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QUAL A PIOR CEGUEIRA? - Oswaldo U. Lopes


QUAL A PIOR CEGUEIRA?
Oswaldo U. Lopes

            Uma pessoa e mesmo um animal com grande dificuldade física tende a ser excluída ou alijada do grupo ou conjunto. A prática espartana de eliminar recém-nascidos portadores de algum defeito foi, ao longo do tempo abandonada, mas é comum nos animais que caminham ou vivem em grupos. Os mais fracos ou doentes são abandonados.

Ninguém nega a existência do que chamaríamos inteligência animal. Somos frequentemente surpreendidos pela capacidade de um cachorro, por exemplo, de aprender truques e somar aprendizados.

            A limitação animal esta na incapacidade de acumular experiência e conhecimento nas sucessivas gerações o que na espécie humana resultou no que chamamos de civilização. Mesmo a cogniscência, esse sentimento de si mesmo que nos parece tão distinto não é estranho aos animais, por certo é o grau que nos diferencia.

            Como no caso dos golfinhos que salvam humanos em via de se afogar! Os cínicos dirão que nos falta a versão dos afogados.

            Os humanos são civilizados e têm até orgulho de preservar a vida e lutar por ela, mesmo em condições extremamente adversas. Não é comum julgar-se ou cobrar o custo de tal conduta. Certos julgamentos feitos em virtude das péssimas condições, por vezes encontradas numa Unidade de Terapia Intensiva, são sabidas, mas não publicadas ou estimuladas.

            O que chamamos de virtudes humanas, afeto desinteressado, amor na adversidade, superação infinita, existem ou são efeitos de uma mente psicologicamente condicionada. O altruísmo existe? Como é viver o dia a dia de uma família que tem entre seus membros alguém com uma deficiência séria e limitante?

            Antônio noivou Joana por um tempo razoável e depois se casou e tiveram filhos e viveriam até que a morte os separasse se Joana, de uma formidável dor de cabeça não tivesse evoluído para uma misteriosa cegueira em que a máquina fotográfica (olho) estava perfeita, mas a impressora não funcionava.

            Antônio desdobrou-se e dobrou-se na superação. A cegueira repentina trava a pessoa. Não existe adaptação tempo decorrente, acostumar-se, iniciar-se no alfabeto Braille aos poucos, a falta de visão súbita é paralisante.

            Não fora fácil, já lá se iam dezoito anos no embate diário. E como era difícil para Antônio lidar com uma filha mulher, seus namoricos, suas escapadas, as baladas. Cecilia não era uma menina diferente das outras, o que já não era pouco.

Uma coisa intrigava Antônio, a beleza de Joana. Parecia que a cegueira lhe tirara a visão, mas lhe dera uma face suave e doce. O corpo, por si, era ainda jovem e bonito, pena que ela não podia vê-lo.

Com André, o menino, fora mais fácil, embora dispersivo e fugidio, gostava de estudar e tinha notas que o credenciavam a um futuro promissor.

E assim Antônio aceitou seu fardo sem discutir nem esbravejar. Tampouco praguejava, seu Deus era distante solene e não do momento presente.

Até que um dia, só para contrariar, Joana levou um tombo e bateu feio a região occipital . Não chegou a desmaiar, mas teve muita tontura. Levada ao hospital começou a descrever coisas que estava vendo. Alvoroço geral, ela chegou a ler uma placa na entrada do Pronto Socorro.

Os médicos não se espantaram tanto. Há na literatura médica sobre casos semelhantes. Uma pequena cirurgia para remoção de um coágulo foi feita e ambos os olhos foram ocluídos por curativos, mas o fato estava lá visão recuperada.

            E agora Antônio? Ela continuava linda e não tinha mais a deficiência visual, teria autonomia para viver assim? E Cecilia o que faria agora sob a vigilância real da mãe. André, como esperado, fechou-se ainda mais nos estudos.


            Eta reviravolta dos diachos, pensou Antônio.

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