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A RELÍQUIA - M.luiza de C.Malina



A RELÍQUIA          
M.luiza de C.Malina

Brenda, conhecida como Dra. Brenda. Enfermeira de padrão dedica sua vida ao trabalho. Ostenta sua beleza nos já adiantados 50 anos com a mesma simplicidade de quem inicia uma nova história a cada dia.

Acostumada à eficácia e modernidade dos instrumentos cirúrgicos, Brenda esconde seu lado nostálgico. Um gaveteiro de veludo negro expõe as poucas joias herdadas.

Ao abri-lo, seus dedos acariciam os dois curiosos relógios, que pertencera a sua mãe. Não a conhecera, falecera alguns meses após seu nascimento. A jovem avó a acompanhara por toda uma vida com os pequenos fragmentos enfeitando uma imagem conhecida apenas por fotografias.

Brenda, saudosa, entrega-se na tentativa única, em tê-la junto a si.  Sente-a frágil como a pequena peça. A medida do pulso nada mais é do que 14 centímetros. Tenta colocá-los em vão, em diversos momentos de saudades a fim de captar o registro da passagem do tempo entre os vendavais. Observa-os de maneira diferente.

 Mais do que uma joia que representa o símbolo de uma aristocracia, para Brenda é mais do que isto. No pulso, eles sentiram o pulsar do coração de sua mãe. Imagina-a numa tarde sol com vestido esvoaçante, passeando de mãos dadas com o marido ostentando o relógio com duas abelhas douradas de olhos de rubi e o corpo em pérolas, reluzindo o ouro com o movimento de seu braço. O que conversariam! Talvez planejassem o futuro de sua filha... O que conversariam num passeio a dois...

Devolve-o ao gaveteiro  apanhando o outro, de prata. Pesado. Com dois dragões como a guardá-la. Entre safiras, rubis e esmeraldas, conta e reconta as pedras, são em número de 28. Sobressalta-se com um pensamento. Será?
Corre ao encontro da avó, com o relógio na mão.

- Vovó!  Quantos anos a mamãe tinha mesmo quando faleceu?

- Vinte e oito anos, minha querida! Por que isso agora? Responde a avó surpresa.

- Nada Vovó, e você se lembra a que horas aconteceu?

- Sim minha querida. Eram 15:30 horas. Ela usava este relógio que você tem nas mãos. Estávamos todos juntos, ela tinha você nos braços. Havia te amamentado há alguns minutos. Fixou o olhar. Sorriu–me e disse:
- Pegue-a Mamãe, ela é sua.

Ao reclinar-me para te apanhar, percebi um longo suspiro. Logo entendi. Deixei-os a sós. Seu pai atento, do outro lado da cabeceira, chorava em silêncio. Assim ficou até que médico chegou para levá-la. Foi um momento difícil para ele. Retirou-lhe a corrente, a aliança e o relógio. Neste momento constatou que eram 15:30 horas. O relógio havia  travado momento de seu último respiro.  

Passados alguns meses, seu pai faleceu, como você soube, num desastre de avião. Nunca havia contado a você o detalhe da morte de sua mãe, e do relógio.

Deixei que sua mãe e você, juntas escolhessem o momento. Observava os dias em que você remexia o gaveteiro.  Sofria pensando “será que é hoje o dia que deverei contar?” e mais um dia, meses, e anos se passaram.

Brenda senta-se no colo da avó. O abraço não é solitário. São quatro pessoas a se reencontrarem no íntimo balanço da cadeira. O doce choro é de saudade e agradecimento. O momento é forte.



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