VENDEDOR AMBULANTE
Mario Augusto M.
Pinto
Fuad estava cansado
da sua vida repetitiva, rotineira de vários anos no Amazonas: acordar, fazer
sua higiene matinal quando possível, vestir-se, engolir o café, dependurar as
malas nos ombros e sair pelas ruas e rios, verdadeiros desertos líquidos buscando
compradores para os produtos que tinha para vender. Era como assistir
diariamente ao mesmo filme, sempre em preto e branco e mais alguns tons de
cinza.
Escreveu ao seu tio
Farid, de São Paulo, explicando sua situação e sentimento. Não aguentava mais o
chamarem de turco da prestação, as desfeitas das moças, a gozação dos homens e
a recusa das quengas em estar com ele – era libanês, falava francês, árabe e bastante
do idioma ribeirinho. Não conseguia entender o porquê da recusa geral das
mulheres comprarem seus produtos. Estava ansioso e aguardava resposta a
qualquer momento.
Hoje, com seu
tríplice idioma conseguiu falar com a mocinha Juriti, verdadeira perola
engastada na região e pediu que ela lhe explicasse a situação. A conversa, difícil,
era como trem que ia e voltava de uma estação para outra, resfolegando,
derrapando pelos trilhos que levavam para um horizonte lindo na confusão
feérica de suas cores.
Ela lhe disse que
todos gostavam muito dele, mas depois de tanto ele dizer inch alá, as mulheres
começaram a ficar ofendidas. Achavam que ele estava cada vez mais atrevido.
-Atrebido? Landinia
lê! Que atrevido lê? Euô? Nunca! disse Fuad.
-É verdade seo
Fuad. Quando as muié diz que vão comprá mais no mêis qui vem, ocê cruza os
braço no peito e diz prelas incha lá, pra inchá os peito delas! Elas num gosta!
-Muié intendi nada!
Alah, Deus. Fuad diz si Deus quêr!!!
Juruti, fia, exbrica prelas, vai, exbrica.
Depois das devidas
explicações feitas por Juriti, aumentaram as vendas e Fuad sentiu-se melhor,
podia flanar durante o fim de tarde nos igarapés e qual Dionísio mirar sua
imagem refletida nas águas límpidas esverdeadas.
Para agradecer aos
compradores, agora, no inicio de cada venda falava Bom Dia em árabe que seus fregueses
entendiam assim Kifa, mabsut, lê! e sorria satisfeito. Ficava animado e vendia
melhor. Não se sentia mais como camelo transsaariano carregando o mundo às
costas buscando oásis de ternura e felicidade.
Quando chegou a
carta com a resposta do tio Farid dizendo que as coisas estavam difíceis em São
Paulo ele respondeu que então ficaria pelo Amazonas mesmo e agradeceu muito.
Sair dali? Nem
amarrado! Ele agora assistia a filmes com cores diferentes. Já estava até com
uma quenga fixa...inch Alá... para sempre, que ninguém é de ferro.
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