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PROJETO ESCRITORES NA PAUTA

PROJETO ESCRITORES NA PAUTA

A AULA É SUA!

Pesquise a vida e obra de um dos autores abaixo. Anote curiosidades. Veja a bibliografia dele. O gênero que mais aplicava nos textos. Observe o estilo literário. Leia uma obra, um poema, um conto do autor, e faça a análise do texto literário. Marque trechos da obra para os colegas conhecerem. Traga muitas curiosidades.

Será gratificante “descobrir” esses escritores:


Alô, EscreViver!

Escolha um dos escritores abaixo para explanar sobre

 a vida e obra dele:


GUIMARÃES ROSA:

João Guimarães Rosa nasceu em Cordisburgo, pequena cidade do interior de Minas Gerais, no dia 27 de junho de 1908. foi uma das principais expressões da literatura brasileira. O romance "Grandes Sertões: Veredas" é sua obra prima. E morreu em 1967.


EUCLIDES DA CUNHA:

Euclides Rodrigues Pimenta da Cunha nasceu em Cantagalo, Rio de Janeiro, no dia 20 de janeiro de 1866. Suspeitando que estivesse sendo traído por sua esposa, Euclides dirigiu-se para a casa do amante (que era oficial do Exército e atirador) e sem êxito tentou alvejá-lo, mas foi assassinado com três tiros que atingiram o coração e o pulmão. (Anos mais tarde, seu filho tentou uma vingança, mas teve o mesmo fim do pai).

Euclides faleceu no Rio de Janeiro, no dia 15 de agosto de 1909.


ARIANO SUASSUNA:

Ariano Vilar Suassuna nasceu no Palácio da Redenção, na cidade de Nossa Senhora das Neves, hoje João Pessoa, capital da Paraíba, em 16 de junho de 1927, e morreu em 2014.


CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE:

Carlos Drummond de Andrade nasceu em Itabira de Mato Dentro, interior de Minas Gerais, no dia 31 de outubro de 1902. Morreu no Rio de Janeiro RJ, no dia 17 de agosto de 1987, poucos dias após a morte de sua filha única, a cronista Maria Julieta Drummond de Andrade.


MONTEIRO LOBATO:

José Renato Monteiro Lobato nasceu em Taubaté, São Paulo, no dia 18 de abril de 1882. Ao nascer. Era filho de José Bento Marcondes Lobato e Olímpia Monteiro Lobato. Após a morte do pai fez alteração no nome para ficar igual ao pai, então passou a se chamar José Bento Monteiro Lobato.


GRACILIANO RAMOS:

Graciliano Ramos de Oliveira nasceu na cidade de Quebrângulo, Alagoas, no dia 27 de outubro de 1892, faleceu no Rio de Janeiro, no dia 20 de março de 1953, vítima de câncer de pulmão. Teve praticamente 20 anos de vida literária, mas suas obras ficaram para a história.


LIGIA FAGUNDES TELLES:

Lygia Fagundes Telles nasceu em São Paulo, no dia 19 de abril de 1923, e faleceu aos 98 anos em São Paulo em 3 de abril de 2022. Romancista e contista, membro da Academia Paulista de Letras, da Academia Brasileira de Letras e da Academia de Ciências de Lisboa.


CECILIA MEIRELES: 

Cecília Benevides de Carvalho Meireles nasceu no Rio de Janeiro no dia 7 de novembro de 1901. faleceu no Rio de Janeiro, no dia 9 de novembro de 1964. Seu corpo foi velado no Ministério da Educação e Cultura.


JOÃO CABRAL DE MELO NETO:

João Cabral de Melo Neto nasceu no Recife, Pernambuco, no dia 9 de janeiro de 1920. faleceu no Rio de Janeiro, no dia 9 de outubro de 1999, vítima de ataque cardíaco.


CASTRO ALVES:

Antônio Frederico de Castro Alves nasceu na vila de Curralinho, hoje cidade de Castro Alves, Bahia, em 14 de março de 1847. Faleceu em Salvador, no dia 6 de julho de 1871, vitimado pela tuberculose, com apenas 24 anos de idade.




São Paulo dos anos 40 – 50 - Ises Abrahamsohn

 

Belvedere Trianon nos anos 40

São Paulo dos anos 40 – 50

Ises Abrahamsohn 

 

       Irene descia a escada tentando enxergar a amiga Gisela em meio à multidão que se aglomerava no cais. O sol tropical quase a cegava, apesar dos óculos escuros. E o calor úmido sufocante… Ainda bem que lembrara de colocar seu chapéu de abas largas e o tailleur de linho. Muitas companheiras de travessia sufocavam dentro de seus pesados vestidos de lã, alguns com golas de pele.  A fila para entrar no armazém da alfândega era enorme. Era o mês de março de 1946. O navio vinha lotado. Após o final da guerra, um grande número de pessoas voltava da Europa para o Brasil. Assim como ela. A travessia demorara 24 dias. Dois a mais do previsto, culpa dos ingleses que, em Funchal, na Madeira, subiram a bordo à procura de criminosos de guerra. O militar inglês a olhara com suspeita por ser alemã. Teve que explicar que tinha família no Brasil e que vinha de Portugal, onde passou os últimos dois anos trabalhando. Sorte que era fluente em inglês. Afinal, tinha trabalhado vários anos como secretária na Ford e no Lanifício Pirituba, em São Paulo, antes de voltar para a Europa em 1932.

       Finalmente chegou sua vez na inspetoria da alfândega. Duas grandes malas de navio, a valise de mão para uso durante a viagem e a sua chapeleira, aquela mala especial para chapéus que tinha comprado em bom estado em Lisboa.  Os funcionários da aduana não a incomodaram.  Estavam com pressa, e ela, ao lhes falar em português, não era um alvo fácil de alguma falsa cobrança.


Sua amiga Gisela já estava a postos com dois carregadores de bagagens que as acompanharam até o automóvel. Era um Chevrolet 1946 preto básico, mas Irene se espantou. Não sabia que a amiga guiava e muito menos que possuía automóvel. Ela lhe explicou que sim, aprendera a guiar, mas que o automóvel havia sido emprestado do mecânico chefe, da General Motors, apenas por um dia.  Ela ajudara o homem em alguns assuntos bancários.

Irene estava cansada, mas ainda se maravilhou com a viagem pelo caminho do mar. A densa mata atlântica impenetrável, tão diferente das comportadas florestas europeias onde se podia caminhar entre as árvores. 

Finalmente chegaram a São Paulo. Irene ficou em um casarão na rua Peixoto Gomide, cuja proprietária alugava quartos e fornecia o café da manhã e um chá à noite.  Combinou com Gisela de se encontrarem no domingo no restaurante do Trianon. Iria aproveitar para datilografar seu currículo atualizado e se candidatar aos empregos de secretária executiva. Havia grande procura por pessoas capacitadas e que sabiam falar várias línguas. Ademais, as mulheres brasileiras de classe média raramente trabalhavam fora de casa, situação diferente da Europa e da América do Norte. Irene havia trabalhado em grandes companhias na Alemanha, antes de conseguir escapar para Portugal, onde passara os últimos anos da guerra como secretária da legação comercial em Lisboa.

No domingo, caminhou a pequena distância até a esplanada do belvedere do Trianon, acima do túnel da nova avenida nove de julho. De lá, a vista alcançava o verde de chácaras que pontilhavam a paisagem até o vale do Anhangabaú. Ao longe, no centro da cidade, via-se o imponente edifício Martinelli de 30 andares e os contornos do Mosteiro de São Bento.


Irene ficou a admirar como São Paulo havia se desenvolvido nos quase 15 anos em que esteve fora. Porém, era bom voltar… Queria deixar a Europa para trás, a guerra, os bombardeios, o racionamento e recomeçar uma nova vida.

Ao entrar no restaurante do Trianon logo avistou Gisela já sentada em uma mesa na companhia de duas amigas. A conversa se desenvolvia animada quando, subitamente, Irene emudeceu. Agarrou a mão da amiga e abaixou-se, escondendo o rosto.


Tenho certeza de que é ele, murmurou. É um homem muito perigoso e cruel. Não tenho certeza se me viu.


Sim, ele a havia visto e percebido que ela o havia reconhecido. Mas o semblante não se alterou e o homem estrangeiro se dirigiu ao fundo do restaurante.

 Irene, transtornada, rapidamente saiu do restaurante acompanhada pela amiga. No caminho, ainda abalada, explicou para a amiga. Ele era um dos grandes da cúpula do partido nazista, muito influente, e trabalhava junto ao pessoal da Gestapo, a polícia política.  Fazia investigações nas empresas que tinham contrato com o governo e foi assim que eu o vi em algumas reuniões da diretoria da firma onde eu trabalhava. Eu estava presente como secretária e devia taquigrafar as conversas para elaborar um relatório. Quando a reunião terminou, o sujeito, chamava-se Mencken, me puxou para o lado e colocou bruscamente a mão sobre meu ombro. Ordenou que apagasse todas as minhas anotações. E, antes de se afastar, mais uma vez apertou com força o meu ombro. Tive que relatar ao meu chefe o ocorrido. O tenente Mencken, era temido, cruel e investigava possíveis adversários do regime. Como vários outros, ele  deve ter escapado, disfarçado, ao final da guerra para a América do Sul e vive aqui sob outro nome. Certamente está na lista dos mais procurados.  Se ele me encontrar ou descobrir onde moro, vai me matar.

Irene estava apavorada. O certo era que não poderia mais circular por ali ou andar na cidade. Gisela resolveu levá-la para sua casa no afastado  bairro do Brooklin com a recomendação de não sair. Não adiantava ir à polícia. Muitos eram simpatizantes do nazismo desde o tempo da ditadura Vargas.

Gisela resolveu abordar seu chefe americano, Mr. Thompson, na General Motors. Ele não tinha sido combatente, mas servira no serviço de Inteligência dos aliados. O executivo propôs se encontrar com Irene dali a duas semanas na fábrica da GM em São Caetano.  Irene e Gisela, no dia marcado, foram de bonde até o centro e, na Estação da Luz, seguiram com o trem até São Caetano. Irene estava o tempo todo preocupada com algum possível perseguidor. Mr. Thompson acalmou-a e a fez sentar a uma grande mesa, onde abriu uma pasta contendo cópias de fotografias.


Estas são fotos de membros dos altos escalões do partido nazista que estão sendo procurados mundialmente. Eu consegui isto porque também aqui em São Paulo eles estão sendo procurados por policiais especiais. Peço para você examinar atentamente e, quando puder ter certeza, mostrar o homem que viu no Trianon.


Irene logo identificou a foto de Mencken na terceira folha do caderno.


— Sim. Aqui está. É ele mesmo. E o sobrenome está correto. O que vai acontecer?
Não sei, senhorita. Vou repassar sua informação e veremos o que vai acontecer. Enquanto isso, fique na casa de sua amiga e não circule pela cidade. Você vai saber.


Irene ainda teve que aguardar duas semanas. Numa terça-feira, um envelope marrom sem remetente chegou à casa de Gisela, onde, ainda escondida, continuava a morar.  Continha apenas um pequeno recorte tirado de um jornal de Nova York: “Conrad Mencken, importante dirigente nazista, foi apreendido e espera julgamento no III tribunal militar internacional em Nuremberg.”

Finalmente, Irene pôde voltar à sua vida normal. Logo conseguiu um excelente emprego na própria GM na diretoria de vendas. Ainda cruzou algumas vezes com Mr. Thompson no corredor, apenas trocando um bom-dia. Soube alguns meses mais tarde que ele fora indicado para um cargo na filial de Buenos Aires. O que fez Irene pensar qual de fato era a principal ocupação do americano Mr. Thompson .

Urgência investigativa - Silvia Villac

 

 


Urgência investigativa

Silvia Villac

 

Protássio estava acostumado a lidar com pressão, mas, nesse momento, a vida de Helena, uma criança de apenas 4 anos e meio, dependia mais uma vez de sua habilidade.

Sequestro é sempre um jogo de vida ou morte. Ou cara e coroa porque você pode descobrir o cativeiro ou pagar o resgaste. Porém, em ambos os casos, ainda assim se corre o risco de não encontrar o refém vivo.

Os pais da pequena queriam pagar logo a quantia exorbitante mesmo para um banqueiro, mas, tão logo foi contratado, Protássio deixou bem claro que seria ele a dar as cartas e, em primeiro lugar, era necessário obter alguma prova de vida.

Ela havia sido sequestrada na saída da escola, assim que o segurança abriu a porta do automóvel blindado. Encostaram a arma na cabeça do pobre coitado e, em questão de segundos, a garota foi levada.

O prazo para pagamento do resgaste era de 1 dia e as primeiras 10 horas já tinham se passado e o detetive ainda não havia descoberto praticamente nada.

Os pais o pressionavam, mas ele insistia que esse não era seu método e que eles deviam acreditar que todo o possível estava sendo feito.

Foi montado um esquema de monitoramento e rastreamento de celulares e, desde o 3º contato telefônico, já era Protássio quem atendia as ligações, dizendo ser um amigo da família, estava ali para finalizar tudo o mais breve possível.

Enquanto isso, ele já havia contatado seus amigos da DP, que estavam “mexendo os pauzinhos” e levantando a ficha de todos os empregados e amigos mais próximos da família.

Aparentemente, Protássio tentava passar segurança para os pais, mas por dentro estava muito tenso porque não saía de sua cabeça o caso dos Maldonados, cujo desfecho havia sido trágico: apesar de o resgaste ter sido pago, o pequeno Lúcio nunca voltou para a família.

“Isso não pode tornar a acontecer”! Olhava o celular a cada 2 minutos e só quando faltavam 5 horas para o final do prazo é que recebeu uma notícia que o deixou com esperança de solucionar o caso.

Os detetives da DP haviam descoberto que o “pobre do segurança” tinha ficha criminal em um estado do nordeste do Brasil. Havia trocado de nome e alterado seu RG e CPF, mas fora possível reconhecê-lo através da identificação facial.

Ele já estava nesse emprego há 2 anos e meio e havia sido muito bem recomendado, não se compreendia, dessa forma, como isso fora acontecer.

Com sua experiência e já sendo “macaco velho”, Protássio “espremeu” o sujeito, que não demorou muito, foi logo se entregando. Havia se tornado um viciado no tal do “Jogo do Tigrinho” e acabara devendo dinheiro para um agiota. Ele havia se comprometido a “se emendar” e, de fato, estava “andando na linha”, mas o vício o fez escorregar.

A polícia estourou o cativeiro e encontrou a pequena Helena dormindo o “sono dos justos”, abraçadinha com sua boneca preferida.

Quando Protássio recebeu essa notícia, olhou para o relógio e viu faltarem apenas 5 minutos para o término do prazo dado pelos sequestradores.

“Hoje é um dia que merece ser comemorado”, ele disse para si. Os pais de Helena choraram enquanto abraçavam o detetive, que continuava com aquele velho paletó surrado, com aspecto sujo, mas o casal parecia não se incomodar com esse detalhe, pois o desfecho foi feliz.

Protássio deixou a mansão, entrou em seu velho Corsa desbotado e foi direto para o boteco de costume tomar “umas e outras”. O pagamento por seu serviço podia ser feito depois, porque o importante era “bebemorar”!

 

 

 

Parodiando notícia americana - Yara Mourão

 




Parodiando notícia americana

Yara Mourão

 

Ser um jornalista importante era o sonho de todos os alunos do curso de Comunicações da faculdade. Buscavam motivos, procuravam problemas para fazerem uma reportagem, para darem uma notícia.

Um dia o professor chegou com um anúncio incrível: queriam que se designasse o melhor dos alunos, ou já um profissional, para participar de uma importante reunião na Secretaria de Segurança.

Indicaram Pedro Duarte, o mais preparado de todos.

Sem muita demora, no dia determinado, nas proximidades da faculdade, a Polícia Federal já cercava o prédio da Secretaria de Segurança Pública.

Pedro chegou cedo para se certificar das providências. Logo foi conduzido ao salão das reuniões, onde um grupo de altas autoridades já se encontrava. Estranhou a movimentação, mas seu crachá estava pronto e ele não tinha com o que se preocupar.

Não, até o início da reunião secreta.

Ali, num recinto sufocante, Pedro foi se confrontando com as discussões, com as proposições colocadas. Achou tudo muito estranho. Duvidou da indicação de sua presença, se seria mesmo necessária.

O que se debatia eram estratégias de busca e apreensão, de aprisionamento e de possíveis torturas de pessoas sob suspeita de conspirar contra o Estado.

O que Pedro poderia dizer? Era somente um aluno, não um jornalista tarimbado e da estrita confiança dos órgãos de segurança nacional.

Mas a busca por um furo jornalístico falou mais alto e Pedro quedou-se, abismado, entre segredos, verdades e suposições de cunho altamente secreto do País.

Assim, ficou sabendo de coisas que nunca imaginara saber! O que fazer com essas informações? Guardar para si não fazia sentido. Publicar? Mas eram questões de segurança nacional, altamente secretas.

Pedro se recolheu em um profundo mal-estar.  Certamente fora um engano ele estar ali. Pensou em se desmascarar, mas temeu represálias. Agora tinha provas concretas do envolvimento arbitrário e violento dos órgãos da Defensoria Pública.

Ao primeiro sinal de intervalo, Pedro se retirou do salão. Saiu rápido, quase fugindo. As notícias de acontecimentos reais passavam pela sua memória. Não! Não poderia guardar para si o testemunho da violência oficial.

Ainda era dia quando Pedro enviou mensagens à Faculdade de Comunicação, ao professor e aos caros colegas: “Pessoal, há mais coisas entre o céu e a terra como dizia Shakespeare. Temo pelo que virá. Abro mão de minhas anotações para que o público se dê conta de fatos dos quais nem suspeitavam!”

E agora Pedro era quase um desertor, um vencedor ou um vencido, não sabia. Aguardava as consequências.

Fora tudo muito inusitado; parecia um imenso qui pro quo, uma história de filme policial americano.

Alunos e professores debateram por dias se a prevalência das notícias sobre a sociedade desinformada não é uma faca de dois gumes.

 

 

JULINHA VAI ÀS COMPRAS - Suzana da Cunha Lima

 



JULINHA VAI ÀS COMPRAS

Suzana da Cunha Lima

 


Julinha vai às compras.

Isso significava vestir um pobre/chique.  Vestidinho fora de moda, peruca sem graça e outros artifícios para parecer pobre, mas não tanto, ou seja, pobre para o ladrão desistir de assaltar e o meio chique era para poder entrar em certos estabelecimentos, até mesmo escritórios, para vender suas rabanadas, sem parecer moradora de rua.

Claro que não precisava do dinheiro da venda das rabanadas para nada.  Porém, foi o modo que arrumou para poder entrar na loja do marido e dar uma incerta.

E de quebra, livrou-se de muitos assaltantes que nem sonhariam que, debaixo daquela breguice, estava uma empresária bem-sucedida, de carro zero na garagem.

Porém, naquela segunda-feira, o que ela ia mesmo fazer era dar um “perdido” no marido, ali, na loja dele, no trabalho dele.

Desconfiava da moça que circulava nos vestiários mais do que a bonitinha da caixa. Essa era uma prisioneira daquele guichê, com poucos momentos de folga, porque NÃO tinha substituta designada.

Ah, mas a outra, ah, a outra! Quase sufocando num vestido justo, que favorecia seus seios generosos e com aquelas pernas bronzeadas equilibradas num sapato bico fino altíssimo, andando pra lá e pra cá, num rebolado indecente, era o desfrute de quem estava lá.

Só podia ser ela mesmo a razão dos suspiros e olhares lânguidos dele, até mesmo quando estavam na cama. Não haveria de ser por mim, uma pobre marquesa, pensava ela, olhando os seios caidinhos e uma barriga flácida remanescente de um regime feroz.

Então, meu caro, não é a outra, sou eu mesma, a mãe de seus filhos e é o que temos para hoje, goste ou não. E assim ia levando sua vida sexual com o marido, porque ela sabia muito bem como compensar suas frustrações.  Ou seja, ela também suspirava pelo entregador de pizza, do qual o maridão não tinha o menor conhecimento! HaHaHa

 

 

Clube das Palavras - Adriana Frosoni

 

Clube das Palavras

Adriana Frosoni

 

O grupo de escrita criativa se reúne toda terça-feira à tarde em uma sala do departamento cultural. O ambiente tem um ar nostálgico, mas o cheiro do café fresco trazido na hora, muitas vezes pelo senhor Zezinho, um dos mais antigos e queridos colaboradores do clube, aquece o ambiente como um abraço. Alguém do grupo sempre traz bolo ou outra guloseima, carinhosamente.

Somos, em sua maioria, mulheres — talvez porque sempre tivemos a necessidade de contar histórias, de organizar o caos da vida com palavras, de remendar as ausências com ficção. 

O grupo desenvolve um tema, escreve textos e, cada um, segue lendo seu trecho da semana, esperando o parecer dos colegas. Saímos da reunião sempre carregados de reflexões e, no fundo, todos sabemos: aprendemos muito uns com os outros.

Entre nós, atualmente, há somente um homem, que se destaca não apenas pela presença masculina, mas pela precisão gentil com que analisa nossos textos: Doutor Oswaldo, médico de profissão e escritor por paixão. Sua crítica é um bisturi afiado, mas manuseado com delicadeza. Ele ouve todos com atenção, observa a construção das frases, a cadência das palavras, o fôlego da narrativa. Quando lê o próprio texto, há um misto de serenidade e exatidão em sua voz, sem nunca perder o ar bem-humorado. 

Eu, que venho escrevendo há poucos anos, aceito as observações dele com admiração, ouço seus pontos de vista como se minha história fosse um paciente que merece uma segunda opinião. Pois ele sempre nos motiva, e quando elogia, é porque há mérito. Há um aprendizado oculto na delicadeza das suas palavras. E, se um dia eu conseguir deixá-lo sem palavras, saberei que estou no caminho certo.  


O mistério do Sr. Bruck - Suzana da Cunha Lima

 

O mistério do Sr. Bruck

Suzana da Cunha Lima

 ROTEIRO TEATRAL

 

Primeiro ato

(Homem idoso arrasta o chinelo de couro até a poltrona do alpendre onde senta à espera de passantes. O calor o incomoda, ele enxuga o suor da testa com frequência).

(Como não enxerga bem, força a vista para identificar a voz feminina que está cantarolando.)

 

NAIRPisa na fulô, pisa na fulô. – (cantarola a vizinha enquanto pendura roupas no varal do quintal).

 

SEU BRUCK: (estica o ouvido para o lado da voz que ouve)

Logo cedo e esse calorão de assar de um boi, hein Nair!

 

NAIR: (Ela olha para ele, e sorri) - É bom pra secar minha roupa, Seu Buck – (Ela se lembra de algo, vira para ele, se aproxima do muro) – O Nando, meu filho, disse que na aula de história que ele teve ontem, citaram um tal Cavaleiro Branco que viveu na sua terra. (Levanta as sobrancelhas). Quer dizer, então sua cidade existiu mesmo?

 

SEU BRUCK: (fica irritado, se ergue da cadeira num ímpeto, e grita muito bravo) - Mas é isso, a senhora acha que minto!

Onde já se viu! – (Franze a testa e enxuga imediatamente o suor) – (senta-se devagar e amansa a voz demonstrando

curiosidade)

 O que falaram sobre o Cavaleiro? O povo de hoje

não sabe nada dele.

 

 

(Suspira pensando:  vamos ver o que inventaram sobre o Cavaleiro Branco).

 

(Nair se aproxima mais ainda do muro com os pregadores de roupas na mão. Cochicha como se não houvesse ali somente os dois.)

 

— Tem muito boato, sabe? Mas pelo que dizem, este Cavaleiro Branco existiu mesmo. Mas que diachos ele fazia?

 

(Mr.Bruck sorriu, mais alegre. Refastelou-se na cadeira e buscou seu copo de limonada que tinha chegado gelado e já estava morno)

 

— O que ele fazia? Santa Ignorância...Era simplesmente o chefe dos Maçons. Ou a senhora também não sabe o que são os maçons? Já ia começar a caçoar de Nair, mas ela não deu a menor chance)

 

(Nair se afastou meio ofendida, arrastando as chinelas, ostensivamente)

 

— Nosso professor disse que ninguém é obrigado a saber falar estrangeiro. Onde já se viu...Lá vem o senhor com este palavreado só pra se mostrar muito inteligente...

 

(Entra em casa, resmungando: É por isso que está aí sozinho, ninguém chama pra nada. - E bate a porta com força.)

 

(Mr.Bruck ficou ali meio estatelado com a reação da vizinha, geralmente gente boa.  Como ela não voltava, tratou de se recolher e buscar o alpendre dos fundos de sua casa, mais fresco àquela hora – foi resmungando)

 

— Mas quem diria, a Nair, sempre tão amável... Será que o sol está torrando os miolos dela? Também... lavar roupa ao meio dia, neste sol ? Tem gente que não tem noção mesmo...

 

 (Mas ao passar pela cozinha de sua casa, sentiu o cheirinho do café que a mulher estava coando e já foi se sentando por lá)

 

— Oi Cidinha, a Nair deve estar de TPM, viu? Me respondeu agora como se eu tivesse ofendido o Santo Papa.

 

— O quê? Onde você escutou esta palavra? Aqui em casa não foi não, pois nunca lhe dei a ousadia de pronunciar esta palavra. A gente sempre diz “naqueles dias” e todo mundo entende do que se trata.

 

- Sou seu marido, oras! Pra quê tanta frescura? Céus, vou já pro boteco do Neco. Pelo menos lá nos entendemos. A mulherada hoje parece que está toda de TPM.

 

(E levantou-se logo em direção à porta da cozinha que dava direto para a calçada. Ainda repetiu a malfadada palavra mais duas vezes, bem alto, pra mulher escutar e ficar bem irritada.)

 

— TPM! TPM !

 

— Ora, seu malcriado!

 

(E recebeu de volta, na cara, um pano de limpeza bem fedorento e molhado.  Sr.Bruck mal teve tempo de se apoiar no batente da porta, arrancar o pano que tinha se enroscado no seu pescoço, e sair com a ligeireza que suas pernas permitiam.)

 

(Mal chegou na rua,  recebeu o bafo de um sol irado de 40 graus, tonteou e caiu na calçada) Ainda teve tempo de gritar:

 

— Socorro!

 

E desmaiou.  O vizinho que ia passando ainda teve tempo de lhe aparar, impedindo que a queda causasse maiores complicações do que um susto grande- Tentou acalmar sr. Bruck e ao mesmo tempo pedir socorro, porque o velhinho era bem pesado)

 

— Pronto, Sr. Bruck, graças a Deus cheguei a tempo!

 

— D. Cidinha! Ajuda aqui! Seu marido está passando mal!

 

(Alguns transeuntes estavam passando por ali e correram para ajudar. Outro tocou a campainha e uma senhora teve uma crise de histeria)

 

— O que foi, gente, Morreu?

 

— Que morreu nada, o velhinho aqui ameaça, mas não vai...

 

— Já vai tarde, sabe, oh velhinho chato!

 

(Cidinha abriu a porta da casa, viu aquele monte de gente em redor do marido, estatelado na calçada, e se jogou aos pés dele, chorando e gritando)

 

— Ah, minha Nossa Senhora dos Nós Trançados! Me ajuda aqui. Não posso perder o Eustáquio Bartolomeu agora. Não agora, me ajuda, me ajuda!

 

Ainda falta uma prestação para o seguro de vida, ele não pode ir embora assim, sem aviso, é só mais um mezinho.

 

(foi quando reparou na mulher loura que soluçava e gritava ao mesmo tempo. Cidinha gritou furiosa:

 

— Quem é aquela louca que está chorando tanto e chamando meu marido de Taquinho?

 

 

 

(E foi assim que a vizinhança soube de três coisas naquele dia:

 

1 -- Que o nome de sr. Bruck era Eustáquio Bartolomeu

 

2 – Que haviam feito um seguro de vida e só faltava um mês para ser quitado.

 

3 – Que havia uma Nossa Senhora dos Nós Trançados de quem nunca ninguém tinha ouvido falar.

 

 

Mas ninguém soube responder quem era aquela mulher loura que chamava sr.Bruck de Taquinho)

 

E tudo isso foi murmurado, cochichado, gritado por toda aquela gente que mal conhecia o casal. Mas amava uma fofoca.

 

(Enquanto a cortina lentamente vai se fechando ).

 

 

 

 

 

SUZANA DA CUNHA LIMA