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A BALANÇA DA FELICIDADE - Suzana da Cunha Lima

 



A BALANÇA DA FELICIDADE

Suzana da Cunha Lima

 

Estava extremamente desgostosa consigo mesma. Segunda-feira é dia de se começar algo, pensou. Foi para a aula de Pilates a pé, descendo a ladeirinha animada, para queimar os excessos do final de semana.

Quando retornou, esbaforida do duplo esforço, deu o almoço para o filho e a cunhada que tinha ido visitá-la. Muita risada, comida boa e sobremesa feita em casa: cidra com coco.  Resistiu ao doce. Depois que eles se foram, resolveu arrumar o armário. Metade da roupa já não usava mais. Engordara alguns bons quilos nos últimos meses, tinha pouca coisa agora que lhe servisse.  Olhou desolada a montanha de roupas imprestáveis em cima da cama, terríveis juízes da derrocada de sua silhueta.

- Como deixei isso acontecer, pensou, ficando com raiva dela própria pelo relaxamento.

Nem quis subir na balança. Vou ficar com vontade de bater em mim mesma.  Mas, tinha que viver sua vida com aquela outra pessoa que se apossara de si, antes tão esbelta e faceira.

Não teve mais ânimo de remexer as gavetas.  Fica para o outro dia, pensou.  Subir a ladeira duas vezes já lhe tinha levado o fôlego e amor-próprio.

Será que não há nenhuma pílula milagrosa que derreta para sempre o pneu que arranjei em volta de minha linda cinturinha?   Sabia que não havia.  Pensou no procedimento da bolsa no estômago.  Já estava pensando seriamente nisso há algum tempo.  Vou comer pouco, quer queira ou não.  Aí o estômago diminui e a vontade de comer também.

Não houve médico que quisesse fazer a tal cirurgia.  Era muito nova e nem tantos quilos a mais possuía. É questão de força de vontade – diziam – coma mais vezes e pouco. E faça exercício, tome um pouco de sol.  Preencha seu tempo para não pensar em comer, e tudo ficará bem.

Mas não ficou.  Ao estacionar o carro, baqueou, ainda sentada. Um AVC!  Felizmente, o vizinho de vaga notou algo errado com ela, com a cabeça caída ao volante.

Foi um corre-corre!  Quem veio primeiro foi o filho que morava próximo, Providenciou a ambulância e só de lá informou aos irmãos e ao marido;

Quinze dias de coma, não sabiam se ela voltaria e, se voltasse, quais seriam as sequelas.  Mas ela voltou.  Abriu os olhos, e viu o marido ao lado da cama, cochilando. O relógio marcava três da tarde. O que tinha havido? Desconfiou que estivesse num hospital, mas o que fazia ali?

Mexeu mãos, braços e pernas. Será que me acidentei, pensou?  Tudo em ordem.  Estava com um braço no soro, nada mais.  Passou a mão no rosto, não tinha bandagens, não doía. 

Seja lá o que for, pensou – estou inteira, que bom! O marido acordou com o barulho dela se remexendo e deu um largo sorriso ao vê-la de olhos abertos, olhando para ele interrogativamente.

- Ah, meu bem, que bom que acordou!  Belo susto nos deu.  Como está se sentindo agora?

- Beleza, amor.  O que aconteceu? O que faço aqui?

- Você teve um AVC no carro, na garagem. Ainda bem que o vizinho de vaga notou algo errado e alertou a portaria que pediu uma ambulância. Foi isso. Mas agora você já acordou e parece muito bem.  Vou chamar o médico para lhe dar alta. Vamos para casa!

A enfermeira ajudou-a a se vestir enquanto o médico assinava a alta com um monte de recomendações.

Quando se olhou no espelho, assustou-se com a cara abatida, meio chupada.

- Meu Deus, o que é isso? Pareço uma velha.

- Que velha que nada – animou-a o marido.  - O que está é bem enxuta.  Veja que o vestido está solto, você emagreceu muito nestes quinze dias.

- Nossa, é mesmo! Quase gritou de contentamento. Valeu mesmo! Vamos para casa meu bem, quero ver quantos vestidos agora me servem.

Ele riu, contente e aliviado, observou ela colocar um batom e escovar a cabeleira. Parecia uma mocinha.

Ela não cabia de tanta felicidade.  O médico deu-lhe alta com um monte de recomendações e remédios, mas ela não se importou nem um pouco.

Chegaram em casa felizes. O marido tinha providenciado comida chinesa, que ela adorava e um bom vinho, para festejar sua volta.

Mas, inacreditavelmente, ela estava completamente sem apetite.

E assim os dias se seguiram, ela totalmente inapetente, e se sentindo cada vez mais fraca. Teve que ir algumas vezes tomar soro e, se submeteu a alimentação endovenosa.

Estava magrinha sim, até bonita, mas fraca e sem vontade de fazer nada.

E agora? O que será que vale mais na vida?

O que vai pesar mais na balança da felicidade?

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