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O MEU CURIÓ - M.Luiza de Camargo Malina


O MEU CURIÓ
M.Luiza de Camargo Malina

Ora bolas! As coisas acontecem no momento errado. Dólar em alta e eu os comprei. Tempo de necessidade e o dólar cai. Comigo é assim, ao contrário. Estou deslanchando e aí chega a bola e bate na canela. E como dói. Já fiz de tudo, menos trabalhar, é claro. A herança foi dita que era para toda uma vida. Pois é! Mas não esperavam que eu fosse viver tanto. A vida é cheia de surpresas, uns com tanto e outros que não sabem administrar nada. Não nego fui um bon-vivant. Mas meu Curió... ah! Meu Curió. Tinha cento e sessenta, todos bem trinados. Acho que foi inveja do vizinho. Começaram a morrer. Não, não, deve ter sido a falta do mato. Também, resolvi criá-los em confinamento. 

Por que é que eu fui fazer isto. O espaço era grande, mas também entre eles apareceram uns cabeça mole e rápido mudaram seu trinar. Que trabalho, tive que separar todos. Ouvir de um a um a canção e isolá-los em outro galpão. Lá foi mais outro tanto de investimento. Cabeça mole de um lado e os perfeitos nas notas, de outro, quase que enclausurados, assim o som não iria interferir nos outros. É foi aí que começou o furo no saco. Tira dinheiro daqui e dali. Vendi uma parte da fazenda, depois outra. Fiquei com a mais bonita, perto do lado, tudo por causa dos curiós. Apareciam muitos. Eu não contava com uma coisa, a inveja, a cobiça de outros criadores. Aos poucos foram rareando e acabar por sumir. Alcançavam preço alto no mercado. Arrisquei vender um, apenas um pensei. Afinal tenho cento e setenta e oito curiós em três galpões. Que falta me fará um. A quantia foi boa. Boa mesmo! É acertei na vida. Vou viver dos curiós já que as terras já se foram.
O primeiro Curió, Oryzoborus angolensis, bonito nome científico, mas o que eu mais gostava era o significado indígena “Amigo do homem”. Este tipo de amizade preenchia minha s musicalidade da minha vida solitária.
Precisava vender um, apenas um. Escolhi, escolhi e escolhi. Estava difícil. Fiquei com dó. Em frente a gaiola eu ficava e eles se apresentavam. No traje preto estufando o peito avinhado movimentando as leves penas brancas das asas, disputavam no trinar querendo ser o escolhido. Ah! Coitado! Mal sabia qual seria o destino! De que adiantaria ser o dominador, o melhor se afastado de mim! Que situação a minha! Foi difícil, não nego.

Foi aí que começou. Resolvi vender o melhor. O mais dominador. Outro tomaria a posição. Preciso do dinheiro. Ela será o chamariz. Outros compradores virão. Multiplicando por uns vinte, por aí que venderei, fico bem, posso aguentar por mais um ano. Crio mais, Faço outra seleção, se preciso, mais um galpão. Sim! É isso aí. Vou vender.

O Curiozinho... ôh meu curiozinho! Que dó.

Lá fomos nós para a cidade. O aviário me aprontou uma. Avisou aos criadores que eu iria vender o primeiro Curió. Sabiam da minha criação secreta. Ninguém lá entrava para não contaminá-los. Eram sadios. A procura foi tão grande que ele organizou um leilão.

Que susto! Ao chegar o que eu vi! Gente apinhada na porta. Parei. Olhei aquilo tudo. E eu vi:

- Ele chegou. Depressa, Vamos começar. Qual o primeiro lance?

-Eu, eu 50 mil dólares.

- 80.000

- 100.000!

Comecei a ficar estonteado. O que estava acontecendo? Estão vendendo o aviário?

- É meu, bradou uma voz arrouqueada baforando uma boa leva de charuto cubano: três mil dólares e não se fala mais nisso.

Nisso? Que nisso é esse? Será que o caso é comigo? Meu curió. Ué! Vale tanto! Bom, vamos ver o qual é o furdunço dos amigos. A grana é boa. Ao me aproximar ouvi alguém gritar:

- Polícia!


Foi um corre-corre danado. Onde é que eu iria me esconder com a baita gaiola! O carro estava com pouca gasolina. Que situação. Armaram para mim. Meu Curió é meu. Pois é! Foi assim.

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