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Um Sansei visitando o Japão - Ises de Almeida Abrahamsohn

 


Um Sansei visitando o Japão
Ises de Almeida Abrahamsohn

 

Hideo Jorge chegou ao aeroporto de Narita, em Tokyo, atordoado pela longa viagem. Na fila da imigração, ainda sonolento, o rapaz de 19 anos, brasileiro, bisneto de imigrantes japoneses do pós-guerra, arrastava os pés. Sabia apenas poucas palavras em japonês. Obrigado e até logo, Arigatô e Sayonara. Sua avó materna, bachan, tinha tentado ensinar a língua, mas ele nunca se interessara. Seus pais também não falavam entre si, o pai não entendia nada, mas sua mãe até falava bem, embora só soubesse escrever a escrita mais simples. Hideo se considerava mais Jorge do que Hideo, era brasileiríssimo com fenótipo de oriental. Em São Paulo, ninguém se dirigiria a ele em japonês pelo fato dele ter cara de japonês. Porém, no Japão, ele logo, logo, iria perceber que a situação seria diferente.

Era a sua vez na janelinha da imigração. O funcionário carrancudo olhou o passaporte, encarou Hideo Jorge e despejou a primeira pergunta. Naturalmente, em japonês! O rapaz catou, do fundo da memória, um murmurado “desculpa” - Sumimasen, e em inglês informou que não falava a língua.

O funcionário não gostou nada. Seguiu-se um interrogatório. O que fazia, por que vinha, quanto dinheiro trazia para se sustentar? Ia trabalhar? E, quando soube que ficaria na casa da tia, o zeloso senhor japonês logo pensou que o rapaz estava vindo para trabalhar clandestino.

Meia hora depois, pela quinta vez, foi perguntado o que vinha fazer no Japão.  Hideo Jorge, fora de si, empurrou os dólares que sua mãe havia dado pela janela da cabine de vidro. Foram acompanhados de dois palavrões meio cabeludos em inglês, antes de repetir que ia ficar apenas dois meses na casa da tia fazendo um trabalho da faculdade de jornalismo. Para azar do rapaz, o funcionário havia entendido os palavrões e avisou que ia chamar a polícia de imigração para prendê-lo por desacato. Hideo queria morder a língua e repetiu várias vezes as desculpas, Sumimasen, Sumimasen... abaixando a cabeça...

Estava a ponto de chorar quando pediu ainda uma vez:

Eu preciso de dois meses, senhor!

Preciso fazer a reportagem sobre o Senna no Japão. O senhor sabe, ele foi um grande corredor de automóveis, muito admirado no Japão e o meu trabalho é fazer uma reportagem com o pessoal daqui!

O rosto do funcionário se iluminou! Por que não explicou logo, meu rapaz? Não vai ter mais problema... Nós gostamos muito do “Ailton” Senna! Eu, quando era criança, colecionava tudo sobre ele. Recortes de jornais, fotos e tinha um boneco com o rosto dele. Todas as crianças adoravam e a gente tinha os Mangás com as histórias dele. Foi no grande prêmio em Suzuka em 1988, eu tinha oito anos. Senna Samurai and Supersonic Prince.

O Sr. Terumo só faltou se desculpar. Carimbou logo o passaporte de Hideo e lhe deu os dois meses de permanência de que o rapaz precisava. Hideo Jorge agradeceu efusivamente com alguns Arigatôs e Sayonaras e saiu correndo procurar sua mala na área de bagagem.  

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