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Arco-Íris - José Vicente J. Camargo

 

 


Arco-Íris   

José Vicente J. Camargo

 

Quer ouvir uma história? Vou contar uma fantástica!

Fantástica? Como assim?

É quando o texto é uma ficção criada na imaginação, não é real!

Vou chama-la de “Arco-Iris”:

 

O dia amanheceu lindão! Sol de maio esparramando sua luz brilhante e amena por entre as poucas nuvens penduradas no céu azul, chamando os habitantes da cidadezinha escondida entre as verdes montanhas, a saírem de suas tocas sonolentas. Tico pulou da cama assim que seus olhos se arregalaram com o bater insistente dos raios solares e, se vê, de repente talvez impulsionado pela energia sideral a caminhar, ainda com gosto de café na boca, pela trilha que leva ao rio. Carregava numa das mãos a vara de pescar e na outra um balde contendo minhocas acabadas de serem extraídas da terra adubada do seu quintal, uma guloseima pra nenhum peixe botar defeito. Nas costas uma mochila com os apetrechos de pesca e o lanche para a hora que o estômago roncar. Apressou o passo torcendo para encontrar “aquele lugar” que mais lhe agrada, bem no meio da ponte que cruza o Rio das Araras.

Satisfeito por ser o primeiro a chegar, se posicionou no lugar preferido onde a profundidade do rio é maior aumentando assim a chance de fisgar peixes grandes. Não demorou muito e sentiu a vibração da vara indicando “peixe no anzol”! Fisgou com fé tirando d’água uma traíra típica da região e muito saborosa quando frita ou ensopada. Extraiu o anzol com cuidado e a guardou num saco de estopa mantido dentro d’agua para conservar seu frescor.

Hoje é meu dia de sorte! Pensava, enquanto ia fisgando outros peixes de bons tamanhos... Depois do lanche, pensando na peixada que ia preparar quando chegasse em casa, regada a vinho branco, presente da Inês pro dia dos namorados – não posso esquecer de convidá-la, quem sabe se não é hoje que ela vai aceitar aquele meu convite pra passarmos a noite juntos – resolve pescar o último e pegar o caminho de volta: “Chega por hoje! Exagerar na sorte dá azar...”

Qual minha surpresa quando, ao fisgar o último, me vem balançando freneticamente na pontinha do anzol, um peixinho dourado de rabo cor do arco íris me jogando beijinhos, com sua boquinha abrindo e fechando. Minha surpresa se transformou logo em carinho me enchendo de um sentimento de paz e alegria. Minha consciência dizia para devolvê-lo ao rio, mas a sensação de bem-estar que me apoderou foi mais forte e acabei por guardá-lo com cuidado no bolso da camisa, procurando com isso acalmá-lo com o calor do coração cujas batidas aumentaram dado àquela situação atípica, fantástica. Vou chamá-lo de “arco-íris”, a cor de seu rabo...

No caminho de volta, Tico sente um aumento da sensação gostosa de leveza e paz. Chegando em casa guarda os apetrechos da pescaria, liga para Inês convidando-a para o jantar e conta a fantástica surpresa que recebeu do Rio das Araras, recusando a revelar qual é, apesar dos insistentes apelos de Inês: “Só digo com você sentada à mesa, e se aceitar uma proposta que vou lhe fazer”, dando um tom  de conquistador... Desliga e corre pra cozinha a iniciar o preparo da peixada acompanhada de arroz branco, pirão de peixe e molho de quiabo tal qual a receita que a mãe lhe ensinou – que Deus a tenha! O pirão, vou escrever um bilhete para Inês fazer, que é a sua especialidade. Enquanto o peixe cozinha, vou tomar banho me preparando para o aconchego noturno. Quanto ao “arcoíris”, sempre saltitando e mandando beijinhos, vou escondê-lo na gaveta das ferramentas para Inês não o ver até chegar a hora da surpresa.

Ao voltar a cozinha, exalando água de barba e rodopiando no amor por vir, acalma Inês da sua ansiedade em saber a surpresa prometida:

− Só conto na mesa depois de você aceitar minha proposta! Agora me deixa terminar de fazer a peixada, observando o pirão pronto na panela ao lado.

Ok! Responde ela, mas então apressa essa comilança que já estou com água na boca. E, como não sou de guardar segredos, vou avisando que a sua contrapartida, que já presumo qual seja, está aceita.

Esse meu dia está realmente especial! Retrucou Tico. Vou abrir o vinho branco que você me presenteou e que guardei exatamente para essa ocasião, pois sou adepto do lema “o amor se conquista pelo estômago”! Pode sentar que já vou servir...

Na mesa, que Inês decorou com capricho, brindam a felicidade do momento sem se preocuparem com os escorregões que a vida pode, sem aviso prévio, trazer. Elogios de ambas as partes sobre as iguarias preparadas ecoam entre os aromas apetitosos...

No final da ágape, ele diz: Agora vou buscar a surpresa da noite! Ou melhor, da minha vida, pois pretendo trazê-la sempre comigo que me traz muita sorte como o dia de hoje já comprovou. Sai e minutos depois, ouve-se vindo da cozinha um bater de gavetas e portas entremeado por impropérios raivosos. Volta à mesa em lágrimas e, com olhos fixos em Inês, soluça:

Meu “arco-íris”, você não o viu? O guardei dentro da minha gaveta de ferramentas, não está mais...

 Inês sente a punhalada do ato cometido sem má intenção e encabulada responde:

− Um peixinho dourado? Ouvi um barulho na gaveta, abri e me deparei com ele sapateando entre pregos e martelo me atirando beijinhos. Disse-lhe: “Você é muito fofinho, mas aqui não é circo e lugar de peixe é na água. Então joguei-o na água do pirão pra dar aquele gostinho...

Como diz o ditado:

Sorte demais dá azar... 

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