VAI VARRER OU VAI VOAR
VAI VARRER OU VAI VOAR
VAI ACUDIR OU VAI BEIJAR
VAI SORRIR OU VAI CHORAR
VAI AMAR OU VAI SOFRER
VAI PERDOAR OU ESQUECER
VAI COSTURAR OU VAI COZER
VAI PASSAR OU VAI LAVAR
VAI FAZER OU VAI COMPRAR
VAI LER OU CANTALORAR
VAI ENXUGAR OU ACUDIR
VAI FICAR OU VAI SAIR
VAI SER OU JÁ É MÃE
PENSOU EM ABDICAR
EM ABANDONAR
EM DESISTIR
EM RENUNCIAR
SINTO MUITO,
NÃO ESTÁ PREVISTO
EM NENHUM LIVRO
NEM NAS ESTRELAS
Hoje
me caiu nas mãos a pegadinha fatal. Num terrível acidente de automóvel, pai e
filho ficam gravemente acidentados. O pai morre no local. O filho é levado ao
Hospital com ferimento profundo no tórax, com grave lesão dos pulmões. Estado
desesperador! Chamam o maior especialista em cirurgia de tórax. Ele
contempla o menino e murmura:
─ Não posso operar esse menino é meu filho!
Tive duas reações,
uma delas como médico. Operaria sim, fomos preparados para isso, superar as
emoções. Remoê-las depois, sozinhos em algum canto do Hospital. Engolir calado
a dor que acumulamos lá em cima.
A outra, como bom
machista. Não pensei em momento algum que o maior especialista em cirurgia de
tórax fosse uma mulher: a mãe.
Tinha toda razão Hipócrates, a arte é longa e
a vida breve. Com oitenta anos de idade e ainda não consigo imaginar uma colega
como a maior especialista. Se a Angelita Gama ler esse texto que me perdoe.
Talvez se a história fosse o maior especialista em cirurgia colo-retal eu teria
um momento de lucidez.
E é bom reparar que a
medicina ocidental não foi sempre tão ultrajante. A famosa Escola de Salerno,
lá pelos anos 1200 já admitia alunas mulheres porque entendia que as pacientes
do sexo feminino se sentiriam melhor se atendidas por uma médica.
Sei que há
luz no fim do túnel, mas é que estou caminhando nele faz tanto tempo, e
por não vê-la às vezes me desespero e não é com o mundo não, é comigo mesmo.
Tava na cara que era a mãe.
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