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MARTA TE FIZ MULHER - Oswaldo U. Lopes



MARTA TE FIZ MULHER
Oswaldo U. Lopes

        Há alguns anos, quando não havia debate sobre pichação e grafite a frase acima apareceu em diversos muros da cidade, sobretudo nas zonas de classe alta, e média alta. Jardins e assemelhados. A curiosidade foi geral e imagino que as Martas daquele tempo, todas odiaram a frase. Todas? Uma talvez tivesse sorrido.

        Lembro-me bem de uma amiga que se dizia conhecedora da tal Marta e que o fato era verdadeiro. A conotação era totalmente machista. Todos entendiam que Marta tivera sua primeira relação sexual.

        Entre nós, os avançadinhos da época, todos tinham lido ou tido noticia do livro de Simone de Beauvoir - O Segundo Sexo que datava de 1949. O livro em si já era um escândalo porque de cara colocava a mulher como o segundo sexo, logo o primeiro era o homem. A mais pura verdade, mas a verdade mora num poço como nos ensinou Noel Rosa. A questão feminina tornava-se mais e mais presente.

        Como boa existencialista Simone de Beauvoir acreditava que a existência antecede a essência, ou seja, primeiro você existe, depois torna-se:

“Ninguém nasce mulher, torna-se mulher”.

        Esse tornar-se é que era o mistério. Se “fazer-se” ou “tornar-se” mulher implicava a primeira relação sexual, o mundo estaria cheio de seres aparentemente femininos (virgens em geral, muitas das freiras) que não seriam mulheres. Começou o enrosco. Biologicamente o embrião é basicamente feminino, adquirindo caracteres masculinos ao longo do desenvolvimento fetal. Como o cromossomo Y é quase vazio, o embrião se torna masculino por falta de alguma coisa que no embrião feminino tem de sobra (duplo XX).

        Seria acaciano não reconhecer nas várias espécies de mamíferos que os machos são em geral, mais fortes, mais ágeis, mais dispersivos. Alguém já chamou os homens de espalhadores de espermatozoides. A mulher seria mais passiva, uma vez fertilizada ela se fecha, se torna, como a palavra popular o denota, embaraçada. Essa forma de reprodução é encontrada até entre flores.

        As exceções são muito conhecidas e apenas reafirmam as regras. Um sistema que funciona através de proteínas e aminoácidos esta sujeito a variações que se quisermos podemos chamar de erros genéticos.

        Ficou famosa uma edição da Revista Realidade em que a matéria, não falhando a memória, estampava:

“Há 17 sexos, escolha o seu”.
        Para quem só acreditava em dois, dezessete era uma abundância enlouquecedora de sexos.

        Lá nas calendas a evolução fez suas escolhas, as mulheres cheias de curvas, mas não muito musculosas. O trabalho e a produção material que dependiam de força física eram encargos masculinos. Dai para a violência e a força bruta foi um passo.

        O que alterou a equação? Algo em que nem sempre pousamos nossos olhos. A energia de qualidade a preço relativamente barato. Os músculos grandes e fortes não mais eram necessários. As máquinas faziam e fazem o trabalho pesado. Mais tempo para pensar e criar. A igualdade começava a sair do papel.

        A pesquisa médica contribui drasticamente. Várias e diferentes formas de contracepção apareceram e se tornaram muito populares. A gravidez indesejada, uma ameaça onipresente nas relações sexuais entre homem e mulher foi transformada em gestação planejada.

        Mas, não era nossa questão primária. O que é tornar-se mulher?

        A atividade sexual? A maternidade? Criar os filhos? Fazer as compras do supermercado?


        A resposta é provavelmente complexa e multifatorial. Nesse mundo em que vivemos em que as coisas não vieram com plantas e desenhos explicativos, ninguém é dono da verdade. Essa é o que  homem e  mulher tem que buscar com o suor do próprio rosto.

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