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A dançarina na janela - Ises A. Abrahamsohn




A dançarina na janela
Ises A. Abrahamsohn

O calor no quarto alugado era insuportável. Juvenal sentia os riozinhos de suor descerem pelo peito e pelas costas nuas. Apoiou-se no parapeito da janela e ficou ali, olhando o escuro, a implorar por uma brisa que aliviasse o sufocante mormaço. Fazia seis meses que estava em São Paulo. Lá em Natal ao menos havia o vento e o mar, pensou com alguma saudade. A miséria estava lá e cá, apenas era diferente. As baratas e os mosquitos de lá e de cá mais o calor não o deixavam dormir. Acendeu um cigarro para espantar as muriçocas e as lembranças. Tinha vindo para trabalhar e melhorar de vida, pelo menos trabalho já tinha arrumado. Devaneava, quando uma  das janelas do lado oposto se iluminou. Sabia que era mulher a ocupante do quarto. Via a silhueta mover-se atrás da cortina transparente. Os cabelos eram soltos e compridos, o corpo, carnudo de jovem. Agora ela se mexia e girava com os braços levantados. Dançava ao som de alguma música que não alcançava seus ouvidos. A dança tornou-se mais lenta e voluptuosa e a moça deslizava as mãos ao longo do corpo movendo-se para trás e para frente. Os seios balançavam. Juvenal sentiu que endurecia. Não tinha mulher desde Natal. A danada sabia que a espiavam e rebolava ainda mais acariciando seios. De repente, apagou-se a luz. Final abrupto. Findo o espetáculo para Juvenal e para outros olhos vorazes espectadores na escuridão.

No dia seguinte ao sair do bar Juvenal procurou o Atílio, antigo morador no térreo e autodenominado zelador. Conhecia os moradores e vivia dos consertos que fazia no prédio. Atílio era sobrevivente dos bons tempos do edifício, hoje decadente, cujos apartamentos tinham se transformado em pensões baratas. O zelador riu-se da pergunta do rapaz.

 ̶   Você é o terceiro que me aparece perguntando da moça da janela! Estou até curioso de ir olhar hoje o espetáculo de graça. Sei bem quem é. O nome dela é Genivalda, mas ela se apresenta como Jenny, jota, e, dois enes e ipisilone no fim. Diz que é seu nome artístico É uma dessas moças que veio do interior com ideias de conseguir emprego como bailarina na televisão. Trabalha como garçonete no Rei do Olido. Mora num quarto do 303, no bloco dois. Na minha idade já vi muitas delas e tenho pena. Vêm cheias de esperanças, mas depois de uns dois anos desistem. Algumas acabam caindo na vida.

À noite, Juvenal estava a postos na janela, à espera. E, de novo, lá pelas dez, a luz se acendeu e a silhueta de Jenny se contorcia na dança erótica para os olhos gulosos dos vizinhos. No dia seguinte iria procurar a moça.

Esperou-a às nove, à saída do restaurante. Ficou um pouco decepcionado. Era baixinha, bem feita de corpo, carnudinha como ele gostava, mas o rosto marcado pela acne não era lá essas coisas embora não fosse feia. Afinal, ele não estava muito interessado em rostos. Apresentou-se, educado, disse que a tinha visto no restaurante na hora do almoço e não falou nada sobre dança, nem onde morava. Perguntou se era de Natal como ele e ficou sabendo que a moça era de João Pessoa. Ofereceu-se para acompanhá-la e propôs tomarem um refrigerante que ela recusou. Caminhavam conversando pelas ruas já desertas após o fechamento do comércio. Nas proximidades do prédio, num vão mais escuro abraçou-a. De início, sem muita resistência, ela até correspondeu aos beijos. Mas logo quis se desvencilhar. Juvenal não ia desistir fácil. Empurrou-a para o fundo de uma galeria e apertou-a contra a parede enquanto lhe levantava a saia. Ela mordeu-lhe a mão. O antes gentil Juvenal acertou-lhe um soco no estômago e logo outro no rosto. Jenny, atordoada, parou de se debater e escorregou para o chão. O homem arrancou-lhe a calcinha e a penetrou ali mesmo. Saciado, se afastou e caminhou até o apartamento. Tomou uma chuveirada e deitou-se. Sabia que nessa noite não haveria espetáculo. Outros olhos ficaram esperando em vão pela dançarina na janela.


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