OS
DEDOS DE DAISY
M.Luiza de Camargo
Malina
Os movimentos incessantemente
repetitivos, das pontas dos dedos da bela jovem em seus 24 anos, traziam a
esperança misturada à curiosidade da equipe médica.
Os estímulos
mecânicos não os interrompiam, como também não apresentavam qualquer novo
indício da arte da dúvida de vida.
Os dias passam lentos
de um a um, acompanhados das visitas diárias, lentas de uma a uma. A tentativa em ajudar Daisy, a não
cair no escuro precipício da mente, é intercalada
em leituras em voz alta, dando continuidade às suas tarefas curriculares, ou simplesmente conversando com ela, num
brincar com a vida, ignorando o vazio existencial.
A busca pelo Criador e a “caixa de pandora” determina a força maternal que interfere na memória e no tempo de Daisy.
Após três anos desta
luta na reconstrução da ponte da vida, resolvem que Daisy retorne ao lar. Insegura, sua mãe aceita
contratando uma das fiéis enfermeiras que tão
bem conheciam o seu caso. A rotina diária permanecia igual aos
movimentos de seus dedos.
Mais uma estação.
Final de outono. O sol tímido, entrando à meia janela, trazia o frescor da manhã e o sibilar dos pássaros,
anunciando a chegada da primavera junto com
o cessar dos dedos de Daisy. Uma lágrima brotou do beco da
clandestinidade. Daisy emite um som alto
e estranho, que ecoa pela casa, abandonando o terrível porão da memória. Sozinha, pela primeira vez, em
seu quarto da infância.
A mãe é a primeira a
chegar, estupidamente assustada pelo romper do silêncio do dia.
Daisy com uma voz
doce e cristalina lhe pergunta:
- Onde está o meu
vestido?
Sentada junto à cama,
escondendo sua emoção, enxuga a lágrima da misericórdia dos olhos azuis de Daisy, perguntando:
- Qual vestido, minha
querida?
- Aquele de flores,
que você me deu quando papai trabalhava na Tailândia, Lembra!
- Sim, claro!
Responde a mãe acariciando seus cabelos, contendo o choro.
- Ele era muito
grande. Você me ensinou a bordar os galhos, as folhas e as flores, quando eu era pequena. Eu gostava de fazer
isso sempre que estava medo, buscava um
pontinho atrás do outro para chegar logo no final do ramo para encontrar a
rosa. Às vezes, eu me sentia dentro da história de João e Maria, sempre
caminhando, e bordando meu vestido, você
tinha muita paciência comigo. Acho que dormi muito, porque eu sonhava ...
Beatriz, atenta a
cada palavra, é reconduzida ao passado.
- Vamos morar na
Tailândia, aceitei a proposta da Embaixada! Daisy ainda é bebê, será ótimo para ela crescer em meio a uma cultura
tão diferente.
Assim seguia nossa
vida de 4 em 4 anos com novas mudanças, amizades e malas sendo fechadas, assim como pequenos objetos
deixados para trás. Nesta época passeava,
de mãos dadas com Daisy, pelas estreitas ruas do comércio local e ela
aponta para um longo vestido florido
pendurado junto à porta. Beatriz lhe pergunta: - Você gosta? Com sinal de consentimento, ela compra aquela
peça.
Daisy aprende com as
crianças a fazer seus próprios brinquedos, uso de plantas para chazinhos, a sugar o néctar do hibisco e
fazer um brinco com a seiva, fabrica colares e
pulseirinhas de flores da Exória, dança de rodas e o suave movimento das
mãos. Nada mais encantador para uma
infância feliz de princesa. Observando a habilidade manual,
Beatriz lhe ensina a
bordar um único ponto, o ponto mais fácil, ponto de corrente, para enfeitar seu vestido.
A cada quatro anos
novas experiências. Este era o quinto país. O último ano na China, quando recebem a notícia da rebelião que
estava prestes a explodir e, as demais representações
já haviam fechando as embaixadas, pois o aeroporto estava sob o controle da mesma.
- Apenas os
documentos, vamos rápido, ordenava Peter a Beatriz e a Daisy, rápido!
Daisy corre ao seu
quarto e retorna com seu vestido de flores enrolado embaixo do braço, apavorada.
Conseguem chegar ao
aeroporto. Em meio aos confusos atropelos, um tiro. Peter cai abraçado a Beatriz, aos pés de Daisy, com a
estampa do terror no rosto e o grito do longínquo
NÃO, agarra-se a seu vestido estampado.
Seus dedos, de ponto em ponto haviam
reconstruído o intrínseco caminho, da fina
rede de seda, da interligação dos neurônios. Depositara no tecer, as
recordações de seus sentimentos de amor
e conquistas, superando as frustrações para reeditar sua história.
- Daisy, Daisy! -
exclama a mãe, apertando-lhe as mãos, - Acabou!
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