DUAS MULHERES DISCUTEM
Oswaldo Romano
PEÇA INFANTIL
Cenário: Uma Praia, Um Banco.
Duas
cunhadas curtindo férias esparramadas nas espreguiçadeiras de praia, sorvendo o
fim dos aperitivos, saboreando a fruta do palito, uma já bem animada lembra
quando criança fábulas do Esopo.
Flavia fala
a da baleia contada por sua mãe:
— Mamãe
conta ter ouvido da minha avó.
— Luci, como
eu era boba ouvindo a minha mãe contar fábulas. Quanta coisa eu não entendia,
quanto tempo perdido, podia aproveitar melhor essa época com nossas
brincadeiras...
— Flavia, eu não acho que foi tempo
perdido. Você enquanto esforçava-se ouvindo, estava na verdade desenvolvendo sua
inteligência. Não tivéssemos aqueles momentos infantis, um valioso aprendizado,
nosso desempenho na escola teria sido muito pior.
— Nisso você tem razão. Aquilo ajudou
eu ser tolerante, resignada pra tudo, e veja o resultado. Sou a mulher do seu
irmão, sofro com a irresponsabilidade dele, tenho paciência, tolero.
— Não sei por que você vai falar
dele agora.
— Então, fique sabendo o quanto
folgado ele é.
— Você quer dizer que meu irmão é
vagabundo?
— Quase você chegou lá. Não permanece
em firma alguma, diz sempre que é para melhor, fica tempo desempregado, e cada vez traz menos dinheiro para casa.
Tem trazido
uma merreca. Fosse uma merreca a cada três, quatro dias, iria juntar esses
mercules e pagar as contas. Mas não. Toda semana tem uma desculpa.
— Sei, você fala estar tudo ruim, mas
está aqui esparramada na cadeira, de férias, nessa linda praia!
— Foi o meu pai quem ajudou, ajuda
em casa, e usei minhas milhas. Ele tem dó de mim. Trabalho muito e faço o
possível para suportar a despesa da casa. Meu pai não tem obrigação. A
obrigação é do seu irmão que não cumpre.
— Ora, por favor, me poupe. Milha
não dá na estrada. É resultado dos seus exagerados gastos. É fácil compreender,
difícil de esconder.
— Cunhada, a vida nos reserva surpresas.
Nossa luta, assim como em todas as famílias é diferente com sentido distinto.
De um modo ou de outro temos que nos defender e acomodar essa nossa luta. Os de
poucos recursos geralmente sofrem diante de um poder maior.
Veja esse mar. Lindo, não? Você pode
imaginar o que ocorre dentro dele?
. —
Esse mar para mim é um mistério.
— É nesse mistério que tem a tal
fábula da baleia. Pouco conhecida, guarda no seu contexto desejados
ensinamentos.
Incrível,
minha mãe quem contava algumas, mas esta nunca esqueci.
Tinha uma baleia chamada Musa. Era
muito, muito grande e sua boca media mais de metro. Quando nasceu, andava no
dorso da sua mãe na maior felicidade. A mãe se considerava uma rainha do mar e
tinha como melhor amiga a Sereia Diva. Musa recomendou a Diva caso lhe
acontecesse algo ruim, tomasse conta da Fé sua filhinha, que ainda pequena,
surfa no seu lombo. Tinha medo que lhe acontecesse o mesmo destino do Tauro,
seu companheiro. Quando navegavam calmamente, uma enorme máquina, cravando-lhe
pontudo ferro, levou-o para sempre.
Os dias corriam alegres para Musa, o
seu bebe Fé crescia, a sereia os acompanhava. Mas o inevitável aconteceu: o
bicho homem matou e levou Musa, sua mãe. A sereia compartilhou do sofrimento da
Fé, ofereceu mais amor, completou seus ensinamentos.
Mas, Fé teve um crescimento muito
rápido, mal viu passar o tempo, sentiu-se enorme. Quando a sereia era ameaçada,
contava com a proteção da Fé, sempre ao seu lado.
Havia entre elas um grande amor, mas
crescia cada dia mais, um grande perigo.
Abrindo a boca mergulhada junto a um
cardume, engolia tonelada de peixinhos.
A sereia corria um sério risco de a
qualquer descuido também ser engolida.
Diante disso, escondendo seu
sofrimento, a Fé expulsou a sereia, mas ela surpresa se recusava partir. Desceram-lhe
lágrimas, tanto achava injusta aquela medida.
Tinha tratado e defendido a Fé
quando pequena, órfã, a mercê dos tubarões e outros predadores. Ela, a mais
bonita dos mares, impunha seu respeito. Agora... É essa a recompensa. Não
adiantava mais pedir para ficar, pois mesmo a Fé aceitando, não seria por amor,
seria por dó. Assim, a sereia Diva muito triste, movendo sua enorme cauda, partiu
provocando sucessivas ondas de despedidas.
— Nossa! Nunca ouvi essa fábula!
— Não mesmo, tempos depois soube que
a mãe inventava.
MORAL DA HISTÓRIA
MESMO AMANDO MUITO, COM MUITA DOR NO CORAÇÃO EXPULSAR
UM SER AMADO, NEM SEMPRE É COMETER TRAIÇÃO.
roma@romano.com.br
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