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DEUS ESTAVA COMIGO - Oswaldo Romano


DEUS ESTAVA COMIGO
Oswaldo Romano                                           

Visitar Mineiros do Tietê, cidadezinha do Estado, distante 300 km, onde moravam meus pais, era uma aventura.

 Até Campinas, tudo era festa! Pista recém-asfaltada, placas indicativas. Depois, só terra, areia, ou barro. As visitas eram feitas, aproveitando alguns fins de semana.

Numa das vezes, na volta, saí de lá no domingo, como de hábito, por volta das 23h. A viagem transcorria normal até Santa Maria da Serra. O tempo virou. Forte vento assobiante, armava um inesperado temporal.

Os primeiros pingos, grossos e doídos, mostravam o que me esperava. Havia chovido antes, a estrada já estava molhada. Muita lama, poças, gravetos e pedras. Um raio caiu, um estrondo que reverberou em toda montanha. Rachou uma arvore bem próxima, a minha vista.

 Iluminou todo vale. Seguiram-se muitos outros nas imediações. Os flashes e trovões comprimiam meu corpo. Encolhia-me, o que podia. Parar e me abrigar sob uma das frondosas árvores, nem pensar.  Tinha de companhia, só o ronco da máquina que se perdia pela mata afora. Assustador. Pressentia acontecer o pior, a moto quebrar e eu rolar pelo abismo. Era o que mais havia. Nesse momento, pedindo perdão pelos pecados, retraído, pedia a Deus para que a moto aguentasse. Afinal Ele tinha que entender.                                                
  Eu estava ali porque cumpria o sagrado dever de visitar minha santa mãe. Agradecia: Obrigado Deus, conto com sua proteção!

Essa serra é maravilhosa quando ensolarada. À noite banhada pela escura aguaceira, sentia correr pela veia, o medo, e pela cara uma cachoeira gelada. Meu corpo, respondia tremendo. Os faróis nas curvas entravam pela mata, esqueciam a estrada, iluminavam folhas fantasmas, perdiam-se num fundo negro infinito. As Santas Cruzes dos falecidos, ali lembrados, eram iluminadas de pronto. Não acredito em fantasmas, mas o que fazia a mulher de branco no meio da estrada? Vestido longo, abanando a mão? “É uma lamina d’água que reflete”.

  Em cada curva, outra cruz, mais outra, e outras. Sustentavam velhas coroas. Passava pelo meu pensamento, eu ser mais uma. Emocionado contestava: Xô, xô. Não! Não, não quero.

Foram momentos de pânico. Por muito tempo o temporal viajou comigo. Não faltaram os estampidos dos raios.

Finalmente, que contentamento! Cheguei à pista asfaltada, com as rodas ainda soltando respingos de lama, logo mais foi surgindo ao longo o pisca, pisca diamantado de São Paulo. Coisa bonita! Para mim, muito mais bonita! Chegamos irreconhecíveis. Dei um beijo na moto, bati na sua testa.

 No banho quente, escapava gritos de alegria. Valentina, a dona da pensão acordou. Chegou incrédula e com cara repreensiva. Foi bom ela aparecer. Depois das desculpas, pedi que me chamasse às 7h. Senti que apesar de tudo me admirava. Não reprovava meu ato de visitar a mãe, e disse:

— Meu filho que mora próximo, nunca me vê.

Mas como? Disse continuando, no seu sotaque polaco, - acordar as 7? Mas já são 6!
— Por favor!

Mas acordei. Acordei quando faltava pouco para derrubarem a porta.

Botei de novo a máquina rodar. A caminho do escritório, na subida da São João, quando mais apreciava seu ronco, perto da Duque de Caxias e a uma quadra da tradicional e histórica oficina de motos do Carmona, aconteceu um desastre:

Quebrou a corrente, que entortou os raios da roda e torceu o para-lama!
Que felicidade! Agora pode - Graças a Deus! Estava de novo em São Paulo, a cidade que há anos me acolheu!

Um tempo limpo, o sol rompia gostosa neblina.

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