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O PARTO PREMATURO Antonia Marchesin Gonçalves

 

 


O PARTO PREMATURO

Antonia Marchesin Gonçalves

 

                Enquanto estamos vivenciando os sabores de viver, tanto as alegrias, como as realizações profissionais e pessoais, temos que tirar lições das tristezas e desilusões, em forma de aprendizado para amadurecer com erros ou acertos e sentir na memória a importância de não passarmos em branco ou em vão o nosso tempo na terra.

Falando em memórias, lembro como se fosse hoje, de tão marcante que foi, a minha terceira gravidez.

                Já tinha um casal de filhos, um de quatro e uma menina de dois anos, ambos nascidos de parto normal. Lembro bem que foi um período que fiquei muito sozinha, numa casa grande que não era nossa. Meu marido trabalhava muito na construção da fábrica, chegava tarde e tinha praticamente só os domingos para a família, sendo que eram divididos entre a minha família e a dele. Já com quatro meses de gravidez, durante o jantar, senti o líquido quente escorrer pelas pernas. Naquele instante tive a certeza de que algo errado estava acontecendo.

                A experiência me alertou de algo problemático, no dia seguinte continuei a perder líquido. O médico, após exames, constatou uma fissura na placenta e orientou que eu permanecesse em repouso absoluto, na esperança de que meu organismo pudesse corrigir a tal fissura. As exigências eram rigorosas: ir ao banheiro, só quando for estritamente necessário e banho rápido. Tudo para conter um arriscado parto prematuro com pouca chance de sobrevivência do bebê. A recomendação era tentar segurar ao máximo a gravidez, pelo menos até os sete meses, quando a criança teria mais chance de sobrevivência.

                Sendo eu uma mulher saudável com dois filhos pequenos foi muito difícil respeitar tais exigências, mas ao mesmo tempo o a missão materna tinha muito poder, eu tinha que salvar meu filho. No entanto, me via angustiada e dividida e sozinha. E dependia de mim a decisão traumática. Mesmo tendo empregada que dormia em casa, minha mãe e papai se instalaram em casa para me ajudar a cuidar dos netos e administrar nossa vida doméstica. Na realidade minha mãe, mais que meu pai, pois ele ainda trabalhava todos os dias. Imagine minha impotência e medo de perder o bebê, minha irmã, no fim de semana, também vinha para lavar minha cabeça. O método era no mínimo estranho, mas necessário. Com bacia no chão, eu deitada na cama com a cabeça para fora, para não ficar em pé muito tempo no chuveiro, ela dava conta do recado.

                Mesmo assim, a cada dia e meio eu perdia líquido, encharcando lençóis. Providências precisaram ser tomadas a cada dia. Um lençol de plástico envolvendo o meu lado do colchão servia para evitar estragos muito grandes. As refeições eram feitas na cama.  Todo o domingo meus sogros vinham nos visitar e subindo as escadas, ela dizia: Cadê a doente?  E ia repetindo essa pergunta até chegar ao meu quarto. Aquilo era a faca entrando na carne. Era como se eu estivesse me aproveitando da situação para ficar na cama sem necessidade. Foram dois meses muito difíceis! Até que junto com o líquido passei a liberar sangramento, aí fui internada. Já sentia o feto se mexer, quanto mais perdia líquido, mais ele se movia dentro de mim.

                Rezava e falava com ele o tempo todo. Depois fiquei sabendo pela enfermeira que ajudou o meu médico, que era uma menina. Mas, eu escutei ele dizer para ela que nada dissesse. Ela nasceu de parto normal com peridural, eu permaneci acordada o tempo todo. Nem vi o bebê. Meu coração dolorido me fez mais fraca do que nunca. O bebê não sobreviveu. Foi desesperador. Como pode isso! Entrei grávida como outras vezes, mas saí do hospital de mãos vazias. O que é isso, Meu Deus? Eu chorava muito inconformada e dizia e repetia para o meu marido que não queria mais engravidar.

                Ai que dor no peito de perda tão grande, tendo feito tudo para salvá-la! Se fosse hoje, a chance de sobrevivência dela seria bem maior, mas eram outros tempos.

Engraçado como a gente esquece as dores e dois anos depois nasceu a minha filha caçula, com toda a precaução para incorrer no mesmo problema, fiquei de repouso relativo, parando todas as atividades, só saindo para ir ao médico. Dessa maneira, pude levar adiante a gravidez, agora com dois netos filhos dela, vejo que valeu a pena o sacrifício e tenho a felicidade de ter mais três netos homens, quem sabe terei futuramente uma bisneta.

               

               

               

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