquanto fazia
anotações num caderninho preto.
O rapaz
sentiu-se esperançoso. A detetive tinha lhe passado uma ótima impressão - comentou
com o primo.
Baseada em
suas anotações, Lenita logo colocou a mão na massa, passando a investigar todos
os empresários de nome Evandro que atuassem no Rio e em São Paulo.
Surpreendeu-se com o grande número de indivíduos com esse perfil. Tinhosa que
era, tratou de pesquisar traços da vida de cada um, colocando Fernando a par do
curso das investigações.
Porém, o
tempo passou muito depressa. As férias do jovem estavam terminando e ele teria
que retornar, mas deixava em boas mãos a elucidação de algo que, para ele, era
primordial.
UM
VETERINÁRIO BEM SUCEDIDO
CAPÍTULO III
Tão logo se
formou, Fernando conseguiu arrumar um emprego em um haras localizado em
Vassouras, cidade a pouco mais de 100km do Rio de Janeiro. Sendo ele um
veterinário de animais de grande porte, os cavalos sempre foram sua maior
paixão.
Fernando estava orgulhoso de ter arranjado esse emprego - tudo havia sido acertado
on-line, curriculum, entrevistas com o administrador, salário e horário de
trabalho.
Finalmente
o dia de sair de casa chegou e, com um misto de alegria e incertezas, ele
partiu para Vassouras, onde o destino lhe “pregaria uma peça” e tanto!
E logo estava sentado no
ônibus que o levaria à cidade chamada Princesinha do Café, e aquele frio na
barriga foi substituído por um vendaval de emoções. Embora tivesse pesquisado
um pouco sobre ela, sempre o desconhecido o afetava assim.
Como o povo do local o
receberia? Como seria a cidade, quanto à diversão, restaurantes e
garotas! Sim, Garotas! era um rapaz fogoso, em plena juventude e
queria se divertir como qualquer rapaz de sua idade.
Sabia do charme da cidade, de
suas históricas fazendas de café e a possibilidade de tédio naquele lugar era
quase inexistente.
À medida que chegava, mal
conseguiu observar direito a paisagem por onde estava passando. Cada vez mais
excitado, finalmente o ônibus parou na rodoviária local e o motorista
gritou: Vassouras!
Bom, agora é pra valer mesmo – pensou – Vamos lá, Vassouras! Me mostre o
que tem de bom!
Saltou do ônibus, pegou sua mala e olhou a paisagem em frente, encantado
mas um pouco receoso. Mal sabia que tinha muita razão para isso...
Fazia muito calor apesar de o relógio
da igrejinha mostrar 18 horas. O ar denso parecia estar nas costas de Fernando.
Ele estava cansado, ansioso para saber onde seria seu pouso naquela noite. Ouviu o lamento do sino anunciando a Ave-Maria. Lembrou do avô tão religioso, tão positivo.
Com os pensamentos e as
lembranças se misturando na memória, Fernando decidiu abraçar a própria
história naquele momento. Começou a alinhavar todas as emoções, as esquecidas
alegrias, e construiu no espaço de uma manhã, a sua fortaleza.
Com a determinação de lutar
batalhas e vencer as guerras, traçou os rumos que queria seguir: a primeira
coisa seria se instalar. Não hesitou em se estabelecer na pousada mais próxima
do haras. Não era exatamente o que havia imaginado, mas isso já não importava.
Precisava estar próximo daquele local para tentar conseguir regularizar sua
situação no trabalho.
Na manhã seguinte apresentou-se
ao haras e soube que, dentro de uma semana, um evento bem interessante
ocorreria ali: seria o dia dedicado ao Bem Estar Animal, quando todos os
cavalos seriam devidamente examinados, vacinados, banhados e preparados para
uma competição.
Esta lhe pareceu uma ocasião bem
propícia para se mostrar sua capacidade de atendimento de qualidade, no posto
de veterinário visitante que o haras estava oferecendo.
Ele se inscreveu de imediato,
confiante de conseguir um lugar.
Realmente, teve uma aceitação
unânime.
Assim foi que na manhã de seu
primeiro dia o nascer do sol o encontrou já de pé na varanda da pousada. Estava
seguro de ter feito a coisa certa. Mas algo o estava deixando tenso: recebera
na véspera uma carta de Lenita Fragoso.
Ela falava de suas pesquisas, as
buscas que fizera; comentava as possibilidades, as coincidências e os enganos
que encontrara. Gentil, ela se despedia com um abraço. Mas havia um P.S. que
assinalava uma informação intrigante: “dentre os Evandros pesquisados,
encontrei um que ama cavalos de raça e possui um garanhão que costuma
participar de competições e ganhar prêmios.”
OS TRECHOS ABAIXO - AINDA MUITO CEDO PARA INSERIR NA HISTÓRIA - FICAM COMO DIRETRIZ PARA UM FUTURO PRÓXIMO DE VIRGINIA:
O NOVO MUNDO DE VIRGÍNIA
Capítulo IV
A
vida de Virgínia, após o nascimento de Fernando, resumiu-se em cuidar dele e
ajudar o pai na fazenda. Os afazeres tomavam quase todo seu dia, fazendo com
que ela não tivesse tempo de ver a vida passar.
Acordou
quando Fernando foi para Vassouras. Sentiu um imenso vazio. Mesmo quando ele
cursava a Universidade, ela podia estar com ele em alguns finais de semana ou
ao menos uma vez por mês. Mas agora, a distância era maior.
Aos
quarenta e poucos anos, desejou mais. Conhecer pessoas, viver a sua própria
vida. Havia parado os estudos quando de sua gravidez e nunca mais voltara para
a Universidade, à época, trancada, embora o pai a tivesse estimulado a voltar.
Conversou
com Jorge. Demonstrou sua vontade de retornar aos estudos. Ele, mais uma vez, a
apoiou.
Passou
a estudar assiduamente, com o intuito de prestar vestibular na metade do ano.
Gostava mais da área de humanas. Nesses anos todos, havia devorado uma
quantidade de livros. Ler era sua paixão e única diversão. Empenhou-se com ideia fixa.
Quando
Fernando recebeu mensagem da mãe, contando a novidade, deu-lhe o maior apoio.
Havia momentos em que ela se questionava.
Pensativa, sentada na varanda da casa, se pôs a fazer uma retrospectiva
de sua vida ao longo desse espaço de tempo.
A sensação que tinha é que o tempo havia sido congelado e que nada de
muito proveitoso havia feito. Desde que seu filho nascera, vivera
exclusivamente em função dele e, quando o menino cresceu, sua vida virou-se em
direção do pai que, já mais velhinho e com limitações, precisava de uma maior
atenção.
“O que eu fiz com minha vida?” perguntou-se ela. Tenho a sensação de ter
me anulado, talvez como uma punição por ter sido mãe “solo”. Sempre cuidando de
outros e sem prestar atenção à minha pessoa!
Então lembrou-se do trabalho voluntário na Associação de Combate ao
Câncer. Duas vezes por semana ia para a cidade para fazer o trabalho
burocrático, de secretária, administradora e levantadora de fundos, promovendo
bingos, bazares, sorteios e tudo o mais que pudesse gerar alguma verba para
ajudar no pagamento de remédios não custeados pelo SUS e na distribuição de
cestas básicas para as famílias menos favorecidas, além de promover festas em
datas festivas, como páscoa, natal e dia das crianças.
Não, sua vida ao longo desse tempo não tinha sido em vão. Os fazendeiros
da região que o digam, já que sem qualquer pudor, pedia um SOS a eles para
poder ser mais proativa – sem a verba obtida através deles, teria sido
impossível alcançar seus objetivos.
Com a Associação mudando sua sede física para Vassouras, uma cidade maior, ela
decidiu que também era hora de uma nova mudança em sua vida.
Mudou-se para lá onde também estaria perto de Fernando. Cortou os cabelos, emagreceu 7 quilos e
matriculou-se em um cursinho pré vestibular. Seria Assistente Social e, quem
sabe, se tornaria a presidente de sua querida Associação...