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NOVAS IDEIAS, VELHOS PECADOS - Suzana da Cunha Lima

 



NOVAS IDEIAS, VELHOS PECADOS

Suzana da Cunha Lima

 

O Colégio NOVAS IDEIAS estava situado numa construção antiga, muito bem preservada e graças a uma estação de metrô ali perto, tinha se valorizado muito. Mas era considerado meio antiquado e muito rigoroso.

Porém, a onda da modernidade, surfando na era digital, e a competição acirrada entre os colégios que preparavam os jovens para o vestibular, acordaram sua diretoria para os novos tempos.  Primeiro transformaram um colégio estritamente masculino em colégio misto e, a novidade maior, introduziram o Ensino Médio, com foco na Faculdade.

Não economizaram na construção de laboratórios moderníssimos, ampliaram a área esportiva e contrataram os mais conceituados professores, mais habituados a esta faixa etária e ao preparo para o vestibular.

Foi uma experiência inédita para os professores do Ensino Fundamental. Na verdade, tiveram que se habituar àquelas mocinhas em suas minissaias ou shortinhos, os longos cabelos continuamente balançados, sempre rindo ou cochichando, correndo pelas escadas, falando alto e inventando novos jogos de sedução para os mestres mais velhos.

 E os rapazes, ainda tímidos diante de tanta fartura, só se realizavam mesmo nas áreas esportivas, campeonatos e disputas internas. O Colégio adquiriu uma nova vida com esta turma de adolescentes que estava chegando.

E para comemorar tantas mudanças e modernismos, foi pensada uma nova revista, para ser criada e conduzida pelos jovens que se interessassem, sob a supervisão de um professor expert em comunicação.

Era mensal e foi um sucesso desde o início, por conta de uma nova seção da qual não se sabia a redatora. Era um segredo guardado a Sete Chaves.

- Já chegou a revista nova? Perguntou Regina à sua colega de classe que acabava de chegar.

- Aqui na mão. – Carolina balançou a revista bem na frente dela e houve até um simulacro de luta entre as duas. Riram muito e Carolina propôs.

— Vamos ler juntas, então. – Sentou-se perto da amiga e folhearam as páginas até à secção de FATOS E BOATOS, assinada por Poliana, que ninguém sabia quem era.

— Nossa, olha essa, Regina, quem diria, hein?  Olha quem está de olho no Prof. Bento. A Juliana, aquela ameba, completamente sem graça. A Poliana agora errou feio a mão.

Carolina olhou para Regina, meio divertida. - Todo mundo sabe que ele tem uma quedinha por você.

Regina fingiu surpresa, meio displicente e esticou o olhar para o texto que a colega mostrava.

— Meu admirador? Eu só disse que achava ele bem bonitão, já grisalhando e que era muito atencioso, um sorriso lindo... Não está vendo que é pura fofoca? Mas, como é que essa tal Poliana sabe destas coisas?  Alguém anda soprando besteiras nos ouvidos dela, isso sim.

— Como fazer, Regina? Ninguém nem sabe quem ela é. Você quem podia saber, é quem vive enfiada na biblioteca, na sala de professores, nos campeonatos, nos laboratórios... em todo lugar onde o prof. Bento pode aparecer.

— Ele faz revisão nos meus textos, só isso. E faz de quem pedir, não é privilégio meu.

— Bom, já você vai ser chamada para a sala de professores. Ele já passou por aqui duas vezes, de olho comprido para você - alertou Carolina à amiga.

— É que dei um texto novo para ele corrigir e pedi pressa.

 Regina se levantou logo, deu um adeusinho rápido à amiga e correu para a sala dos professores. Viu a moça do café passar para a copa, enquanto o professor saboreava seu café como se não tivesse nada para fazer, esperando a moça ir embora com sua bandeja. Mal ela saiu, ele fechou a porta e cochichou para Regina, fazendo- a se sentar na cadeira.

— Acho que isso não vai dar certo não, Regina.  Essa sua invenção da Juliana comigo caiu mal. Uma aluna paquerando professor... E meu nome rolando nas entrelinhas... Todo mundo vai pensar que dei bandeira, e eu nem vejo muito a Juliana...

— Não precisam acreditar em nada, é só para levantar suspeitas, o começo de uma boa fofoca. - Está com medo de quê?

— Minha reputação, ora. O que mais? Estou lecionando aqui porque fiz concurso, não quero perder meu emprego. Não posso me meter com aluna nenhuma, você sabe disso muito bem, porque veio do Colégio Santana, que é muito rigoroso.

— Rigoroso demais; por isso, está às moscas - Regina fez um muxoxo que a deixava muito sedutora. - Nunca vi ninguém perder emprego por conta de fofoca. Devia ficar feliz porque lembram de seu nome e te acham bonitão. Sabe disso, não é? Não se faça de bobo.

Ele emudeceu, preocupadíssimo.  Combinara corrigir os textos dela para a revista, mas não sabia, então, em que estava se metendo. E quão falsa Carolina podia ser! Um choque e tanto! Tinha enrolado ele direitinho.  Ela tinha boas ideias, algumas avançadas demais, mas um péssimo português, todo mundo ia descobrir quem corrigira aqueles textos. Lógico, o Prof.de Literatura!

Foi quando o Prof. De Comunicação abriu a porta e viu aquele clima formado.

— Ora, ora, o que temos aqui, Prof. Bento? Discussão com minha melhor aluna?

Bento levantou-se rápido:

— Boa tarde, Prof. Rogério.  Estou deixando sua melhor aluna em suas mãos.  Este assunto de textos, editoras, etc. é mais de sua área, mesmo. OK? Ele vai ser muito mais útil que eu, acredite, Carolina.

E tratou de sair rápido dali, mas sem entregar a ela o último texto, picante demais para um colégio tradicional como aquele.

E lá ficou o prof. Rogério, um homem simpático e meio ingênuo, querendo agradar à turma nova.  Quando leu os textos, sabendo do que se tratava, quis cair fora também, mas já era tarde. Carolina o envolvera com seu belo sorriso e lhe afirmava que ninguém sabia quem fazia as correções, a graça daquela seção era o anonimato e podia-se falar de quem fosse, a não ser injúria moral, claro.

A expectativa agora, de todo mundo, seria a reação da turma àquela nova edição de uma seção que nascera com ótimas intenções, em tom de brincadeira, mas tinha tudo para acender fogueiras de incompreensões e intolerâncias.

E essas fogueiras eram bem difíceis de apagar.

 

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