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Viver, um eterno aprendizado! - Ledice Pereira

 


Viver, um eterno aprendizado!

Ledice Pereira

 

Virgínia adorava o Campus Universitário que vinha frequentando há três anos. Era tudo que almejara desde jovenzinha. Sempre fora das letras. Escrever era para ela o combustível que a movia. Entrar na Faculdade de Letras representava a realização de um sonho.

Não era de fácil relacionamento. A timidez fazia com que ela preferisse ficar só, sempre acompanhada de um bom livro que devorava com rapidez. A biblioteca era seu recanto predileto. Ali, deixava a imaginação levá-la a escrever crônicas, baseadas nas observações que costumava fazer durante o longo caminho para a Universidade.

Convidada a escrever, esporadicamente, crônicas para uma revista semanal do Campus, de bastante tiragem, aceitou, a princípio, pensando que os trocados que recebesse lá, a ajudariam a comprar mais livros. Como as crônicas alavancaram o interesse pela revista, pediram-lhe que passasse a escrever semanalmente.

Resolveu topar o desafio, adotando o pseudônimo de Margareth Smith. Achou que um nome internacional atrairia ainda mais os leitores. Foi o que aconteceu. Todos ali passaram a ler as crônicas da tal Margareth.

Virgínia achou necessário contar com um revisor. Para isso, optou por pedir apoio ao seu professor de Literatura, o Professor Figueiredo, a quem pediu sigilo e por quem nutria um sentimento que tentava esconder dele e de todos.

Figueiredo era querido pelos alunos. Procurava interagir com eles de um modo amigável sem se colocar no pedestal. Isso o aproximava de todas as classes, embora houvesse uma dúvida no ar. Por que o homem, que usava uma aliança na mão esquerda, nunca falava da mulher, de filhos, de sua vida pessoal?  Isso gerava curiosidade geral.

Roberta, ao contrário de Virgínia, procurava cativar os colegas e professores com seu jeito charmoso, sempre sorridente. Não era tão boa aluna. Tinha dificuldades, mas sempre conseguia a ajuda de um ou de outro, dando um jeito de fazer parte dos grupos de trabalho dos melhores alunos. Assim conseguia manter-se na média da classe.

Durante as reuniões de grupo, lançava sempre um comentário maldoso a respeito deste ou daquele ausente, deixando uma pulguinha atrás da orelha dos colegas.

Por três vezes, Roberta viu Virgínia, mostrando o que ela imaginou ser lição ou trabalho de literatura, ao Professor Figueiredo, o que a fez deduzir que a jovem estava tendo um tratamento diferenciado e talvez, por isso, obtivesse sempre boas notas.

Aquilo renderia uma boa fofoca, pensou, passando a controlar os passos da colega, por quem, aliás, ela passou a sentir inveja cada vez mais intensa e descontrolada.

Ela detestava ler. Nem as tão faladas crônicas, que eram assunto dos jovens toda semana, a atraíam. Procurava ouvir o que falavam para dar uns pitacos nos grupos, mas jamais parava para ler o que quer que seja.

Muitas vezes, faltava à aula para evitar ser chamada e passar vergonha. Isso acabava lhe custando pontos a menos na nota mensal, o que a deixava com muita raiva do professor.

Virgínia, no entanto, saía-se bem nos trabalhos e nas provas, redações, leituras.

Isso fez com que Figueiredo a convidasse para monitorar a cadeira de Literatura o que lhe renderia um pequeno salário. Com o tempo, Virgínia percebeu que o que nutria por ele não passava de uma grande amizade.

Não é preciso dizer que isso deixou Roberta com mais raiva dos dois. Deu asas à imaginação para construir uma história entre Virgínia e Figueiredo, o que acabaria com a reputação do Professor. A Universidade combatia qualquer envolvimento de professor/a e aluno/a.

No grupo de trabalho, lançou a semente da dúvida. Alguns não estavam interessados, pois admiravam Virgínia e respeitavam o professor, mas uns poucos, descontentes com as notas recebidas, resolveram comprar a história plantada por Roberta.

Instigados pela mau-caráter, resolveram seguir o mestre e descobrir onde ele morava. Pretendiam desmascará-lo frente à suposta esposa, contando-lhe maldosamente sobre o caso que teria com a aluna.

 Viram, curiosos, quando ele estacionou em frente a um pequeno prédio de apartamentos e desceu, sorrindo, conduzindo um pequeno buquê de flores-do-campo.

Viram, surpresos, quando um jovem abriu a porta todo sorridente e, com um abraço apertado, agradeceu o lindo buquê.

Viram, pasmos, quando os dois trocaram um demorado beijo na boca.

Pegos de surpresa, e, tendo em vista que a classe toda apoiava o movimento antirracistas e o LGBTQIA+, retornaram à Universidade, com o rabinho entre as pernas, percebendo quão ridículos haviam sido, ao dar ouvidos àquela fofoqueira da Roberta.  Esta, por sua vez, passou a ser repelida pela turma que percebeu sua verdadeira índole, tendo que se esforçar muito para ser novamente aceita nos grupos de trabalho, que já não caíam mais na sua armadilha e passaram a exigir dela maior empenho e colaboração.

A jovem percebeu que, se queria ser vitoriosa, precisava mudar radicalmente de atitude, precisava amadurecer, cuidar da própria vida, dedicar-se ao curso que escolhera, ser leal aos companheiros, respeitar colegas e professores.

Virgínia, cada vez mais enturmada, aos poucos, conseguiu vencer a timidez, até que, ao receber por suas crônicas, o prêmio que a revista universitária costumava conceder anualmente aos seus escritores mais lidos, foi obrigada a revelar sua verdadeira identidade. A admiração que tinham por Margareth Smith migrou instantaneamente para a verdadeira autora, que teve que aprender a lidar com o sucesso, com as entrevistas, com os autógrafos, já delineando uma promissora carreira.  

 

 

 

 

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