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Goleada de 7 a 1 pro Brasil - José Vicente J. de Camargo

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Goleada de 7 a 1 pro Brasil
José Vicente J. de Camargo

Dava até raiva, de tão certinho que ele era...

Tinha ocasiões que era um verdadeiro desmancha prazer com essa mania de fazer tudo dentro das regras. Detestava fazer algo errado e não gostava de quem o fazia. Dizem os mais íntimos que ele nasceu com a mão fechada. Ao abrir, segurava uma miniatura do manual “Comportamento do Bom Cidadão”.
Só podia ser alemão!

Mas ele, para o bem da verdade, contestava. Dizia se sentir alemão de sangue brasileiro, pois seus pais biológicos, que ele não conheceu, o eram. Sobre eles só sabe que além de brasileiros, eram jovens “hippies” perambulando pela Alemanha e se conheceram uma noite, por acaso, numa festa da cerveja. E num “descuido do destino” ele nasceu. Sua mãe, solteira, mal sabendo o nome do pai e seu paradeiro, foi convencida a entrega-lo à uma instituição de caridade. Ela aceitou com a condição de não ter seu nome revelado.  A instituição, por sua vez, o entregou para adoção à um casal de alemães, seus atuais pais adotivos.

Então, quer dizer que essa mania dele fazer tudo “direitinho” não é genética, mas vem do ambiente em que cresceu e se educou?

Correto! Mas até o dia em que conheceu na Faculdade de Direito que cursava, um estudante brasileiro, um “bon vivant”, vivendo de mesada do pai. Se tornaram amigos. Nosso alemão, de início, foi mais atraído pela curiosidade de ter contato com alguém de seu próprio sangue. Depois, foi se deixando cativar pelo jeito descontraído, despreocupado, “laisser faire” do amigo brasileiro. O ápice dessa amizade veio quando este o convidou para um baile de carnaval promovido pela colônia brasileira nos salões do hotel mais chique da cidade. Antes do baile se “animaram” com algumas caipirinhas feitas com cachaça legitima, limão galego e açúcar de cana – nada de rum e açúcar de beterraba, usuais na Alemanha – comprados em armazém de produtos importados, onde o brasileiro comprava também os ingredientes para a feijoada.

No baile, o alemão, de início, manteve-se inerte com os pés colados no chão. Mas aos poucos, com a empolgação crescente dos foliões no ritmo contagiante e saudoso da pátria distante, foi se soltando até que, a madrugada veio encontra-lo, no meio do salão, ornado de colares havaianos, serpentinas e confetes, gesticulando mais que todos, abraçado a uma odalisca negra de salientes quadris e fartos peitos.

No caminho de volta a casa, o alemão insistiu em dirigir sem dar ouvido aos conselhos contrário do amigo, a esta altura convertido em bom samaritano – infringindo assim algumas regras sagradas da boa conduta alemã: que são a de dirigir com teor alcoólico e em velocidade superior ao permitido por lei. Infringiu também outra norma básica que é a de ultrapassar semáforos em vermelho. Não só o fez, como também mostrou às câmaras, o dedo indicador em riste e a língua pra fora,  e terminou a noitada dando mais um de sinal de inconformismo com o “estado quo” vigente, ao urinar na calçada.

Na manhã seguinte, tomando água de coco pra aliviar a ressaca, toma a decisão mais importante da sua vida, ao saber que em várias cidades brasileiras, o carnaval dura uma semana e os “não oficiais” acontecem varias vezes ao ano, respondendo:

Vou contigo ao Brasil, quando terminarmos a faculdade. Nos papéis da minha adoção está indicado que meus pais, apesar de desconhecidos, são de nacionalidade brasileira. Não devo ter problemas de residência. Se necessário faço exame de DNA para comprovar que meu sangue não é ariano, mas sim uma mistura verde-amarela de várias raças”.

E num gesto brusco pica com gosto o seu manualzinho alemão de boa conduta que sempre traz consigo.


Desta vez, sem dúvida alguma, foi o Brasil que goleou de “7 a 1” a rígida defesa alemã...

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