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NINGUÉM QUERIA VIOLAR AQUELE BAÚ - Oswaldo Romano


NINGUÉM QUERIA VIOLAR AQUELE BAÚ
Oswaldo Romano        
                                                                         
            Meus pais são casados e felizes há quase trinta anos.

            Os filhos cresceram, enquanto eles, que perderam os velhos, o avô com 85 anos, e a mãe aos 74, nos contavam passagens de suas vidas.

            Quando falavam do meu avô, o velho Abreu, um líder de toda família, maestro condutor dos familiares e os excelentes negócios que criara. Conforme o rumo da conversa, tomavam cuidado com as pessoas presentes e com as palavras. Não me pergunte por quê.

            No período em que exerceu a profissão de coletor do Estado, meu avô Abreu, entre 1.928 a 1.939, era personalidade respeitada na pequena cidade de Brotas. Respeitada, mas olhada de viés pela maioria dos Brotenses, que o via com desdém, pois era o cobrador dos impostos.

            Cumprimentado, ele do lado oposto os mirava com aquele sorriso que lançava escárnio. Seu sorriso mandava a mensagem: — Ainda vou te pegar...
            Foi nesse tempo que escreveu seu diário secreto guardado a sete chaves num pequeno baú que ficava no escuro porão da casa.

            Ninguém quis violar aquela caixa desbotada. Sempre foi dito tratar-se da guarda das coisas de somenos importância, próprias do coletor e mania de gente idosa. Questionada minha mãe dizia não precisar do baú para conhecer segredos do seu sogro. Ele sempre foi uma pessoa aberta.

            Meu avô, mesmo depois de morto, suas regras eram respeitadas.

            Flávio um primo, certo dia, mostrando profunda curiosidade, com vontade de aprontar alguma, convenceu-me violar o intocável baú no escuro e medroso porão, a luz de vela.

            Encontramos moedas esparramadas entre muitos  papeis. Elas foram vistas bem no fundo, onde esperávamos encontrar, as de ouro.

            Pousado em um dos cantos estava um livro, mostrando na capa ser seu diário. Sujo e embolorado como pão úmido envelhecido. Ao pegá-lo senti a estranha sensação de estar em vias de se dissolver, mas cuidadosamente o segurei.

            Vasculhando-o, víamos os trambiques que o fez rico. Era um corrupto, compartilhava com os devedores do Estado. Não precisava esconder. Esse fato era notório. Qual seria então o segredo que demandava tanto cuidado com seu baú cheio de papeis?

            Virando suas páginas, parávamos em fatos mais inusitados, a maioria sobre assuntos financeiros, seus resultados, contratos de gaveta, os devedores de suas investidas.

            Raras escritas contavam fatos corriqueiros, brigas de família, entre elas uma muito séria com seu filho Pepe que não queria aceitar tão cedo o casamento, embora gostasse muito da namorada. Essa história, um tanto estranha nos prendeu, esquecemos as horas, já anoitecia.

            Nasce uma explosão de curiosidade e espanto!

O velho descreve um caso secreto com Joana, sua futura nora e o fato de tê-la embaraçada. Linda como era, convivendo amiúde com o filho Pepe, gostavam-se muito e foram impulsionados a logo se casarem. Um fato contribuiu. O avô, eivado, perturbado com os acontecimentos, teve um enfarte. O fato contribuiu para apressar o casamento, pois sua saúde estava periclitante e antes de uma nova surpresa queria apreciar essa união.

            — Meu Deus! Ele é meu pai! Pelas barbas do profeta! Meu avô, é meu pai! Sou um herdeiro direto e rico! Eu e meu pai ele é meu meio irmão e também sua irmã. Sou filho do meu avô!

            — Primo? Você é meu meio sobrinho.

            Ficaram conjeturando, a ficha caía, os dois abobados pensavam: — E a herança? Sim a herança! Que devo fazer? Primo me ajude? Não quero discórdia... Mas, ficar quieto?

            — Boa, primo! ou devo chama-lo de tio?

            — Não é hora para brincar... Sei lá. Primo! Segredo absoluto. Estou atormentado. Amanhã, com a cabeça fria, você vai me ajudar. Já estou montando uma decisão.


            — Por hora querer mais que a felicidade que tenho, quebraria a felicidade de tantos outros, outros que tanto amo.

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