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O Bom Pároco - Sergio Dalla Vecchia

 


O Bom Pároco.

Sergio Dalla Vecchia

 

 

O corpo inerte do pároco da pequena igreja interiorana, jazia no piso frio da sacristia. Olhos esbugalhados, rosto arroxeado sugeriam morte por estrangulamento, possivelmente com o golpe da MMA, denominado mata-leão.

Polícia, curiosos e o sempre presente nesses momentos, o investigador, acercaram-se aos poucos.

Assim terminou tragicamente a carreira do padre. Homem convicto com métodos próprios, nada dos triviais adotados pela Igreja. Mesmo assim era querido por todos. Parecia controlar maridos, esposas, prefeito, vereadores, comerciantes, fazendeiros e outros tantos com conversas ao pé do ouvido, sermões em alguns, até na praça da Igreja. O fato mais inusitado do método era obrigar os fiéis a se confessarem todas as quartas-feiras. Quem não comparecesse era ameaçado até de excomunhão.

Assim transcorria o enterro com muita comoção, lamentos, agradecimentos e orações eram que se ouvia ali.

Próximo a uma árvore o alfaiate, homem de elegância e educação impecáveis, encontrava-se um pouco isolado da multidão. Mostrava uma expressão não compatível com o momento, e vez em quando esboçava um sorriso discreto pelo canto da boca. Sinais logo captados pelo atento investigador, camuflado entre as pessoas.

Após o término do funeral, a cidade se recolheu em luto oficial de três dias, decretado em discurso emocionado pelo Prefeito.

Brito era excelente detetive, obstinado em resolver casos, ia a fundo até chegar ao culpado. Temperamental, sofreu punições por abuso de poder e tentativa de extorsão. Era assim mesmo, mas eficiente.

No dia seguinte, logo pela manhã adentrou sorrateiramente na oficina do alfaiate. Brito disse que reparou na expressão do dele durante o enterro e gostaria de saber sobre o padre e o porquê dos sorrisos discretos, aparentando satisfação pelo ocorrido.

Silas, o alfaiate, com a mesma fisionomia apática logo disse;

- Sou assim mesmo, não se impressione com minha maneira espontânea. Conheci pouco o padre, mas o suficiente para no início admirá-lo, pelos eloquentes sermões e persuasão das pessoas a frequentarem a igreja. Entretanto, quando ele começou a obrigar os fiéis a se confessarem as quartas feiras, não gostei mesmo e dei um jeito de me afastar discretamente, alegando viagens para cidades vizinhas, pois sou o único alfaiate da região. O tempo foi passando e numa cidade distante, quando tirava medidas de um fazendeiro para o terno para o casamento da filha, escutei a conversas de duas arrumadeiras que comentavam sobre mim. “Esse alfaiate vem da cidade daquele padre esquisito”. ”Cruz credo, ouvi dizer que é um falso padre”. Foi o bastante para aguçar minhas desconfianças.

De volta à cidade, iniciei uma investigação e captei em várias regiões casos de conduta anormal. Entretanto não tenho provas, mas posso com prazer relatar. Portanto, disse Silas para Brito que estava satisfeito com o desfecho, pelo que ouviu dele, mas não pela morte violenta. Se fosse realmente culpado deveria ser preso, agora assassinado, procure outro suspeito, não fui eu, não mato nem mosca.

Procure um homem de braço forte, como o jardineiro da igreja ou outro qualquer.

Brito assimilou o recado e deixou a alfaiataria com meia missão cumprida. Tinha o motivo.

Faltava a pessoa mais prejudicada pelo Padre, com pretextos suficientes para cometer o crime.

Imaginou um punhado de razões, principalmente aproveitando o sigilo do confessionário para chantagear, achacar, aproveitar de mulheres sob ameaça de difamação e tantos outros males de um mau caráter.

Passou a noite selecionando os mais elegíveis. A roda da sorte parou no nome da esposa do prefeito, Íris.

No dia seguinte foi bater à sua porta. Polidamente conseguiu que a primeira-dama o recebesse.

Íris apresentou-se altiva, bonita, discreta e um olhar penetrante.

— Perdoe-me Madame pelo atrevimento, mas por força do meu trabalho, necessito que a senhora responda algumas perguntas.

— Seja breve por favor, tenho compromissos.

 A Sra. encontrava-me habitualmente com o Padre, na Igreja ou fora dela?

— Não habitualmente, mas frequentava a Igreja e ajudava em algumas tarefas da Paróquia, até no jardim, portanto encontrava o Padre por vezes. Fora da Igreja raramente.

— Confessava-se todas as quartas-feiras?

 Sim, mas essa pergunta é muito inoportuna!

Aquele rosto bonito, alterou-se com sinais de preocupação, testa enrugada, sobrancelhas juntas dando sinais claros de ansiedade.

Brito logo captou e a flechou com outra pergunta.

 A Sra. já foi chantageada ou molestada pelo Padre?

A flecha acertou no alvo!

Íris transtornou-se, e num rompante expulsou o detetive sumariamente da casa.

Brito desconsertado, passando o portão deixou um aviso:

— Não tenha medo, acalme-se, pense bem no assunto e me ligue, deixei um cartão na varanda.

Ouviu-se um estrondo da porta fechada violentamente!

Agora Brito já chegava mais perto do objetivo.

Com paciência, entrevistou algumas outras mulheres e o cenário foi se formando.

Homens também foram ouvidos e o cerco fechava-se.

Nessa altura, a cizânia instalou-se na pequena cidade. Brito muito ardiloso, quando entrevistava uma nova pessoa deixava transparecer que já sabia de vários segredos, jogava verde para colher maduro.

Assim adquiriu evidências suficientes sobre os maus feitos do Padre.

Com os efeitos da cizânia implantada, Íris não se conteve.

— Detetive, já que todos sabem das maldades praticadas, venho aqui relatar minha história.

Pasmo, ele puxou uma cadeira para a primeira-dama.

— Sou todo ouvidos.

— Como já falei eu confessava todas as quartas feiras, como há sigilo, relatei um caso extraconjugal e outros pecados. Foi o pior ato que fiz, desse dia em diante ele me chantageava e extorquia dinheiro com ameaças de contar para o meu marido e acabar com minha honra. O calvário era doloroso demais para suportar, até que certo fim de tarde o Padre me convocou urgente. Lá fui eu para a Igreja. Chegando deparei ele com duas taças de vinho e já me oferecendo. De pronto não aceitei, mas ele foi claro. ”Beba comigo ou conto nossos segredinhos! ”. Na segunda taça ele começou a me tocar, dizendo palavras doces e ao mesmo tempo ameaçadoras. Não demorou muito ele atacou impetuosamente, me beijou, apalpou meus seios, então gritei com todos meus pulmões.

Me fez ao chão e se jogou sobre mim. Gritei novamente!

Como um raio, do nada surgiu um braço forte em torno do pescoço dele e aplicou um golpe mata leão. Com dificuldade consegui sair debaixo do desvairado em tempo de ver o rosto do jardineiro acabar de me salvar, asfixiando o enlouquecido Padre.

Após a morte, eu e meu salvador ficamos estáticos, olhando um ao outro sem palavras. Ele ainda ofegante, disse: - Eu admiro muito a Sra., pelos seus atos e pelo carisma, jamais deixaria alguém lhe fazer mal. Já presenciei cenas pecaminosas desse falso Padre. Não o delatei por medo de ser desacreditado. Agora foi feita a justiça! Pode ir em paz Dona Iris.

— Agradeci imensamente e sai às pressas.

— Sr. Brito, peço encarecidamente que não prenda o jardineiro, ele me salvou, foi legitima defesa. Rogou Íris emocionada.

— Pode ficar tranquila, foi tudo esclarecido. Garanto que ele respondera por legítima defesa.

Agora que desabafou e nos conhecemos melhor, ganho muito pouco e preciso de dinheiro. Se for de seu interesse, eu conto segredos do seu marido e a Sra. me retribui com dinheiro. Acho que vale a pena. Aceita?

— Topo, quando começamos?

 


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